Três

154 43 270
                                    

Lúcia gritou como se estivesse vendo uma assombração. Só isso explicaria alguém aparecer do nada em seu jardim. Mas não seria possível, seria? Fez rapidamente uma nota mental para evitar documentários sobre fantasmas e casas assombradas.

Tentando manter o mínimo de racionalidade, ela observou que, ao que tudo indicava, era só um rapaz estranho, vestindo roupas simples, mas impecavelmente limpas e passadas. Nada disso evitou que ela se assustasse da mesma maneira. Ele poderia ser um ladrão, um psicopata ou um tarado!

— Boa... noite? — ele disse, como se testasse as palavras, ao mesmo tempo em que ergueu os braços, como se estivesse em rendição. Parecia tão assustado quanto Lúcia, que estava paralisada, mesmo sabendo que deveria correr para dentro e trancar a porta o mais rápido possível.

Mas já era tarde demais para isso. Pelo canto dos olhos — porque não queria desviar o olhar do estranho —, viu Julieta passar por ela e ir em direção ao homem. Como poderia se trancar dentro de casa e deixar Julieta correndo riscos lá fora?

Nunca. Antes a vida dela do que a de Julieta, mesmo que não se sentisse nada heroica naquele momento.

— Julieta... psst psst. Juli, vem pra cá!

Maldita hora que escolhera ter um gato; se fosse um cachorro, teria atendido seu chamado de primeira. Mas não, Julieta se aproximava cada vez mais, parecendo bastante curiosa para investigar a nova visita.

— Você é minha humana? — o estranho perguntou, em tom de dúvida.

Lúcia ainda não tinha desviado os olhos dele, mas agora parecia confusa. Eu sou o quê?

— Quem é você? Como você entrou aqui? — ela respondeu com mais perguntas, percebendo que sua voz estava estridente.

Silenciosamente, calculava se conseguiria correr para pegar Julieta e voltar para dentro de casa antes de ser pega, mas concluiu que não seria tão rápida assim.

— Chamo-me Ak2Fw5 e cheguei assim. — Ele mostrou um pingente em sua mão, como se fosse um chaveiro. Lúcia não conseguia enxergar da distância em que eles estavam, mas aparentava ser um foguete em miniatura.

A falta de sentido no que o homem dizia a fez ter vontade de rir de nervoso. Um louco tinha invadido sua casa e não estava falando coisa com coisa. O que ela ia fazer agora?

— Lúcia?! Está tudo bem aí? — Era sua vizinha que chamava, uma senhorinha que morava na casa ao lado. O muro era alto o suficiente para impedir que ela enxergasse o que acontecia ali, mas com certeza tinha ouvido o grito de Lúcia.

Talvez fosse a chance que ela precisava para pedir socorro, pensou, mas estancou quando o estranho fez sinal de silêncio.

E se pedisse socorro e ele a matasse? Ou pior, matasse Julieta?

— Não foi nada, dona Ziza — respondeu, um tanto incerta.

— Era só uma barata...

— Ahhh... — A vizinha riu como se achasse Lúcia uma tola. — Seu grito me assustou, se precisar de alguma coisa pode me chamar! Baratas... Veja só, esses dias me apareceu um rato!

— Obrigada, dona Ziza! — Temendo também pela vida de sua vizinha, tratou de cortar o assunto. No fundo, esperava que sua voz entregasse alguma coisa sobre o medo que estava sentindo e que chamasse a polícia.

Pensando que talvez quem estivesse ficando louca fosse ela, viu quando Ak2Fw5 movimentou uma das mãos e algo como um domo surgiu em volta deles. Transparente, mas com um leve brilho se você olhasse pelo ângulo correto.

Plutão ainda é um planeta? [DEGUSTAÇÃO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora