____________________
"O único modo de evitar os erros é adquirindo experiência; mas a única maneira de adquirir experiência é cometendo erros."
Autor desconhecido
____________________
— Onde está o David?
Foi a primeira frase de Anne depois de mais de três horas de viagem. Gabriel a escutou e ficou feliz em escutar a voz dela, mas a pergunta em si pungiu sua alma. Engoliu em seco e respondeu com calma.
— Ele está com Elliot. Vamos nos encontrar com eles em alguns minutos... — Gabriel sentiu-se obrigado a continuar a conversa para se livrar-se daquele maldito silêncio e sem pensar direito, prosseguiu com outro assunto. — Você está apaixonada pelo David?
A pergunta não assustou Anne. Na verdade, ela manteve a mesma expressão robótica e inexpressiva que começara havia pelo menos três dias. O chiar irritante do vento sobre a janela antecipou a frase mecânica de Anne:
— Você está apaixonado pela Estela?
Aquela pergunta foi mais dolorosa e abrupta do que um acidente vascular cerebral. Gabriel olhou para sua irmã com um olhar sombrio, como se ela acabasse de dizer que era uma extraterrestre e teria de levá-lo para Marte. Por que ela fez isso, questionou Gabriel para si mesmo.
— Como assim, Anne?
— Eu gostava mais da Júlia.
Embora ela ainda falasse mecanicamente, a resposta foi sincera. Gabriel começou a tremer. Ele segurou a vontade de dizer a mentira de que Estela era Júlia, pois ele tinha consciência de que não era verdade. Ele não falava sobre o assunto com ninguém e não ia abrir uma exceção agora somente para afastar o silêncio.
Como ele não respondeu nada, o silêncio se instalou ainda mais pesado e quase asfixiante. Anne não mostrou nenhuma aversão para o calar do irmão e prosseguiu com os olhos estatelados e sem foco.
— Chegamos... Vou lhe ajudar a sair...
Gabriel abriu a porta e deu a volta até o banco do passageiro. Ele retirou o cinto dela e a ajudou a sair como se ela estivesse enferma, com dificuldade de locomoção.
Anne olhou à volta, mas não pode enxergar a cidade interiorana de nome Votuporanga. Estavam no centro e entravam em uma casa que ficava em frente à única praça. Pessoas humildes olhavam para os visitantes invasivamente e na sequência conversavam entre si para discutir sobre qual família eles pertenceriam.
Ao atravessar o pequeno portão de menos de um metro e meio, avançaram sobre um quintal bem cuidado e entraram em uma cozinha que cheirava a bolo de banana e chá de hortelã. Sentado sobre a mesa estava Elliot, concentrado no manuseio do garfo sobre o bolo suculento e cheiroso em seu prato.
De repente, Letícia apareceu de uma passagem sem porta e se assustou ao mirar em Gabriel e Anne que apareceram do nada. Ela disse um olá sem graça e sentou ao lado de Elliot.
— Onde estão os prisioneiros? — perguntou o irmão.
— UM EM CADA QUARTO! OS REFÉNS ESTÃO DORMINDO. DEMOS UNS COMPRIMIDOS PARA ELES DESCANSAREM E NÃO POSSO GARANTIR SE VÃO ACORDAR NOVAMENTE. EM RELAÇÃO A DHERICK, ESTÁ ACORDADO ATÉ AGORA, ATÉ HOJE. NÃO O DEIXAREMOS DORMIR ENQUANTO NÃO NOS FALAR COMO FUNCIONA O CÂMBIO...
Gabriel estava mentalmente fraco. Sabia que se continuasse a utilizar o Fluxo de maneira desmedida, correria grande risco físico e mental. Mas o que ele poderia fazer? Dizer não? Eles já fizeram o mais difícil, não podiam desistir. Ele tinha esperança de que em breve não teria que ficar mais diretamente contra os Quânteros e poderia voltar à vida como era antes, com sua irmã e sua amada...
YOU ARE READING
O Olhar de Caronte
Science FictionE se você fosse capaz de enxergar a Morte? Não como um profeta apocaliptico, mas como um jovem errante, que duvida de sua própria sanidade. O que você faria se ela sentasse ao lado das pessoas que ama? Seria louco o bastante para avisá-la ou seria a...