Os Dois lados da moeda II

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Caminho lentamente observando de esguelha o homem que me acompanha atentamente.

Retiro a túnica pesada e a coloco sobre uma mesa no canto, perto de algumas frutas.

— Bom, acho que podemos começar a conversar. — Giro o corpo e o encaro.

Erion me observa dos pés à cabeça. Sua expressão passa de surpreso para divertimento.

— E o que exatamente, vossa Majestade gostaria de conversar? — Sua voz grossa chama minha atenção, mas o deboche ao me chamar de vossa Majestade me irrita.

Respiro fundo e indico um lugar para que ele pudesse se sentar, o que foi prontamente negado.

Dou de ombros e caminho lentamente até a cadeira mais próxima.

— Acho improdutivo ficarmos em um cabo de guerra. Ainda mais na situação em que nos encontramos.

Sento-me e apoio minha cabeça na minha mão, encarando-o com a cabeça inclinada.

— Seus problemas não me importam, Rei Elliot.

Rio.

— Não são problemas só meus, Erion. — Nem me toco de tê-lo chamado tão casualmente e possivelmente ele nem tenha ligado. — Breve eles chegarão até Óros e depois a toda a Anun.

Erion semicerra os seus olhos, desconfiado.

— Isso é algum tipo de ameaça? Eles quem?

Olho no fundo de seus olhos azuis. Observando-o mais atentamente, as características comuns de seu povo estavam ali. A pele bronzeada devido ao calor das terras de Anun, o corte de cabelo disciplinado deixando algumas mechas recair sobre sua testa. Além, é claro, de sua altura. Erion, exclusivamente era extremamente grande. Provavelmente culpa de sua linhagem.

Viro meu rosto disfarçando a minha pequena observação mental e a quentura em meu rosto.

— Não. Está mais para um aviso. — Envio um leve sorriso para ele.

Estranhamente, Erion se surpreende.

— Não sei se já ouviu falar sobre o Humano de Mil Anos. Aquele que livrou Procástia das mãos do Tártaro há mil anos atrás.

— Ouvi que despertou de seu sono eterno.

— Sim. E parece que alguém não o deixa ter um pingo de paz. — Levanto-me e caminho ficando frente àquele muro de músculos. — Nossos reinos estão em extremo perigo, Erion. Meu objetivo aqui hoje não é atacá-lo ou continuar com atritos desnecessários. Eu não tenho conhecimento da situação de seu povo, mas gostaria de entender o motivo de sermos atacados por vocês frequentemente. Quero solucionar nossos problemas, mas não posso fazer isso sozinho.

Observo Erion trincar seu maxilar e sua mente trabalhar lentamente.

Volto até a mesa de frutas e pego uma maçã.

— Sei que para prosseguirmos um lado terá que ceder alguma coisa, então me diga. O que você quer.

Erion encara seriamente a fruta.

— Isso.

Estranho sua fala e observo a fruta em minha mão.

A interrogação deveria ser tão grande em minha cara que fez Erion revirar os olhos.

— Comida. Nossa região é extremamente seca, nossas plantações e animais quase não sobrevivem ao clima. — Me impressiono com a fala de Erion, acho que mais por ele estar abaixando a própria guarda para alguém que acabou de conhecer? Lembro de estudar que seu povo era extremamente orgulhoso.

O Rei de Óros caminha até um sofá e se joga bufando.

— É vergonhoso falar sobre isso. Não tem muito tempo que estou no comando do reino, depois que meu pai se foi tudo começou a desandar. E roubar era a última coisa que queríamos fazer, mas eu cheguei a pedir ajuda a você uma vez e fui totalmente ignorado.

Largo a maçã sobre a mesa e caminho até Erion.

Sento-me ao seu lado e percebo seu corpo se retesar. Ignoro isso por um momento.

— Pera aí. Eu não lembro de ter recebido uma carta sua.

Encaro seus olhos confusos.

— Eu fiz questão de enviar minha melhor Harpia até vocês. — Ele fala entredentes.

— Oooh. — Digo desconcertado. — Bom... Eu não sei como te falar isso.

Erion franze suas sobrancelhas enquanto eu disfarço encarando a entrada da tenda.

— É que harpias são tipo um prato exótico em Gaia. — Sorrio sem graça.

Por um longo tempo ficamos nos encarando, eu esperando que ele não surtasse e ele, creio eu, tentando conciliar a informação.

— Então você nunca recebeu minha mensagem.

— Não.

Percebo que Erion ficou desconfortável.

— Mas isso não importa. Ocorreu um erro de comunicação. Se você ainda quiser ajuda, estou aqui. Você não é uma harpia e não precisará se tornar um prato exótico.

Ele me encara por um momento e acaba rindo.

Acabo o acompanhando.

Quando não conseguíamos mais continuar ele me encara ficando, aos poucos, sério.

— Eu peço perdão por atacá-los. — Erion meneia sua cabeça.

— E eu peço perdão por não tentar entender a situação de vocês.

Ficamos quietos por um momento.

Levanto-me de abrupto e percorro a tenda.

— Não trouxe sua esposa?

Viro-me esperando sua resposta. O mesmo arregala os olhos por um momento e logo sorri sem graça.

— Eu não sou uma boa companhia para uma dama.

— Hum. Eu discordo. Pelo pouco tempo que conversamos, você parece ser o tipo ideal de qualquer um.

— Talvez só você pense assim.

— Ah, não seja modesto. Devem haver muitas mulheres ou homens que estejam atrás de vossa Majestade.

— Erion.

— Como?

— Continue me chamando de Erion.

— Oh! Tudo bem. — Sorrio. — Sem formalidades comigo também, pode me chamar de Elliot.

— Tudo bem, Eliot.

Percebo seu intenso olhar sobre mim, mas logo mudo de assunto.

— Sobre o aviso. É possível que tenhamos uma guerra em breve. Nosso mundo está em perigo e não sabemos ao certo quem ou o que está desestabilizando o nosso mundo. E por isso gostaria de perguntar se posso contar com você para enfrentarmos seja lá quem for. E ao mesmo tempo iremos criar a fortificar a relação entre Gaia e Óros.

Erion se levanta e fica frente a Eliot.

— Será um prazer, Eliot.

Sorrio.

Tenho um bom pressentimento sobre isso. Só espero que Matteo não note esse clima...

O Humano - EpífaneWhere stories live. Discover now