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Na próxima primavera eu completaria meu décimo quinto aniversário. Minha mãe já começava a organizar a celebração que transformaria sua filha em uma mulher. Todos queriam festejar e descobrir com quem a filha do pastor seria destinada a casar.

Quando criança, eu sonhava com isso. Com meu vestido brilhante, minha tiara, a experiência de viver o então "melhor dia da minha vida". E hoje, ele me assustava.

Eu queria congelar o tempo. Queria me esconder no quarto quando começavam a comentar sobre a festa na mesa de jantar. Queria poder dizer não ao meu futuro noivo, que teria total poder por mim quando aquela aliança entrasse em meu dedo.

Me debruçei na janela para ver meu pai voltar a cavalo de sua ida à cidade, junto com um criado, e estranhei quando percebi que havia um envelope amarrotado sob meu cotovelo

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Me debruçei na janela para ver meu pai voltar a cavalo de sua ida à cidade, junto com um criado, e estranhei quando percebi que havia um envelope amarrotado sob meu cotovelo. Eu não recebia cartas sem elas passarem pela supervisão de minha mãe e, quando era importante, ela vinha me entregar pessoalmente. O abri e, com grande surpresa, li seu conteúdo:

"À luz do luar na praça, comemoraremos a felicidade de estar vivo! Às 23h. Não gostamos de atraso!"

Se aquela carta não tinha sido enviada por engano. Alguém estava tentando destruir uma festa.

Era a Noite Das Bruxas, onde os fiéis ficavam em casa rezando por sua segurança e aqueles que não conheciam Deus iam para a rua para, ao redor da fogueira, fazer feitiçaria e magia negra contra os homens do Bem. Era isso que minha mãe me contava desde que nasci.

Todos sabiam de quem eu era filha, por isso aquela carta não podia ser para mim. E eu, mesmo que tentasse não pensar nisso, sabia o que meu pai fazia com as mulheres que encontrava fora de casa nessa noite do ano. Eu me sentia tão impura por julgar o que ele fazia e dizia, mesmo que sempre só mentalmente, como se ele ou alguém pudesse ler meus pensamentos. Toda mulher sabia que não havia perdão pra heresia.

Mas isso não impediu que eu desejasse aceitar esse convite, com todas as forças. Afinal, ainda não haviam me proibido de sonhar.

354 palavras

HeresiaWhere stories live. Discover now