XLV - Ondas

30 5 6
                                    


Começou a pensar, tomado por um súbito pânico, que aquilo tinha sido uma péssima ideia quando se deparou com portas fechadas e gemidos abafados vindos desses quartos trancados. Encostou-se a uma parede e tentou estabilizar a cabeça, mas os balanços não terminavam – porque era o mar, porque era a bebida, porque era a adrenalina da novidade e tudo se misturava perigosamente.

Mike passou a mão pelo rosto. Precisava de encontrar o Chester e depois tentar sair dali. Era uma festa privada num iate luxuoso, estavam ancorados ao largo, na baía de uma praia exclusiva na ilha da Sardenha, Itália, mas haveria de existir um barco táxi que os pudesse levar a terra e terminar aquela aventura sem outros constrangimentos. Foi divertido, mas ele achava que as coisas estavam a perder o controlo e, bem, ele não queria que lhe beliscassem a reputação ou o nome da banda. Naquela fase seria muito mau, pois eles eram novatos na cena e eram respeitados pela sua postura mais intelectual, do que física, apesar de toda a emoção vertida nas suas canções. Um escândalo seria incrivelmente mal visto.

No entanto, foi por causa da sua fama mundial que eles tinham recebido o convite para a festa. O empresário disse-lhe que era melhor aceitar, porque eles eram estrelas da música e fazia parte dos ossos do ofício andarem em festas. De certeza?, perguntou, desconfiado. Preferia outro tipo de festas, ligadas à música, acrescentou. Entregas de prémios, apresentações de discos, espetáculos underground, galerias de arte com concertos exclusivos... O empresário sacudiu as mãos. Eles iriam e ponto final. De sugestão passou a ordem e ele soprou, inquieto. Detestava que lhe dissessem o que fazer, mesmo que o empresário fosse o seu patrão teórico e quem, também em teoria, lhe pagava as contas. Fazia tudo parte da imagem. Imagem... Podia começar uma discussão em que afirmava que se estava cagando para a imagem, mas achou que iria perder e que iria irritar-se, também não estava para isso. E depois perguntou por que motivo só ele e o Chester tinham sido convidados. Vocês é que são a linha da frente, rapazes. Habituem-se.

O início daquilo foi péssimo, portanto.

O Chester, como sempre, estava excitado com a possibilidade de uma festa num iate luxuoso. Ele adorava festas e comparecia a todas para as quais era convidado – que eram bastantes. As solicitações eram tantas que o Chester chegava a ir a várias numa mesma noite, aparecendo durante cinco minutos, bebia qualquer coisa, cumprimentava os anfitriões e depois seguia para a próxima de uma lista composta por mensagens no seu telemóvel que ele ia apagando à medida que as ia visitando. Nem parecia o mesmo Chester que, naquela rave, no ano de 1999, lhe tinha confessado, cheio de timidez, que quando era adolescente nunca era convidado para nada. Com o sucesso da sua carreira enquanto cantor alcançara a notoriedade e isso vinha com certos adornos...

Chegaram os dois um pouco atrasados ao cais, onde se faria o transporte para o iate por meio de lanchas rápidas, mas isso incluía-se na tal imagem. Serem caprichosos, ou coisa que o valha. O Chester foi logo rodeado por outros convidados que fizeram questão de o cumprimentar, com elogios e copos gelados de champanhe. Mike não era tão requisitado e deixou-se ficar para trás, a observar o ambiente elétrico e descontraído.

Estava um dia muito quente e o brilho do sol refletia-se nas ondas azuis do mar Mediterrâneo. A festa acontecia no convés superior do iate. Havia mesas cobertas com toalhas brancas onde se dispunham aperitivos e bebidas. Um animador dispensava música numa potente aparelhagem de som, remisturando temas dançantes. Numa plataforma mais baixa, com uma rampa que permitia o acesso ao mar, estavam espreguiçadeiras e toalhas para quem quisesse dar um mergulho.

A embarcação pertencia a um milionário que apreciava juntar pessoas famosas. Mike não fixou o nome do homem excêntrico. Estava lá também um ator de Hollywood, disseram-lhe, mas ele nunca o viu, ou reconheceu alguém que pudesse ser esse ator. A maioria dos presentes pertencia ao mundo da moda e dos negócios em bolsa, ele e Chester eram os únicos músicos. Peças exóticas destinadas a embelezar o conjunto, julgou. Havia também mulheres bonitas, modelos e acompanhantes de luxo, que se insinuavam aos homens, mesmo aqueles que estavam acompanhados. Chester já tinha uma mulher dessas consigo, que agarrava pela cintura fina e que se predispunha a sorrir a tudo o que ele pudesse dizer. Ele continuava a observar, preparado para qualquer eventualidade.

O Lado Oculto da LuaWhere stories live. Discover now