Capítulo 19 - But no one knows

286 50 99
                                    

Aprendi a me encontrar na minha nova rotina, as plantas no meu jardim eram diferentes agora, mas ainda eram plantas. A vista do pôr-do-sol recaindo pela cidade agora era de outro ângulo, mas ainda tinha os mesmos tons de laranja e rosa de sempre. Tudo era diferente, mas havia conforto nisso.

Aos poucos, a vida foi entrando nos eixos: as reuniões com os advogados sendo mais produtivas, Lindsey me tratando com menos desdém. Bandit estava feliz porque tinha dois quartos completamente diferentes e talvez eu não estivesse com ela o tempo inteiro, mas fazia questão que o nosso tempo juntos fosse de qualidade.

Tempo, essa unidade bizarra que a gente usa para se organizar na nossa vida e que ajuda a melhorar as dores das feridas. Que faz com que a gente esqueça o que é ruim e fique só com o que foi bom.

O último mês passou voando - parecia que ontem eu estava no quarto de hotel recebendo as palavras que entravam em meu peito como balas, da boca de Frank. No começo, tive ódio e não acreditava. Culpei-o por arruinar minha vida e mudar tudo, porque eu ia muito bem, obrigado, até ele ressurgir. Depois, fui grato - eu e Lindsey já não íamos bem há certo tempo, então não tínhamos como sobreviver a muito mais... tempo. E por fim, fiquei só com a saudade.

Mikey se fez presente e me culpei por todos os dias que pensei em falar com ele e não o fiz, por todas as vezes que considerei ir visitá-lo e não fui. Recebi na noite anterior a notícia que ele ia ser pai, que Kristin tinha conseguido engravidar. Eu estava transbordando de alegria por eles, principalmente porque agora meu irmão teria a chance de ser pai. Mikey disse que passaria em minha nova casa pela manhã.

Talvez fosse o divórcio, ou a proximidade dos quarenta anos, mas resolvi que era momento de adquirir novos hábitos. Eram 7h30 quando acordei antes que o meu despertador tocasse, porque eu tinha esquecido de fechar a cortina e o sol era forte. Era o horário perfeito para ir correr pelo bairro - okay, não exatamente correr, mas pelo menos tentar.

Era quinta-feira e o fim de semana trazia com ele a alegria de ficar com Bandit, que estava finalmente empolgada com a vida nova, depois de certo tempo questionando e me odiando. Eu tentando não compensar minha ausência com coisas materiais e me contando o tempo inteiro que essa agora era a nova realidade.

Saí de casa meia hora depois de acordar, para dar a minha volta pela vizinhança. O vento levemente fresco contrastando com o sol da manhã tornava a paisagem linda. Vendo isso enquanto eu ouvia minha nova playlist favorita me fazia acreditar que um dia eu poderia até me tornar uma pessoa matinal.

Cheguei em casa, fiz um café e comecei a repassar mentalmente o que ia fazer no dia: passar a manhã escrevendo, a tarde buscando referências. No dia seguinte, uma mesa de leitura de roteiro. Talvez eu devesse anotar.

A campainha soou e eu esbravejei porque Mikey não avisou que chegaria antes das 10h - aliás, quem em sã consciência faz visita antes das 10h? Depois de berrar um "já vou", fiz meu caminho em direção à porta.

"Por que tão cedo? Caiu da cama?" Falei enquanto girava a chave da porta afobado. Quando finalmente me dei conta, quase tive um infarto, porque não era meu irmão.

Era Frank. Frank e seus olhos de cachorrinho perdido na mudança, e suas tatuagens que escapavam da gola da camiseta, e seus lábios rosados. Ele não tinha o menor direito de aparecer ali, muito menos sem avisar. Ainda mais em um vida em que ele tinha sido acabado de ser removido. Ele tinha feito sua escolha, no fim.

"Oi, Gee," ele disse. Estava nervoso porque quebrou nosso contato visual e eu queria ter a coragem de fechar a porta na sua cara. Mas eu fiz o contrário, a porta se abrindo mais ainda revelando uma mala em seu ombro. "Tem lugar pra mais um aí?" ele perguntou, sorrindo divertido.

Levei alguns segundos processando sua fala, porque era um sonho que se tornava real, finalmente. Era a primeira vez em que fazíamos aquilo sem o peso de esconder - éramos só nos dois ali, sem nossas bagagens, nossos anseios. Não dei tempo para que ele argumentasse, apenas lancei meus braços ao redor de seu corpo, puxando-o contra mim. O cheiro conhecido preencheu minhas narinas e fechei os olhos para me deleitar com aquilo. Frank me abraçou de volta.

"Eu já tinha desistido, achei que você não viesse," confessei ao pé do ouvido de Frank. Arrastei meus lábios sobre a pele de sua bochecha, meus olhos fechados para aguçar meus outros sentidos. Quando cheguei em sua boca, a textura que eu não sentia há certo tempo me desnorteou por completo. Entreabri meus lábios, minha língua pedindo passagem pelos seus.

Nossas línguas se envolveram de maneira conhecida - e como isso era bom. Eu mal podia esperar para passar o resto dos meus dias repetindo aquela ação, e o melhor, a qualquer momento que eu quisesse. Um misto de saudade e alegria embalando o beijo, que foi se tornando mais intenso. Antes que partíssemos para a comunicação-não verbal, na qual éramos especialistas, quebrei o beijo e me afastei parcialmente dele.

"Vem, entra," eu disse, tomando sua mão. "As coisas por aqui ainda estão meio caóticas, porque eu mudei não faz muito tempo," Frank olhava ao redor, tentando se localizar. "Você pode dormir no quarto de hóspedes," virei o rosto para encontrar um Frank confuso antes que eu desmanchasse minha expressão séria em uma risada baixa. "Fica tranquilo, Frankie, seu lugar é na minha cama."

Soltei sua mão para ir à cozinha, enquanto ele andava pelo lugar, fazendo o reconhecimento, afinal, agora ali também seria o seu lar. Okay, eu estava assumindo por nós, mais uma vez. Mas pelo menos era por uma boa causa.

As duas canecas pretas foram o primeiro item que comprei para a minha nova casa, começando pelo início: que fossem a primeira peça de louça que eu pegasse todos os dias. Preta porque era a minha cor favorita e a de Frank, que secretamente esperava que um dia compartilhasse aquele lugar comigo. E aquilo estava acontecendo.

Ele se sentou no banco à frente do balcão da cozinha, eu do outro lado, estiquei a caneca para ele. Observei enquanto ele sorvia o café com calma, devia estar organizando suas palavras na cabeça.

"Okay, eu começo," eu falei. "Como você descobriu meu endereço?" Eu ainda não havia mudado quando nos vimos pela última vez e tampouco tínhamos conversado.

"Eu... Hm... Você tinha dito que estava no Mikey, né?" eu acenei positivamente. "Então, eu fui lá e você não estava, obviamente, mas ele me passou seu endereço," Frank entrelaçou os dedos ao redor da caneca. Eu achava lindo como ele gostava de sentir o calor suave da louça contra sua mão, como ele achava conforto nesse pequeno ato.

"Eu vou matar o Mikey," eu disse entre goles. Frank riu.

"Gee, eu preciso te pedir desculpa. Eu estava com medo de encarar tudo, mas eu sempre estivesse certo que isso aqui era o que tinha que acontecer," ele estendeu sua mão sobre o balcão, pedindo pela minha. Segurei-a, olhando para os desenhos nas costas dela, feliz que agora eu teria tempo de memorizar cada um.

"Tudo bem, Frankie. Eu também preciso, eu e a minha mania de tomar decisões por nós dois sem te consultar não somos exatamente justos," uma risada triste deixou meus lábios, eu quebrando o contato visual porque sempre fui orgulhoso demais para pedir desculpas. A mão de Frank pressionando a minha, no entanto, mostrando que ele aceitava as minhas desculpas.

"Vamos começar direito, agora?" ele falou.

"Sim," eu concordei. "Prometo que vou parar de criar narrativas na minha cabeça e assumir as coisas por você."

"E eu prometo que vou tentar ser o mais assertivo possível e dialogar sempre," ele disse, puxando minha mão para levar aos seus lábios, depstando um beijo delicado sobre ela. "Olha só, parece que finalmente fizemos nossos votos de casamento," compartilhamos uma gargalhada gostosa.

Por mais que nossa história atual tivesse começado de um jeito errado, passado por diversos altos e baixos, agora a gente tinha a chance de recomeçarl.

Havia muito que não sabíamos ainda um do outro, mas teríamos todo o tempo do mundo para descobrir. Agora estaríamos juntos para enfrentar as adversidades e também para perder tempo brigando sobre o jantar ser pizza ou hamburguer.

A partir daquele momento, Frank não seria apenas o meu primeiro e o último pensamento, seria a pessoa com quem eu compartilharia a minha vida e tudo aquilo que a envolve: os momentos de tristeza, mas também as alegrias.

Bendito o dia em que eu troquei com Lindsey a tarefa de ir à reunião de pais.

No One Knows [FRERARD]Onde histórias criam vida. Descubra agora