— Está mais calmo? — Isabela pergunta e fico envergonhado ao sentir a preocupação em sua voz.
— Estou sim... — começo a falar, mas antes que eu termine de falar Marcos praticamente solta um grito.
— Perfeito, então vamos sair dessa muvuca?
Fico contente por ele tirar o foco da conversa de mim e balanço a cabeça animado. Marcos fica entre mim e Isabela, passando os braços sobre nossos ombros e nos puxando em direção a Q-Store.
Tem outras pessoas caminhando pela loja e um dos atendentes nos diz para irmos olhando enquanto ele atende os outros clientes. Isabela segue em direção ao fundo da loja e nós a seguimos. Ela para ao lado de uma arara com várias camisas coloridas e logo a frente tem um espelho, solto um suspiro frustrado ao parar em frente a ele e ver que alguém acabou derrubando algo em minha camisa.
— O que jogaram em você? — Marcos para ao meu lado, me olhando pelo reflexo no espelho.
Levanto a barra da camiseta e dou uma cheirada.
— Cerveja — digo.
— Toda oportunidade pra encher a cara é uma boa oportunidade — Isabela fala sorrindo. — Tira a camisa e amarra na cintura!
Faço o que ela diz e os dois me encaram.
— Ficou ainda melhor com seus ombros expostos — ela coloca a mão sobre meu ombro direito e eu tenho certeza de que ela vai perceber que eu me arrepiei todo.
Será que não rola um tipo de câimbra corporal quando a pessoa arrepia por muitas vezes seguidas? Se isso for possível, certeza de que isso vai acontecer comigo hoje!
— Vamos explorar a loja ou não? — Marcos fala sorrindo.
Isabela volta a olhar a arara, mas não gosta de nenhuma das camisas.
— Será que não existe outra bandeira pra estampar uma roupa além da bandeira gay? — ela reclama virando de costas para as camisas em diferentes tons de azul e verde.
Marcos e eu nos encaramos e soltamos um riso porque ela literalmente só olhou uma arara e acima dela tem uma placa escrita "Gay-tag", ela revira os olhos, mas acaba rindo também.
De qualquer forma nenhum de nós quer comprar uma camisa, então vamos até o outro lado da loja onde tem uns acessórios e várias outras coisas. No canto há um balde estreito com diferentes bandeiras enroladas em hastes brancas. Marcos tira a bandeira roxa, rosa e azul, a desenrola e me entrega.
— Faz uma pose, vou tirar uma foto — ele fala, tirando o telefone do bolso.
Levanto a bandeira bissexual e dou um sorrisinho, sem mudar minha pose enquanto ele tira fotos de todos os lados possíveis.
Depois eu guardo a bandeira bi e pego a pan para tirar fotos dele, nesse momento Isabela se afasta e quando já terminei as fotos ela reaparece com versões menores nas duas bandeiras e também com uma bandeira amarela com um circulo roxo no meio.
— Moço — ele grita para um vendedor. — Você pode tirar uma foto de nós três?
— Claro — o cara diz, e vem andando sorrindo em nossa direção.
— Só um segundo — digo depois que Isabela entrega o telefone para o cara porque eu avistei uma coisa em um quadro com bottons.
A bandeira ace está bem no meio do quadro e eu levo uns três segundos para conseguir tirá-la.
— Prontinho — volto a me posicionar ao lado de Isabela com a bandeira bi esticada em minhas mãos e o botto da bandeira ace presa no cantinho.
O vendedor tira várias fotos — em pé, na horizontal, de perto e de longe — e quando a sessão de fotos finalmente termina, vamos ao caixa pagar nossas compras.
— Qual o nosso próximo destino? — pergunto enquanto uma garota embala nossas compras.
— Eu estava pensando no teto — Marcos diz baixinho.
— O quê? — questiono.
— Você tá falando daquela escada? — fala Isabela no mesmo tom que Marcos.
Fico totalmente perdido enquanto os dois soltam risinhos, se encarando com expressões engraçadas.
Pegamos a sacolas e Marcos faz um sinal com a mão para que eu os siga. Eles seguem pela loja, olhando para os lados como se quisessem ter certeza de que não estamos sendo observados e, apesar de não entender o que está acontecendo, eu fico feliz pela loja estar um pouco mais cheia agora e todos os vendedores estarem ocupados demais para nos verem espreitando pelas araras e estantes.
Paramos no fundo da loja, o ponto mais longe da saída, em frente a uma porta com uma placa escrita "Entrada permitida apenas para funcionários" e Marcos a abre sem nenhum problema. Ele segue na frente e Isabela me puxa enquanto está entrando. Eu estico a braço para não deixar que a porta bata ao se fechar.
— A gente tá invadindo a cozinha dos funcionários? — pergunto, sem entender.
— Sim, mas olha ali — Marcos aponta para o início de uma escada no fundo da copa.
Nos apressamos até a escada e quando subimos vejo que ela segue para fora do prédio da loja, dando para uma outra escada de ferro acima de um beco ao lado da construção. Agora consigo entender como Isabela sabia o que Marcos queria dizer.
Nós subimos até o terraço e corremos até a mureta no fim onde dá início a pequena marquise. Os manifestantes ainda estão seguindo pela rua, com seus gritos de efeito e os balões vermelhos dando um excelente efeito visual. Na verdade é bem bonito ver tudo isso aqui de cima, nem parece que há minutos eu estava perdido naquele mar de pessoas.
— Que visão hein... — falo sorrindo enquanto assisto a manifestação.
De repente percebo Marcos e Isabela se afastando, dando passos para trás. Eu me viro, curioso com o que está acontecendo, e os pego me encarando, com os rostos sorridentes.
— Karl, nós não acreditamos em toda essa coisa de superstição — Isabela fala. — Mas sentimos que foi sim muita sorte conseguirmos fazer esse trabalho com você.
— Nós esperamos por cada momento que vivemos com você, principalmente com esse — Marcos fala.
Meu coração se acelera quando eles dão um passo à frente, voltando a ficar bem perto de mim. A mão de Isabela envolve o meu pescoço e a de Marcos se prende a minha cintura.
Sem que eles precisem me puxar, eu me aproximo ainda mais. Levanto os braços, colocando a mão direita sobre o rosto dela e a esquerda sobre o dele. Fico na ponta dos pés e meus olhos se fecham quase que instantaneamente, e então eu sinto os lábios deles tocando os meus. Minha boca se mexendo quase que instintivamente, beijando os dois com mais desejo do que eu achava possível sentir, com toda vontade que eu nunca senti em beijar ninguém em toda a minha vida.
Um arrepio ainda mais forte corre pelas minhas costas e se espalha por todo o meu corpo e eu levanto as mãos, passando os dedos pelos cabelos dos dois, as texturas diferentes fazendo cócegas em minha pele enquanto sinto cócegas dentro das calças.
Um primeiro beijo com duas pessoas?, penso no meio do beijo, o que me faz sorrir, isso sim que é um beijo especial!
Os dois se afastam de mim e me encaram, também sorrindo.
— O que foi? — Isabela pergunta.
— Nada, é só que... isso foi realmente especial — digo.
De repente um ponto vermelho ao lado chama minha atenção. Me solto deles e me viro, dando de cara com os inúmeros balões vermelhos subindo pelo céu, dando uma visão ainda mais romântica ao dia que começa a entardecer.
Marcos se aproxima colocando o braço sobre meu ombro direito e Isabela me segura pela cintura do outro lado.
— Isso é lindo — digo sorrindo.
— Você é lindo — Isabela sussurra e Marcos balança a cabeça.
— Vocês querem tomar sorvete antes de irmos pegar o ônibus de volta? — ele pergunta, e nós dizemos que sim.
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Todos Querem (Muito) Beijar Karl Marx
Teen FictionApesar de ter o nome de uma pessoa um tanto quanto famosa, Karl sempre se orgulhou por ser um total anônimo para todos os seus colegas. Integrante do Clube de Teatro, ele ama ficar nos bastidores, escrevendo peças e sendo assistente das produções de...