Escolhas

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Às vezes recebo mensagens solitárias de pessoas diferentes que tentam participar de forma ativa da minha vida. São pessoas com quem troquei beijos, carícias ou um pouco mais. O que define esse um pouco mais é a pessoa ou a situação. Sempre termina em algo mais, quando há vontade ou possibilidade. Eu gosto desse algo mais. É a parte que mais me fascina em conhecer o outro. Entender como seu corpo funciona e o que faz a pessoa vibrar de prazer. Essa vibração se estende por todo seu corpo e leva a alguns espasmos. Eu gosto disso. É interessante entender como isso acontece com cada pessoa. Eu sinto que é uma maneira de conhecer pessoas, da mesma maneira que alguns dizem que dá pra inferir o caráter de um homem pelo aperto de mãos. Obviamente, as duas coisas são mentira, mas só uma delas diz respeito à minha visão de mundo. Então vou sustentar aquilo que eu acredito. Vou me fazer essa indulgência. Vou alimentar meus preconceitos. Pelo menos uma vez na vida. Certamente estou errado, mas vou manter essa visão em aberto como se ela fosse o mínimo importante para o perfil psicológico das pessoas que eu conheço. Faz sentido pensar assim, ainda que não faça um sentido real. É interessante acreditar nisso para mover meus impulsos sexuais doentios. Eu gosto de conhecer pessoas assim. É a maneira mais prática de saber se eu vou querer conhecer alguém. Saber como ela se comporta sexualmente é uma interessante previsão do futuro. De todos os atos sexuais que eu quero desenvolver com aquela pessoa daquele momento em diante. E muita gente gosta da maneira como eu as conheço. Eu sinto interesse em explorar corpos, partes intocadas há muito tempo, fazer pessoas gemer de prazer. Isso é o meu fetiche. Eu falei que era doentio. Ao mesmo tempo, isso faz sentido para mim. Me dá um certo propósito em conhecer pessoas. Eu alimento a fábula de que esses dados são importantes, mas acho que percebo cada vez mais o quão subservientes esses momentos são. E tudo isso volta, sempre, para um ponto comum em todas as minhas relações: eu normalmente não gosto de me relacionar. Eu não sou interessado no que as pessoas tem a dizer, nem no que elas fazem da vida. Esse tempo já passou. Ao que tudo indica, ele foi embora junto da minha virgindade. Mentira. Talvez algum tempo depois. Nesse meio tempo, muito mudou. E, na verdade, nada mudou de verdade. Eu sinto que agora eu me sinto eu mesmo. Eu faço minhas escolhas com base nos critérios que eu estabeleci como importantes, após vários ensaios de tentativa e erro. Não erro, por assim dizer, mas resultados insatisfatórios. Conversar com pessoas nunca foi o meu forte, sempre foi uma maldição a qual eu tinha que sobreviver. A habilidade de convencer pessoas a fazer o que eu quero sempre foi algo invejado por alguns e amaldiçoado por outros. Sempre tive que desmentir os boatos do quão mentiroso eu sou. Talvez eu já tenha sido muito. Não me recordo. Sinto que há verdade em tudo o que eu quero dizer. Gostaria que as pessoas percebessem isso, ao invés de duvidar piamente de tudo o que eu falo sem hesitação. É por isso que eu tenho dificuldades de me relacionar: o desinteresse é mútuo. Faz sentido? Faz realmente algum sentido que eu esteja tendo esse diálogo todo para explicar o meu desinteresse em pessoas e o meu profundo interesse sexual nelas? Não. A resposta é um categórico não. Meus fetiches são, para mim, uma prática nada viável para a maioria das pessoas. Elas se apegam romanticamente a pistas que nunca foram deixadas lá. Elas se apegam aos aromas das pessoas, às palavras doces que são ditas e todo o carinho de um único momento. Elas não estão erradas. Tudo isso pode ser sinal de algo a mais. Entretanto, é sempre importante determinar quando, de fato, o é. Foi neste ponto que eu consegui me apaixonar romanticamente, ao invés de uma reação puramente física, (talvez pela primeira vez) recentemente. Eu não me apeguei aos detalhes de como a pessoa sorria de alguma bobagem. Eu não me apaixonei pelo aroma presente no meu travesseiro depois de algumas noites dormindo junto. Eu não revisitei momentos que estivemos juntos procurando por sinais do seu interesse recíproco. Eu simplesmente me relacionei de forma amigável (fisicamente, inclusive) procurando ter respostas do quanto eu gostaria de estar numa relação mais intensa com esta pessoa. Eu vivi uma relação desde o primeiro momento. Desde que eu disse o quanto eu queria estar junto cada vez mais. E, pela primeira vez, alguém não correu atrás de mim. Eu não recebi mensagens solitárias em meio a momentos solitários buscando conforto. Eu não me senti necessário à toa. Eu me senti independente para, paulatinamente, desenvolver meu interesse por alguém. Isso é novo. Um coração severamente magoado como o meu, pela primeira vez, teve espaço para buscar um interesse em alguém sem ser atordoado pelo interesse profundo de um alguém solitário num momento solitário. Isso é desespero. Pessoas desesperadas me procuram para ter algo além daquilo que estou disposto a prover. Não é errado, nem nada de ruim. É só que eu não tenho interesse nisso. Enquanto muitas pessoas de alimentam do desespero, eu me sinto profundamente ofendido. É como se a pessoa em questão estivesse tão destruída que ela vai aceitar qualquer coisa que vier pela sua frente, sem capacidade de reagir ou se defender. Eu não gosto disso. Eu me valorizo demais para me colocar numa situação desse tipo. Eu prefiro ser sempre a primeira escolha, aquela que faz sentido, que vai agregar algo a um momento entre duas pessoas. Não tem nada de errado em um pouco de amor próprio. Às vezes, as pessoas só não sabem se amar o suficiente para estabelecer os limites do quanto os outros podem usar delas.

- Dioniso

Antologia de um vencidoWhere stories live. Discover now