- Então, e o que aconteceu? - disse curiosa, olhando para Bernardo.
- Acho que Rafa quer contar essa parte da história. Inclusive.- ele olhou por cima dos meus ombros. Rafa estava na janela de vidro, nos olhando com uma expressão indecifrável.- Ela já olhou essa janela incontáveis vezes. Deve estar lhe esperando para alguma coisa. - sorri para ela, que ergueu apenas o canto da boca, em um meio sorriso.
- Bom, acho que está na minha hora. - desliguei o gravador e me levantei. Bernardo pegou na minha mão desengonçado.
- Amanhã você volta?
- Se você quiser, é claro que sim.
- Claro que quero estar com você.- ele me olhava sério. - É sempre bom estar na presença de alguém diferente. Aposto que as enfermeiras estão te agradecendo por me manter ocupado.
- E você da trabalho para elas? - ele riu.
- As vezes. Um pouco. - sorri, concordando com a cabeça. - Na verdade, esperar a morte é um pouco chato. Além do mais, não tenho muito o que fazer aqui. Tem dias que é difícil e dolorido, não tem como manter o bom humor. Ainda bem que essa equipe é maravilhosa, não poderia ter escolhido melhor quem cuidaria do meu fim.
- Eu sinto muito por isso. - baixei a cabeça.
- Não, tudo bem. Eu escolhi meu fim, e até que demorou para chegar. Pra ser sincero, agradeço a Deus por esse câncer ter demorado tanto a se espalhar por meu corpo. Sabia que podia acontecer, mas não quis deixar de viver por causa disso. - seu olhar já não pareciam tão triste, como se estivesse escolhido seu trágico fim.
- Imagino que deve ser difícil. Mas entendo. - ele soltou minha mão.- Bom, já vou indo. - ele franziu o lábio, mas concordou com a cabeça.- Amanhã estarei aqui. Até mais. Boa noite.
- Boa noite.- sai do quarto, fechando a porta sem olhar para dentro.
Não queria olhar para dentro daquele quarto e pensar quais foram as atitudes ruins que Bernardo teve no seu passado, que o fez chegar ao ponto de achar que merecia um fim tão trágico, tão triste, tão solitário.
Rafa me esperava sentada em um dos sofás. Queria poder decifrar o que estava pensando, mas seu semblante era neutro. Milhões de perguntas passaram em meus pensamentos, mas ia aguardar o momento adequado para fazê-las.
- Oi.- me aproximei dela, que se levantou do sofá.
- Olá. Cansada do dia de hoje? - tentou forçar um sorriso, mas era perceptível o quanto estava tentando esconder algo.
- Nada.- sorri.- Foi maravilhoso conhecer Bernardo.- Rafa mudou a postura, trocando o peso do corpo de uma perna para outra.
- Imagino que sim. Creio que ele deve estar exausto, até porque nem poderia forçar tanto assim.
- Acho que excedi meu tempo, né? Peço desculpas.
- Nada. Por Bernardo ele ficaria mais algumas horas com você, mas as médicas e enfermeiras me matariam. Ele precisa descansar.
- Tudo bem, eu entendo.
- Vamos para casa? - ela me olhou. Concordei com a cabeça.
No caminho de volta para a chácara, Rafa vez ou outra me olhava. Queria tirar todas as minhas dúvidas, mas ela estava estranha.
Pigarreou, e me olhou fixamente. Sabia que queria dizer algo.
- Gizelly está na chácara, junto com Manu. - concordei com a cabeça.- Ainda não a convenci de te con... conversar com você. Não sei como vai ser, não tem como prever a Titchela.

VOCÊ ESTÁ LENDO
7 chaves 🗝 - Girafa
FanfictionA famosa Rafa Kalimann, decide, aos 73 anos, expor e falar tudo o que aconteceu na sua vida pessoal e profissional, então contata Paola Kaul, que trabalha na revista Queen, para se abrir e revelar tudo. Rafa fala sobre sua vida desde que se mudou pa...