Capítulo LXXVI - Recuo

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— Abra a porta, Anália — Tenho um sobressalto com as batidas tão intensas que parece que a porta vai se despedaçar a qualquer momento. Não é mais o pedido desesperado da Olga do outro lado, é a voz gélida, calma ao mesmo tempo que ameaçadora, que conheço bem.

Fecho os olhos tentando ignorar o Rafi, como fiz a mulher anteriormente. Mas não é tão fácil, ela não tinha o mesmo efeito sobre mim.

Engulo meu choro, perdida e sem saber o que fazer. Talvez não era o melhor momento para uma atitude rebelde, mas eu preciso ficar sozinha e a essa altura ele já está enfurecido, não sei se o obedecer agora será a melhor escolha.

— Sei que está me ouvindo! Você planejou isso! Abra! Não estou brincando! — Rosna forçando o trinco. Um arrepio percorre minha espinha, mas apesar do medo, abraço os joelhos contra mim, esperando que a porta seja derrubada a qualquer momento. Ele pode fazer isso se quiser, mas não vou até lá como uma cadelinha obediente fazer o que ele pede. — Anália… eu não quero brigar, apenas conversar. Juro que não vou ser rude, não estou bravo com você. Mentira. Eu estou muito bravo com você, mas não é por isso que estou aqui. — Pausa, e posso ouvir seu suspiro, como se tentasse engolir a raiva. — Não foi legal o que fez. Você nos enganou. Mais uma vez traiu minha confiança e também ludibriou a Olga. Ela está se culpando por ter acreditado em você. Mas não a condeno, você tem poder igual sobre mim.

Não consigo conter um riso anasalado. A situação é tão absurda que chega a ser engraçada.

É sério que quer falar sobre e traição, Rafi? Não parecia tão ruim quando foi você que fingiu interesse para me espionar, ou me seduziu para me levar para a cama por pura vingança.

— Anália, você está envolvida em tudo que deu errado em minha vida, mas ainda quero conversar com você. Por que testa minha tolerância dessa forma? — Continua, e eu reviro os olhos.

E o que ele causou na minha vida?

Volto a jogar o travesseiro sobre minha cabeça que lateja prestes a explodir, como se isso pudesse me transportar para outro mundo e me libertar desta tortura, mas sua voz ainda me perturba ao longe.

— Me desculpe, não é justo eu dizer isso. Na verdade, apesar de nossas diferenças, você trouxe um pouco de prazer para minha vida, quando tudo estava errado. Mesmo sendo parte de uma mentira. Acho que é por isso que ainda me preocupo e não posso ir embora sem que me diga cara a cara que está bem. Só preciso que abra a porta e me deixe ver como está… Pode fazer isso? — Sua voz treme a medida que meu silêncio aumenta.

Por um minuto, ele é capaz de seduzir minha mente e penso na possibilidade dele, realmente, sentir um pouco de preocupação por mim e eu estar sendo cruel em minha atitude, mas ainda que fosse, eu não devo me importar com isso.

— Anália, por favor… — Continua suplicante. Não há mais aspereza em seu tom, apenas um murmuro oscilante. É inusitado demais para Rafi não receber o que quer, a hora que quer. — Eu sei que minha voz é a última coisa que deseja ouvir nesse momento… E que nada que eu diga irá reparar o que eu fiz. Não estou aqui para pedir desculpas — Confessa, não me surpreendendo em nada. Ele é arrogante demais para se desculpar. — Eu só quero saber se está bem e… Hum… Como posso dizer… — Suspira outra vez, enquanto hesita. — Se fui muito agressivo. Eu não estava em meu estado normal… Eu posso te explicar melhor sobre isso, se você quiser me ouvir… Mas, por favor, me diga se passei do ponto, se está com dor… Eu preciso saber. Eu posso te trazer algum remédio, analgésico, o que precisar…

Fecho os olhos com força, desejando poder deletar cada palavra que diz. Eu não quero voltar à noite anterior, me recusava a falar sobre isso. Nosso ato de ontem foi meu pior erro. Sim, meu corpo dói em alguns pontos, mas a ferida que ele causou em minha alma é infinitamente mais profunda, mas ele é totalmente incapaz de compreender.

Desejo PerigosoWhere stories live. Discover now