Um passo de cada vez

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– Estou bem, Ruth. Pare de inventar coisas, pelo amor de Deus!

Alejandro fez um ar de deboche e Alfonso balançou a cabeça. Ambos caminhavam atrás dos pais; estavam saindo do hospital e voltando para casa. Quando deram alta a Fernando, recomendaram que ele usasse a cadeira de rodas para sair do carro e entrar em casa, mas ele discordou, com palavras nada educadas.

Como alternativa, Ruth segurou firme no braço do marido, tratando-o como um bebê e guiando cada um dos seus passos. Parecia até que ele ia cair a qualquer momento. Era óbvio que a paciência de Fernando estava se esgotando.

– Ah, e você pare de resmungar – rebateu a mulher, quando os quatro entraram na sala de estar. – Sente-se aqui.

Com todo o cuidado, Fernando se instalou na sua poltrona favorita, revirando os olhos.

– Foram só alguns pontos, Ruth. Relaxe.

– Relaxe você! Não quero ouvir nem mais uma palavra. Tem que manter a pressão estável. – Ela se
virou para os filhos. – Vou fazer um chá.

Assim que ela foi para a cozinha, os dois começaram a rir bem baixinho.

– É... Podem rir... – observou Fernando ajeitando as almofadas nas suas costas.

– Eu posso, sim – disse Alejandro, com um risinho, se aproximando do pai para ajudá-lo a ficar mais
confortável. – Ela fez a mesma coisa comigo quando saí do hospital. Agora é a sua vez.

Fernando resmungou de novo e passou a mão pelo peito.

– Está tudo bem, pai? – perguntou Alfonso franzindo a testa, preocupado.

O pai assentiu e fez um gesto meio indiferente na sua direção.

– Eu ficaria melhor se vocês todos parassem de olhar como se eu fosse explodir. Xô! Vão embora
daqui. Arranjem algo para fazer.

– Vou ver se mamãe está precisando de ajuda – disse Alejandro e saiu mancando em direção à cozinha, erguendo o polegar num gesto animado e deixando o irmão sozinho com o pai.

Filho da mãe.

Alfonso ainda ficou ali de pé por um minuto, olhando para Fernando e detestando aquele silêncio estranho. Depois, sentou-se no sofá maior. Bem na beiradinha, com as mãos juntas entre os joelhos.

– Bom ver você em casa de novo – disse Alfonso.

Ao ouvir isso, o pai se limitou a erguer as sobrancelhas. O filho suspirou.

– Olhe, pai, sei que mamãe já contou a você o que está acontecendo, mas eu mesmo queria dizer que ainda vou ficar mais um tempo em Michigan. Mamãe disse que posso ficar aqui, mas, se você não achar uma boa ideia, sempre posso arranjar uma alternativa...

– Por mim tudo bem, Alfonso – respondeu Fernando, respirando fundo. Deu uma rápida olhadela no filho e baixou a cabeça. – Tudo bem.

Ele pigarreou.

– Obrigado, pai.

– Faça o que tem que fazer – acrescentou Fernando. – Por mais demorado que seja.

Bom... Que diabo... Alfonso assentiu.

– Ok. Agora vou encontrar Annie e Henry. Até mais tarde.

Com um grunhido, o pai pegou o controle remoto. Alfonso foi até a cozinha e viu a mãe e o irmão
cochichando, como duas crianças. Pararam assim que o viram.

– Minhas orelhas estão ardendo – disse ele, indo até a geladeira e pegando uma garrafa de água. – É
alguma coisa que eu precise saber?

Ruth negou com a cabeça.

– Não. – Ela tomou um golinho do chá. – Só estava perguntando a Ale se ele sabia o que estava acontecendo entre você e Anahí .

– E eu respondi – completou Alejandro, na defensiva – que não sei de nada.

– Não sabem de nada porque não há nada para saber – afirmou Alfonso com um sorrisinho debochado. – Estou conhecendo o meu filho. Ponto final.

– Isso é maravilhoso – observou Ruth pondo a xícara em cima da bancada. – Mas... E quanto a você
e Annie?

Alfonso deu de ombros.

– O que é que tem?

Sabia que estava se fazendo de desentendido, e o jeito como a mãe franziu os lábios mostrou que ela
também sabia. Mas Alfonso não queria que nenhuma ansiedade ou especulação interferisse na sua tentativa de construir um relacionamento com Henry.

– Estou preocupada – disse Ruth, com ar sério. – Vocês dois têm uma longa história, e já sofreram
com isso. Ela mentiu em relação a Henry. Só quero ter certeza de que você vai tomar cuidado.

Alfonso soltou o ar com força. A preocupação da mãe era reconfortante, mas também desnecessária; ele estava concentrado numa única coisa: Henry.

– Não precisam se preocupar – disse, dirigindo-se aos dois. – Sei o que estou fazendo.

Nem parou para pensar por que aquelas palavras quase tiveram gosto de mentira.

O olhar que Ruth lançou ao filho era provocador como só o de uma mãe pode ser.

– Ótimo – disse, fingindo estar procurando mais alguma coisa que ainda precisava pegar. Depois,
voltou para a sala para ver como o marido estava.

– Até breve, então? – perguntou Alfonso ao o irmão, pegando a mala e se dirigindo para a porta.
Alejandro ia voltar para a Pensilvânia naquela tarde, para trabalhar.

– Claro. Quando você volta para Nova York? Tenho uma reunião com Jack no final do mês.

– Claro. Devo estar por lá nessa época, mas...

Alfonso passou a mão pela cabeça. O peso da responsabilidade e as perguntas que ele mesmo se fazia
para saber como iria organizar a própria vida agora que Henry fazia parte do seu mundo se acumulavam em seus ombros.

– Sinceramente, nem imagino o que vou fazer em relação a tudo isso – acrescentou. – Quer dizer,
como posso ficar em Nova York se Henry está aqui?

Num gesto carinhoso, Alejandro pôs a mão no ombro do irmão e apertou de leve.

– Não se preocupe com isso agora, cara – disse, tentando tranquilizá-lo. – Um passo de cada vez. Você vai chegar lá. Falou com Jack e Carlos não falou? Eles são gente boa. Vão entender.

Alfonso fez que sim com a cabeça e abraçou o irmão.

– Obrigado, cara.

Depois de uns tapinhas nas costas, os dois se separaram.

– Cuide-se, seu babaca – disse Alfonso, sorrindo e abrindo a porta da frente.

– Você também, seu panaca.

***

Anahi e Henry estavam na entrada da piscina pública, ambos bronzeados pelo sol quente. Antes de se aproximar, Alfonso se permitiu ficar ali por alguns momentos, só olhando, impressionado com a
beleza daqueles dois. Anahí se inclinou e beijou a cabeça do filho, que olhava para ela e falava sem
parar: algo que, pelo visto, ele fazia com frequência.

Se não fossem as características físicas que ele e o garotinho claramente tinham em comum, Alfonso até duvidaria que Henry  fosse seu filho. Era um menino tão esperto... Mesmo convivendo tão pouco com ele, isso era óbvio. Anahi estava certa quando dizia que ele era incrivelmente observador, e o menino se lembrava até das meias do Batman que Alfonso disse que tinha. Sorriu, incapaz de se conter.
Ficar olhando Anahí e Henry, enquanto ela nem desconfiava que estava sendo observada, aqueceu o coração de Alfonso. Apesar de tudo, dava para ver a mãe incrível que ela era. O menino a encarava e Anahi prestava atenção a cada palavra que ele dizia, sorrindo e fazendo cafuné no filho, talvez mais do que ela mesma percebesse. O papel de mãe parecia tão natural para ela...

E por que seria diferente?

Anahi sempre foi amorosa. Mas aquilo ali não era só carinho, era algo bem mais intenso. Se pegou pensando como teria sido se as coisas não tivessem tomado o rumo que tomaram.

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