09_ É original.

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O tom de Daniel parecia ser por pura educação, mas eu ainda fiquei parada feito uma boba. Eu nunca soube reagir bem a um elogio.

Tirei minhas mãos que seguravam meu cabelo atrás das orelhas e resolvi acreditar nele. Entrei na sala na qual agora eu já conhecia e vi os mesmos rostos de ontem. Novamente haviam uns garotos ali perto da porta e também umas meninas sentadas na mesa do professor.

ㅡ Fala Pikachu. ㅡ O rapaz que senta perto da porta sorriu para mim.

Eu realmente não sabia se eles queriam zombar de mim com aquele apelido, mas eu gostava do Pikachu, então eu não me incomodava.

Sorri para ele, afinal, pelo menos eu não estava sendo ignorada como ontem, e fui em direção à minha carteira perto da janela.

O sinal tocou assim que coloquei a mochila sobre a mesa e eu respirei aliviada por ter conseguido chegar.

ㅡ O que fez com seu cabelo? ㅡ Uma das garotas que sentavam na fileira ao lado perguntou olhando para mim.

Parei de sorrir novamente me preocupando e imaginando em como ele estava.

As duas me encararam esperando uma resposta.

ㅡ Nada. Só secou enquanto eu corria. ㅡ Respondi e elas voltaram a conversar baixo depois de fazerem uma careta.

Juntei minhas mãos em meu colo sentindo minha insegurança. E eu detestava sentir isso. Meus pensamentos positivos geralmente ajudam nisso, mas nem sempre eu consigo controlar o que sinto.

Abaixei a cabeça sentindo-me envergonhada e sem pensar muito eu tirei a xuxinha que estava em meu braço e curvei minha cabeça para frente. Joguei meu cabelo que estava meio ondulado - pois ele ficava assim quando secava sozinho - e o prendi num rabo de cavalo.

Suspirei encarando minha mochila e aguardei até que o professor aparecesse.

[...]

As aulas se passaram naquele dia e eu me sentia mal por não ter conversado com ninguém.

Nas primeiras aulas eu foquei na matéria, apesar de estar com fome. No intervalo eu não sai da sala porque não me senti muito bem. Não ter almoçado me deixou fraca.

Acabei comendo na sala mesmo. Para minha sorte, eu havia levado algo na mochila com medo de passar mal nas aulas. Lanchei sozinha na sala enquanto imaginava por quanto tempo isso duraria. Eu odiava não ter amigos, não ter com quem conversar ou falar sobre músicas ou filmes novos.

Daniel foi o único que falou comigo. Ele veio me perguntar se eu estava me sentindo bem antes de ir para o intervalo, mas eu acabei mentindo. Se dissesse que estava passando mal eu seria obrigada a ir para casa e perderia as últimas aulas. E eu já havia perdido semanas de aulas.

Ele pareceu preocupado comigo, mas eu pedi que não se preocupasse e fosse para o intervalo. Ele era gentil.

Agora as aulas haviam terminado. O céu lá fora já era escuro e o último sinal havia tocado. Todos saíram apressados depois de arrumarem suas coisas enquanto eu bebia um pouco de água. Eu costumava levar uma garrafa de água também, mas tinha esquecido dela ontem.

ㅡ Arg... ㅡ Resmunguei passando a mão na nuca. Eu já tinha melhorado um pouco, mas só me sentiria bem mesmo depois de comer um prato de comida de verdade. ㅡ Nunca mais saio sem almoçar. ㅡ Falei para mim mesma e voltei beber a água.

ㅡ Então é isso? ㅡ Engasguei quando ouvi Daniel atrás de mim. Juro, eu devo ter tossido umas vinte vezes. Meus olhos chegaram a encher de água. ㅡ Meu Deus... ㅡ Daniel, que havia se sentado na mesa ao lado, se levantou e tocou meu ombro olhando para mim assustado. ㅡ Você está bem?

ㅡ Eu... ㅡ Tossi de novo com a mão fechada na frente da boca e com a outra aberta. ㅡ Est... ㅡ Tossi novamente.

ㅡ Elizah? ㅡ Daniel pegou na minha mão que estava aberta e continuou olhando para mim enquanto segurava meu ombro.

Consegui parar de tossir e minha respiração voltou ao normal. Uma lagrima escorreu de um de meus olhos e eu encarei Daniel que olhava para mim de olhos arregalados.

Não era hora e nem situação, mas eu comecei a rir de mim mesma e de mais uma vergonha que passei na frente dele.

Tampei minha boca com as duas mãos enquanto ria e Daniel me olhou confuso, mas logo o mesmo começou a rir também.

ㅡ Desculpa. ㅡ Falei quando consegui parar de rir. ㅡ Você me assustou. Estava pensando no que ia comer quando chegasse em casa.

ㅡ Ah. ㅡ Ele riu sentando-se na cadeira ao lado. ㅡ Eu faço isso todo dia. Tem vezes que estou na aula de biologia, mas minha cabeça está no pudim que a minha mãe faz.

ㅡ Entendo bem. ㅡ Assenti rindo e comecei a guardar o meu material. ㅡ Mas, você ia me dizer algo antes de eu quase morrer afogada com uma garrafa d'água?

ㅡ É. ㅡ Daniel assentiu. ㅡ Você não almoçou? Por isso passou mal?

ㅡ Eu não passei ma... ㅡ Parei de falar quando vi que ele não acreditaria nessa mentira. ㅡ Foi só um mal estar.

ㅡ Você já teve isso outras vezes?

ㅡ Não se preocupe comigo, Daniel. ㅡ Coloquei a mochila nas costas e me levantei da cadeira. ㅡ Foi só porque eu não almocei. Não é nada demais.

ㅡ De qualquer forma eu vou te acompanhar até em casa hoje. ㅡ Ele se levantou também e eu arregalei meus olhos.

ㅡ O que?

ㅡ Você pode passar mal pelo caminho. Além disso, é o mesmo caminho. ㅡ Ele sorriu segurando as alças de sua mochila preta. ㅡ Vamos?

Assenti e fui em sua frente quando ele estendeu a mão para que eu passasse. Eu estava feliz por ter um amigo, pelo menos colegas. Mas me sentia tímida. Daniel era um imã de vergonhas para mim.

Nós dois saímos da sala e seguimos pelo corredor em silêncio. Dessemos as escadas do Colégio e logo passamos pelo portão.

ㅡ Tchau, Zezinho. ㅡ Nós dois falamos juntos.

ㅡ Até amanhã, pessoal. ㅡ Zezinho respondeu e nós dois seguimos pela calçada.

Um silêncio pairava enquanto nós dois caminhavamos lado a lado na calçada. As ruas movimentadas por carros, as pessoas que passavam, os comércios que funcionavam, tudo aquilo parecia tão silencioso.

ㅡ O que está achando do Colégio? ㅡ Daniel resolveu quebrar o silêncio e eu o olhei.

ㅡ Ah... muitas coisas. O Colégio é bem grande, os professores são gentis e explicam bem, menos a de espanhol, eu não entendi nada do que ela disse.

ㅡ Ninguém entende. ㅡ Daniel gargalhou.

ㅡ A diretora é bem legal, Zezinho também e é a primeira vez que uso uniforme de saia. ㅡ Olhei para minha saia. ㅡ Até que é legal. Ela é mais fresca do que as calças de moletom que eu era obrigada a usar na minha antiga escola e também são fofas. ㅡ Sorri e olhei para ele. Ele também estava sorrindo para mim. ㅡ E os alunos... bem... ㅡ Abaixei o olhar.

ㅡ É, eles são complicados.

ㅡ Acho que não gostaram muito de mim.

ㅡ Não acho que seja isso.

ㅡ O que seria? As garotas me olham de cara feia, os garotos ou me ignoram ou riem de mim. Ninguém quis falar comigo de uma maneira amigavel, a não ser você. ㅡ Encarei Daniel. ㅡ Eu tento pensar positivo e pensar pelo lado deles, mas não consigo pensar em outra opção a não ser eles não gostarem de mim. Eu fiz algo de errado?

ㅡ Não. ㅡ Ele balançou a cabeça. ㅡ Não liga para isso. Vão mudar depois que te conhecerem. Eles não reagem bem ao diferente.

ㅡ Diferente? ㅡ Fiz uma careta.

ㅡ É. Seu estilo e seu jeito é diferente. ㅡ Ele respondeu.

ㅡ E isso é ruim?

ㅡ Não. ㅡ Daniel riu. ㅡ É original. ㅡ Ele falou com um sorriso atencioso que me fez sorrir olhando para o chão.

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Continua...

Amarelo, a nova cor do Amor - DEGUSTAÇÃOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora