Capítulo XXVII

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"Se eu puder impedir um coração de partir, não viverei em vão." - Emily Dickinson.

**Só uma observação: a frase acima descreve bem a essência de uma das personagens.

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》(SeuNome)

Vivo, literalmente, como um cachorro. Tenho uma vontade absurda de atacar, de arrancar com dentes e unhas a vida daqueles que odeio, mas sou um cão preso por uma corrente. E enquanto lato, de modo raivoso e incontrolável, sei que meu alarde incomoda alguns ouvidos e, então, aceito a surra - da vida - que me dão e volto para minha casinha com o rabo entre as pernas. Mas por dentro e no interior daquela casinha, fico a olhar para fora pensando no dia em que arrebentarei essa corrente e me vingarei de cada um. Vivo como um cachorro fiel ao dono, no entanto, alerta, sempre a vigiar, pronto para proteger. Era um cão de guarda sempre vigiando pela janela.

Me sobressalto ao sentir aquele corpo se posicionar atrás de mim e envolver meu pescoço com os braços. Estava sentada na sala de jantar segurando uma caneca contendo café ainda cheia, mas com líquido já frio devido ao esquecimento, com os olhos focados na janela que mesmo que quisesse, não perceberia alguém se aproximando.

- Hey, calma, sou eu. - A tensão instalada sobre meu corpo foi dissipada assim que aquela voz soou em meu ouvido. Meus olhos vidrados em vigília ao quintal pareceram desembaçar do receio que espreitavam do lado de fora.

Era já madrugada. Talvez já passasse das duas da manhã, não posso dizer com certeza. Senti Emily apoiar seu queixo sobre a minha cabeça. Ela não disse nada, sabia que eu precisava do silêncio por pelo menos alguns segundos. Com seu corpo preso às minhas costas, eu sentia a protuberância da sua barriga encostando no meu corpo, uma das razões que haviam me levado a tal estado de vigilância.

Faziam duas semanas desde o episódio em que Emily foi parar no hospital por causa de Nicholas, desde que ela havia me pedido para matá-lo e desde que eu havia consentido com o que exigia de mim. Faziam exatas duas semanas que eu não ia ao restaurante porque tinha medo de sair e deixá-la sozinha e, quando eu voltasse, não a encontrasse bem como a havia deixado. Há duas semanas eu mal conseguia dormir uma noite inteira com medo de que Nicholas estivesse nos espreitando atrás de um muro ou de um poste, esperando o momento certo para destruir nossas vidas. Um dia após ter me pedido para tirar a vida daquele homem monstruoso, Emily pareceu se dar conta do absurdo que havia dito, do quão longe havia ido ao se deixar dominar pela raiva e pelo medo. Me pediu desculpa, disse que havia exagerado, mas que Nicholas ainda merecia alguma punição, assim, entramos com o pedido de uma medida de restrição contra ele. Fora isso, me fez prometer que eu não faria justiça com as próprias mãos. Lhe custou muito conseguir me convencer a não tomar uma atitude mais radical quando, ela via nos meus modos, no meu estado alerta e nos meus olhos que eu queria exterminar Nicholas da face da Terra. Porém, depois de tanto falar em minha cabeça, conseguiu me convencer a não agir por conta própria.

- Por que não vem para cama comigo? Está tarde, (SeuNome). Está aqui há tanto tempo. Precisa descansar. - Ela falou ao tirar o queixo de sobre minha cabeça e posicionar-se ao meu lado, o que me fez virar a cabeça para poder encará-la. - Vem. Vamos.

Ela pegou em minha mão me fazendo levantar da cadeira. Enquanto caminhávamos até o quarto, pelo menos a cada três ou quatro passos, ela voltava a cabeça para trás como se quisesse captar minhas reações - as quais se mantinham sérias - ou manter vigília sobre mim, como se quisesse se assegurar de que eu não fugiria de sua posse. E ela sorria, um sorriso fraco, tímido e, às vezes, um tanto triste e preocupado.

Ao entrarmos no quarto, ela me fez ir na frente, porque voltou para trás para fechar a porta. Numa fração de segundos depois ela estava me abraçando por trás, colocando sua cabeça sobre meu ombro para, então, ao soltar um riso rouco e abafado contra meu pescoço, se colocar a beijar aquela parte de pele exposta ao seu alcance. De início eu acabei cedendo ao tentar dar mais espaço a ela, além do mais, eu, há tanto tempo, andava tão tensa... Porém, não permiti irmos em frente.

Sete (Camila/You)Onde histórias criam vida. Descubra agora