Capítulo XLVI - Traição

173 21 26
                                    

Gostaria de alertar-lhes, antes de tudo, que o capítulo a seguir possui cenas de fortes de violencia. Se for sensível ao tema e de alguma forma lhe servir de gatilho, por favor, não continue.
Aos demais, boa leitura :*


Sinto uma gota de suor descer fria em meu rosto, enquanto o aperto de Fernán em meu pulso se torna doloroso.

Retiro de sua mão a caneta de material transparente, junto a folha A4 estendida para mim, e enquanto encaro o ofício em branco, sinto náuseas trazerem um gosto amargo a minha boca.

— Eu... Eu preciso de um minuto! — Digo-lhe que se afasta reflexivamente, dando-me espaço para correr dali.

Eu odeio ter um sistema digestivo tão emocional!

Consigo alcançar o banheiro a tempo, fechando a porta atrás de mim. Agacho ao lado do vaso e... Droga! Meu estômago sempre sensível decidiu travar, justo agora!

Pior que vomitar, é ele não subir nem descer, persistindo a sensação de enjoo e ânsia.

Levanto-me usando a pia como apoio. Jogo um pouco de água fria em meu rosto para que isso ajude a aliviar as náuseas, sem muito sucesso.

Puxo o ar e o solto lentamente tentando me acalmar. Meus lábios também estão extremamente ressecados e o banheiro parece pequeno demais para respirar com facilidade.

Do lado de fora, ouço os passos impacientes rodeando a porta.

Por que tenho a sensação de ser uma presa prestes a ser capturada?

Mais alguns ruídos indecifráveis se fazem à distância, seguido de um silêncio absoluto.

Considero se seria possível voltar a atrás e consto que não... Férnan está obstinado demais, e ter se arriscado tanto a troco de nada, provavelmente me custaria caro.

— Vamos, sua covarde! Você foi já longe demais para desistir agora! Pelo Bruno! — Falo para meu reflexo, tentando me encorajar, enquanto bato repetidas vezes contra o mármore amendoado da pia.

Eu não posso continuar perdendo tempo! Quantos minutos passei aqui dentro? Dez? Eu preciso agir!

Com pressa, tomo em minha mão o papel já amassado, e decido por anotar um número aleatório. Não tenho outra saída.

Eu espero conseguir evitar que ele tire a prova até alcançarmos o Bruno. Depois disso, serei obrigada a entrar no jogo sujo, cedendo o que prometi, e que Deus me perdoe por esse pecado, porque sei que Rafi nunca fará.

Começo colocando o DDD +963 da Síria. É o único do exterior que tenho em mente, junto ao +1 dos EUA. Aprendi quando esperava ansiosamente por qualquer sinal de vida ou ligação de Rafi. Chamadas com esses prefixos eram as únicas que não poderiam ser ignoradas em hipótese alguma.

Encerro adicionando mais nove dígitos e o guardo no bolso de meu jeans, puxando o ar com força.

Acabou. Logo, logo tudo isso ficará no passado e eu irei reencontrar meu irmão.

Enxugo uma lágrima que escorre por minha bochecha. Eu não posso demonstrar fragilidade agora.

Entendo que não é culpa minha, ainda assim, é estranha a sensação de, simplesmente, deixar para trás o homem que tanto sonhei encontrar.

Se a vida é uma caixinha de surpresa, a minha veio direto do filme de terror The Jack in the Box, com um palhaço pavoroso dentro.

Olho em volta e então decido por meu último ato louco: deixar um bilhete para Rafi.

Desejo PerigosoWhere stories live. Discover now