Capítulo 17

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Capítulo 17

Pandemia

Huma

Não pensei que minha pergunta fosse mexer tanto com ele. De um instante para outro, percebi a pessoa em minha frente mudar completamente, sua postura, expressão no olhar, a inquietude com as mãos, tudo mudou. O corpo fala mais que muitas palavras e essa linguagem corporal disse tudo.

— Desculpe-me. Não precisa falar nada. Não imaginei que fosse algo tão incômodo para você.

Ele não respondeu de imediato. Encostou a cabeça no sofá, pressionou o maxilar e apertou os olhos com os dedos. Foi como se ele tivesse voltado no tempo e via a sua frente algo que há muito não era lembrado.

— Eu saí da Coreia há muitos anos. Ficou insuportável a convivência familiar quando decidi que não era para mim a vida de executivo. Queria viver da minha arte. Tocar, cantar e ter uma vida diferente. — Ele voltou seu olhar para mim e sorriu. Sabe aquela expressão de sorrir sem a menor vontade? Falso. Com dor? Foi isso que percebi. — Sabe o que significa arte numa família coreana de executivos? Homem principalmente? Vagabundagem. Querer vida fácil.

— Sei disto. Há uma hierarquia familiar muito forte. Eles criam os filhos homens para substituir o pai nos negócios.

— E quando este filho não aceita a regra é excluído. E foi dessa forma que, assim que concluí o ensino médio fui "mandando" — Fez aspas — para os Estados Unidos estudar administração se quisesse voltar a fazer parte novamente. Porque continuar a tocar em Seul ou qualquer cidade próxima ou longe, não era mais opção. Após dois anos morando lá acabei vindo morar no Brasil.

— E nunca mais teve contato com a família?

— Não diretamente. Para uma mãe que deseja continuar ao lado do marido é sempre uma barreira a enfrentar. Eu não tenho mágoa dela e nem da minha irmã. O complicado foram elas entenderem isso. Melhorou agora nos últimos três anos que o grupo estourou de vez e virou sucesso.

— Então quer dizer que o astro coreano já teve uma vida difícil?

— Para você ver. — Olhou-me encabulado.

— Segundo irmão?

— Não. Tenho uma irmã. Que casou com quem meu pai ordenou. Quer dizer, quem seria um "bom" sucessor.

— E ela aceitou assim?

— O que ela iria fazer? Viu o irmão ser escorraçado de casa com a roupa do corpo. — Sorriu novamente, mas agora com o brilho no olhar que simbolizava lembrança boa. — Ela me ajudou muito, para começar deu-me todo dinheiro que possuía e mais alguns que minha mãe mandava. Isso me ajudou por um tempo até o senhor... meu pai descobrir. Cantei e toquei em bares na noite, nas praças e em eventos.

— Como surgiu a banda, desculpe, grupo musical? — Ele me olhou e sorriu.

— Entre 2008 a 2010 surgiram várias propostas de abrirem filiais fora da Coreia, inclusive Brasil. Muitas famílias vieram inteiras de forma permanente e outras para passar um período. Você sabe disto. — Afirmei com a cabeça enquanto ele se serviu de um pouco mais de vinho. — Encontrei os rapazes fazendo barulho com seus instrumentos anos mais tarde.

— Eles são bem jovens, como conciliam estudos e essa vida de show?

— Como assim? Fazer faculdade?

Um Coreano Caiu na Minha Vida. Completo.Onde histórias criam vida. Descubra agora