Capítulo 46: Do que não podemos fugir

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Deodor abriu os olhos devagar. Podia escutar passos próximos, ficou imoveu em sua cama, ouvindo aqueles passos apressados, para lá e para cá. Esperando o momento certo. Então eles finalmente tinham vindo atrás de sua cabeça. Só estava achando estranho o som daqueles passos, não eram ocos e abafados como quando se pisa em madeira, e tinha certeza que o chão de sua casa era de madeira, mas aqueles passos tinham um som molhado e pegajoso, parecido com o barulho de uma bota chapinhando na lama. Estava prestes a se levantar, mas então viu uma sombra se arrastar por cima de sua cabeça. Virou o rosto na direção dela, e então percebeu que ela estava sendo projetada pela aba de sua tenda sendo empurrada pelo vento. Lembrou-se imediatamente que não estava na solidão de sua casa, e sim em um dos Fronts de batalha próximos a fronteira minandrense.

"Então ainda não chegou o dia que decidiram me calar."

O general se dobrou em seu saco de dormir. Sentiu um sopro fraco bater contra seu braço, mas ele vinha do lado contrário da abertura da tenda. Olhou nessa direção e percebeu que era a tenente Kserthy, que estava dormindo próximo a ele em outro saco de dormir.

"Ah, então chegou a hora de ganhar meu infame titulo de "estuprador". Que beleza..."

Jogou a ponta do cobertor para frente, estava vestindo suas calças. Pelo menos sua consciência estaria limpa então. Se levantou de mau jeito, as costas e o pescoço queimavam, meneou a cabeça em todas as direções, tentando aliviar a dor nos músculos do pescoço. Pegou o casaco preso sobre o arranjo metálico da tenda e depois seu chapéu na quina da mesa. Ambos ainda estavam meio úmidos. Antes dele sair, um rosto conhecido apareceu na abertura luminosa da tenda. Era Crust. O outro general teve que se abaixar um pouco para conseguir passar pela entrada, deixando que feixes de luz atravessassem a escuridão do interior da tenda de Deodor. Uma das faixas de luz acertou em cheio o rosto de Kserthy, que se revirou no saco de dormir com a repentina claridade.

-Ora Deodor, finalmente decidiu seguir meu conselho de achar uma boa esposa e ter alguns filhos antes de ser assassinado?

Sorriu o enorme homem de preto na direção de Deodor depois de observar a mulher dormindo. Deodor mostrou os dentes afiados e o olhar duro enquanto arrumava a aba do chapéu.

-Me deixe em paz porra, ela só não conseguiu achar um lugar para dormir, só isso. Não fizemos nada.

-Eu sei, eu sei... você é profissional demais para isso. Resta saber se isso é bom ou ruim.

-Independente do que seja, não houve nada.

Sussurrou Deodor agressivamente para o amigo enquanto andava em sua direção.

-Calma, calma. Não vim aqui te acusar. Temos novas informações.

-Ótimo.

Murmurou Deodor saindo da tenda junto ao companheiro. Os soldados do lado de fora tremeram ao ver seu rosto carrancudo emergir da tenda.

-Você não vai acordar a Tenente?

Perguntou Crust indo atrás do amigo.

-Deixe ela dormir mais um pouco. Sequer é a hora de levantarmos.

-Que bondoso da sua parte.

Ambos os generais se dirigiram até uma tenda maior, a frente dela, havia um mensageiro com uma armadura leve de metal reluzente montando um cavalo. Estendeu a mão para Crust, lhe entregando duas cartas e então esporeou o animal em outra direção. Os dois entraram na grande tenda. No meio dela tinha uma mesa com um grande mapa da região estendido. Crust se postou sobre a mesa com as duas grandes mãos pálidas sobre a borda de madeira polida. Já Deodor cruzou os braços, olhando o mapa por cima.

O Arauto dos Mortos (revisão em breve)Where stories live. Discover now