Capítulo 01

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4 anos antes...

Alfonso estava sentado, com o queixo apoiado nas mãos entrelaçadas, os olhos vidrados no banco vazio a sua frente. Por sorte, o trem estava com menos da metade de sua capacidade, de forma que ele tinha um vagão inteiro para si. Tentava delinear em sua cabeça como seriam seus dias dali pra frente, como voltaria às atividades de sua fábrica, no entanto, a mente vagava por diversos momentos da vida com Anahi, principalmente aqueles em que ele poderia não ter sido um completo crápula.

Estava tão absorto na própria dor que só percebeu que Maite havia entrado em seu vagão quando ela pôs a mão sobre seu ombro, com uma expressão complacente de companheirismo. Também estava sofrendo, no entanto preferia demonstrar apoio ao irmão, pois fortalecer aquele laço a ajudaria a vislumbrar o futuro de uma forma mais otimista.

- Vão servir o jantar - ela avisou, acariciando-o - Você quer comer?

Alfonso meneou a cabeça em negação e Maite suspirou, triste.

- Não se preocupe, não estou fazendo greve de fome - garantiu com um semissorriso - Comi algo há pouco tempo.

- Tudo bem. Chegaremos em poucas horas, a tempestade já passou.

Na verdade, Alfonso ainda se sentia no meio de uma tempestade, mas não dessa a que Maite se referia. Ele afastou a cortina e observou o vulto das árvores correndo ao longo do caminho. A paisagem até Los Angeles era cinza e seca. Apesar da alegria que a América prometia ao restante do mundo, sob as atuais circunstâncias, não era nada animador voltar para lá.

Ele dormiu e só acordou quando os passageiros desembarcavam. Da estação, tomou uma carruagem e foi levado até sua casa. E vislumbrar o ponto de onde teria que retomar sua trajetória quase o fez desmoronar. O mesmo ponto de 4 anos atrás.

Estar ali novamente, carregando apenas culpa e frustração de uma trajetória que fora tão intensa, era como transformar o que vivera em Londres em uma simples pausa sem fundamento. Ele ainda não enxergava o sentido de ter vivido tanto e de se sentir agora tão vazio. Isso era, talvez, o mais difícil; pensar que fora o único responsável por frustrar seus próprios objetivos.

A vida que levava em Los Angeles antes de sua partida fora tal e qual sonhara quando tinha metade da idade de hoje. Agora, a fábrica estava igual, os empregados eram os mesmos, não havia desfalque financeiro, seus pais ainda o amavam. Em teoria, seria muito fácil retomar de onde parou. Mas Alfonso sentia tudo completamente diferente. Não havia sensação de pertencimento, não existia mais a completude de estar ali. E ele sabia exatamente o que faltava.

Quando assinou aqueles papéis, ainda tinha muita vontade e, sobretudo, força para fazer o que fosse preciso para reerguer o seu casamento, no entanto não estava preparado para ouvir Anahi dizer que a única saída para uma vida feliz era vivê-la longe dele.

Era intragável, intolerável para Alfonso pensar nessa alternativa. Mas se podia fazer qualquer coisa pela felicidade dela, poderia fazer isso também. Mesmo a contragosto e se sentindo esmagado pelo desespero dessa decisão, era o que estava fazendo: indo embora, deixando a vida em Londres para trás, abandonando uma história para se reconstruir. Mais uma vez.

***

Arthur se encostou no vão da porta, observando a filha. Ela estava sentada no sofá da sala, uma xícara de chá fumegando em sua mão. Olhava fixamente o crepitar das chamas da lareira e sua mente parecia a quilômetros de distância dali. Ele pigarreou para chamar sua atenção e ela ergueu o olhar, sorrindo em seguida.

- Há quanto tempo está aí?

- O suficiente para perceber que está preocupada com alguma coisa - disse ele, arrastando a bengala pela sala para se aproximar. Anahi pareceu refletir por alguns segundos antes de dizer:

- Amanhã faz uma semana que Alfonso foi embora e é o fim do prazo que me dei para começar as atividades as quais me propus.

Arthur assentiu, compreensivo, sentando ao lado da filha.

- Se não se sente preparada ainda, pode aumentar o prazo - Anahi pareceu não gostar da ideia e balançou a cabeça em negação - Está pensando em outra coisa?

- Não estou pensando nele, se é o que quer saber.

- Não se torne inflexível, querida - Arthur suspirou, acariciando o joelho da filha - Você tem o direito de sofrer, de repensar, de esperar.

- Não tenho tempo para sofrer - ela devolveu, enfática, evitando o olhar sensível do pai para que ele não a fizesse, justamente, ser flexível em um momento onde precisava ser apenas forte e dura.

- O tempo é capaz de responder muitas coisas, se você souber entendê-lo e respeitá-lo - ele disse, arrumando os cabelos dela atrás das orelhas - Está indo muito bem. Tenha paciência.

Ela assentiu, sorrindo para ele. Em seguida foi deixada novamente sozinha e o nó que prendia sua garganta desatou em forma de soluço. Um fio de lágrimas escorreu e ela simplesmente deixou, baixando a cabeça. Sentia-se dentro de uma bola de neve, onde quanto mais caminho ela percorria, mais crescia, e assim mais presa Anahi ficava.

Ainda sentia a sobrecarga de ter que se reerguer, embora quem a tivesse derrubado não estivesse mais ali. De fato, ela tinha quem lhe desse a mão. Tinha uma família, amigos e agora estabilidade financeira, mas o peso de perder um filho e de viver um divórcio turbulento ainda pairava apenas sobre os seus ombros. Era ela quem teria que enfrentar isso dia após dia, até que algum dia as emoções ruins, e tudo que lhe causava medo, pudessem cessar.

Anahi se recolheu poucos minutos depois. O chá a acalmou, amenizou sua angústia e insegurança. Fora uma semana cheia, mas ela estava conquistando sua paz novamente, pouco a pouco. E amanhã seria um dia decisivo. Ela tinha tudo delineado. Tudo estaria sob seu controle, afinal.


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Oi gente!!! Que felicidade enorme ver vocês por aqui!! Me dá motivação de voltar a aproveitar meus tempinhos livres pra vir aqui. To mtmtmt feliz de verdade com os comentários, com as estrelinhas. Obrigada pelo apoio s2

O comecinho dessa fase é mais tranquila pra ser mais esclarecedora, pra situar melhor vocês sobre as coisas que vem pela frente. Só posso adiantar que: o que é do Alfonso ta guardado viu??? Não quero ninguém passando pano pra ele. Qualquer coisa releiam a RDO pra lembrar do caos que ele causou pra Anahi! (hahahahhahah claramente tenho uma fav e vou protegê-la)

Espero voltar muito em breve!!! Fiquem em casa s2

Depois do InvernoWhere stories live. Discover now