XXXII. Deushiana

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Precisamos conversar sobre o fato de você saber que tem poderes há anos e ter fingido descobrir sobre eles apenas agora.

O coração de Thalassa acelerou no peito. A coluna travou tão fortemente que ela quase se assemelhou a uma pedra.

— O que quer dizer com isso? — Tentou transparecer calma, mas suas narinas dilataram.

Ela precisava sair dali. Precisava mais do que nunca.

— Quero dizer, criança, que você fingiu até para si mesma ser alguém que nunca foi.

Devia ter um jeito de voltar ao próprio corpo, ela era um ser imortal porra, ela tinha que conseguir. Seu corpo não se mexeu.

— Eu não sei do que... eu quero ir embora!

O ar alegre da mulher caiu por terra no mesmo instante.

— O peixe vai demorar para ficar pronto. Caminhe comigo.

Oke não a deu tempo para recusar, se levantando e lançando os pés descalços pela areia.

Thalassa respirou fundo, mas se levantou.

— Por que estava escondendo isso?

— Eu não estava escondendo nada, Okeaniye. — Ela murmurou, com um olhar afiado.

Não tinha jeito de mudar o que estava por vir.

— Posso ter parecido uma stalker todos esses anos te observando, eu sei. Mas vi muitas coisas, sabe.

— Tipo o que?

— Você sabe quem matou seu pai. Fingiu que não, é claro. É uma mulher linda, Thalassa, e uma atriz muito habilidosa. Ele levou três tiros por, aparentemente, motivo nenhum. E você nunca esqueceu. Como poderia? Remi era a pessoa que você mais admirava no mundo. E você tinha apenas oito anos, era facilmente influenciada.

Thalassa abriu a boca para retrucar, mas se calou. Era o fim, ela já estava morta. Podia apenas ouvir enquanto Oke começava a destrinchar uma verdade esquecida há muito tempo.

E Oke, aquele ser estranho e assustador com aparência de lobo em pele de cordeiro, foi do começo.

— Você quase não veio ao mundo, sabia? — As mãos dela seguravam a barra do vestido enquanto dava passo após o outro ao lado da jovem. — Quando sua mãe entrou no nono mês de gestação você já estava morta dentro da barriga dela. No dia em que nasceu, Nicole estava naquela praia se preparando para admitir a verdade. Mas não deixei que ela o fizesse.

"Estava de passagem quando escutei os pensamentos dela, implorando a deus... a qualquer um que salvasse sua filha. Simpatizei muito com a sua mãe, o que ela já havia passado na vida... tão forte para uma reles humana. Então... como é que o seu deus falso disse? Eu dei o sopro da vida a você e me transformei por um breve momento na enfermeira que ajudou Nicole a dar a luz. Gosto de imaginar que isso me torna um pouco sua mãe."

Elas seguiam em direção às pedras. As rochas despontavam como dentes pequenos e grandes, afiados, prontos para engolir o mundo. A lua, prata e reluzente, já aparecia completamente no céu roxo escuro e lindas auroras boreais verdes cortavam o céu atrás das rochas.

Era um lindo lugar para se morrer.

— Você... como você... por que?

— Porque eu entendia a dor dela, quando percebeu que você não se mexia mais. E isso me deixou um pouco... emotiva. Fui embora logo após sugerir ao seu pai que desse a você o nome Thalassa. Não a vi por muito tempo depois daquilo. Mas provavelmente deveria ter ido procurá-la porque, no fim, descobri que havia mais dos deushiamos em você do que eu imaginava, e como tal, você não podia ter uma criação normal. No entanto, não tinha como prever o que eu encontraria ao ir para Nova York e me deparar com uma Thalassa recém chegada na elite.

Icarus - Entre o Sol e o OceanoOnde histórias criam vida. Descubra agora