Humanis constrictum - in memoriam

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Dentro de si mesmo, o autor sem nome escreveu suas palavras, mas nunca as recitou. Disse que assim seria melhor, mas acabou morrendo sem deixar rastros de quais eram. A verdade é que ninguém sabia. Ele era um homem dourado, por dentro e por fora. Se maquiava todos os dias, antes de dormir para se sentir bonito, e ninguém sabia. Chegava em casa sempre tarde, mas nunca esquecia do ritual. Ao acordar, sorridente, se olhava no espelho, esperando ver tudo no lugar. Então, se entristecia ao apagar as marcas da sua existência. Caminhava sempre na mesma rota, como lhe havia sido ordenado, e isso o matava. Cada dia mais ele se sentia mais infeliz. As roupas que usava eram escuras, sem expressão, e isso tirava seu vigor, sua vitalidade. Chorava um pouco quando colocava o terno, mas ninguém sabia. Ninguém podia saber. Era um segredo só seu. Mas à noite, quando ninguém estava olhando, ele fechava as cortinas, abria uma porta secreta e adentrava no seu universo particular. O autor sem nome colocava o vestido mais bonito, um vermelho de cetim, e se sentia mais vivo que nunca. Passava o batom e beijava os retratos dos homens que havia amado. Nenhum deles nunca o correspondeu. Ninguém nunca olhou para ele. Era apenas mais um na multidão invisível que tenta se mostrar. Se sentia dono de si mesmo, tendo liberdade para fazer o que quisesse, mas sabia que a posse estava com a sociedade. Nenhum dos seus amigos o entendia, mas ele deixava claro para si mesmo que eles entendiam o suficiente. E voltava para casa sozinho, todos os dias, sorridente, mas morrendo por dentro. Cada vez mais. Um dia de cada vez. Uma lágrima por vez. Mas não era mais do que muitos outros passavam. A comunidade invisível que se ergue na sociedade, cautelosamente. Não os conhecia, nem sabia seus nomes, mas sabia que não era o único. Ele era apenas o que lhe era permitido ser. Não era escritor, mas já tinha pensado nos mais belos textos, dedicatórias e manifestos. Todavia, os mantinha para si, envergonhado, limitado pelos próprios muros. Quando partiu, o autor sem nome não sabia mais quem era. Morreu velho, decrépito e louco. Era apenas mais um que nunca havia sido o seu verdadeiro eu. E morreu com apenas um nome nos lábios, aquele que nunca foi seu.

- Dioniso

Antologia de um vencidoTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang