Epílogo

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  O vento frio do eterno Outono soprava em Lucien, fazendo seu cabelo comprido bater no rosto. Sentado em um banco junto ao Círculo Íntimo no quintal daquela que costumava ser sua casa - pela Mãe, 224 anos atrás - ele experimentou olhar para o chão coberto por folhas alaranjadas e marrons, então para o céu de fim de tarde pintado de rosa, então para a floresta avermelhada ao redor. Por fim, seu corpo o desobedeceu e ele se viu fitando o caixão aberto na frente.

  De onde estava, no fundo dos bancos organizados para o velório, não dava para ver quem estava lá dentro; nem sentir o cheiro - agora provavelmente apodrecido, já que a morte ocorrera há dias - por causa de feitiços. Não cairia bem o Grão-Senhor da Corte Outonal ser velado fedendo. Bem, o antigo Grão-Senhor. O novo estava sentado na primeira fileira, sem nenhuma expressão no rosto branco, embora Lucien conhecesse Eris o bastante para saber que seu irmão mais velho estaria tentando não gargalhar agora.

  Seus outros irmãos - três; Lucien e Tamlin haviam matado os outros dois - estavam logo atrás. Esses não estavam fazendo muito esforço para fingir que se importavam. Ao lado de Eris, ele podia ver apenas o cabelo ruivo da mãe deles. Mas ela devia estar aliviada agora. Todos estavam.

  Lucien se perguntou se ela tramara com Eris para a morte do marido. Se fosse o caso, seria merecido. Quando o irmão o puxara para um canto meses atrás, logo depois de uma reunião com Jurian e Vassa, para lhe contar sobre seus planos para Beron, Lucien não ligara muito. Não havia nada que ele quisesse mais do que ver o pai morto, mas matá-lo parecia ser uma missão impossível e com probabilidades extremamente altas de dar terrivelmente errado. É claro que Eris ainda tinha mais chances do que Lucien, que não podia nem pisar na Corte Outonal, mas ele não achou que fosse mesmo acontecer. Então, um dia... As notícias chegaram.

  Ele estava jantando na casa nova de Feyre depois de uma reunião à trabalho quando as sombras sussurraram para Azriel, que lançara um olhar enviesado a Lucien antes de compartilhar com Rhys e Feyre mentalmente. Os dois olharam um para o outro, então assentiram, e se viraram para o resto do pessoal... Olhando especialmente para ele, que apertava o garfo na mão, como se sentisse antecipadamente. De alguma forma, ele soubera antes que eles falassem.

  Desde então, as pessoas pareciam ficar observando-o toda hora, como se esperassem algum tipo de reação. Ninguém do Círculo Íntimo, certamente, lhe oferecera as condolências; ninguém além de sua parceira, sempre distante porém gentil demais para deixar passar em silêncio, que murmurara "meus pêsames" naquela noite à mesa. Meio atônito, ele não conseguira responder por dez segundos antes de retomar a postura e responder um rouco "obrigado". Elain não sabia sua história, não se importava, e era melhor que continuasse assim.

  Engraçado, que todos em Prynthian soubessem menos ela. De todo modo, não fazia diferença. Agora ali estava ele, no velório do macho que assassinara Jesminda.

  Depois que a sacerdotisa falou algumas palavras inúteis que continham adjetivos do tipo "bom marido, pai e Grão-Senhor" e "sua honra e coragem não serão esquecidas" - Lucien teve de fazer um esforço gigantesco para não revirar os olhos - chegou a hora da última despedida familiar.

  Primeiro, a mãe dele. Resilla se aproximou do caixão, encolhida, e, pelas bordas do caldeirão, Lucien não conseguiu imaginar que tipo de expressão ela teria no rosto de jeito nenhum. Tristeza, vazio, ressentimento? Ele não fazia ideia. Por pior que Beron a tratasse, ela nunca tentou ir embora, e nunca contou o porquê.

  Não que houvessem muitas oportunidades para isso. A última vez que ele tivera uma conversa de verdade com a mãe fora em Sob a Montanha. Sua garganta apertou um pouco. Lucien sempre pensara que não sairia vivo de lá, mas o fato de ela ver tudo que Amarantha infligira a ele - pior, ver seus irmãos se divertindo com isso - devia ter quebrado seu coração.

O Conto de Lucien e Jesmindaحيث تعيش القصص. اكتشف الآن