Capítulo Oito

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Dois dias se passaram desde o ocorrido no escritório do arquiduque, nessa altura meu pé estava praticamente curado, mas sigo aplicando a pomada para a cicatrização e usando uma faixa ao redor do pé. Ambrose não voltou a me chamar, em lugar disso direcionou-me as instruções para prosseguir com o projeto dentro do meu quarto, todos os dias mandando que sua empregada pessoal, Hanna viesse buscar o que eu havia feito.

Fiquei feliz em finalmente tomar conhecimento do seu nome, ela foi a única que manteve um relacionamento cordial comigo, mesmo que distante. Apesar de ter passado algumas semanas desde que a vira, ela continuava igual as minhas lembranças, com seus cabelos negros amarrados no centro da cabeça e os olhos azuis prateados compenetrados. E mesmo que ela não interaja comigo, eu tenho experiência o suficiente para saber que eu não a desagradava.

— Talvez deva descansar mais, Mabel — Cecília falou enquanto eu me dirigia à porta.

— Bobagem, estou em perfeitas condições — disse batendo o pé no chão para dar ênfase.

— Mesmo assim, não tem porque exagerar — ela falou sentando-se na ponta da minha cama ao lado de Drystan, acariciando-o a cabeça dele enquanto dorme.

— Não se preocupe, não farei nada de mais — disse, e tirei um papelzinho dobrado do meu avental. Cecília apenas ergueu as sobrancelhas em questionamento. — São para a mamãe, a mistura de ervas que o médico da vila passou para deixá-la calma. Preciso pedir que uma nova infusão seja feita, a dela está quase no fim.

Cecília olhou para o papel com o cenho franzido, pensativa.

— Queria mesmo falar com você sobre isso — disse. — Acredito que seja a hora de começarmos a diminuir as dosagens.

— Não entendi — perguntei confusa, instintivamente olhando em direção a porta do anexo de mamãe. — São esses medicamentos que a mantém estável.

— Na verdade eles a mantém dopada — disse delicadamente — Ela dorme o dia e a noite inteira e fica poucas horas acordada, mesmo quando quer.

— Nunca me pareceu que ela quer ficar acordada — respondi.

— Ela quer, só não consegue — Cecília levantou-se e se aproximou — Veja, não estou dizendo para cortarmos a medicação de uma única vez.

— E o que sugere? — perguntei na defensiva, somente o Drystan e eu sabemos as dificuldades que ter a mamãe em alerta trarão — Você viu como ela fica, está alucinando por uma criança que nunca existiu, fica agressiva e imprevisível.

— Entendo os seus receios Mabel, juro que entendo e sei que faz o melhor por sua família, mas possivelmente sua mãe passou por um trauma e a negação da realidade é a única forma que ela encontrou para lidar com isso.

— E mesmo assim você quer trazê-la de volta para essa realidade que ela nega? Como pretende fazer isso?

— Gradualmente, com muito cuidado e respeitando os limites dela. Em primeiro momento não tenho a intenção de negar as fantasias delas, pode ser estranho, mas garanto que será efetivo — ela respondeu seriamente, com firmeza e franqueza no olhar. — E não se preocupe, ela não irá ferir outra pessoa ou a si mesma. Vamos diminuindo a frequência da infusão e aos poucos trazendo-a de volta à realidade.

Olhei para a determinação nos olhos de Cecília e quis acreditar nela, mas eu cansei de esperar mamãe voltar para nós.

— Não fique decepcionada se não conseguir, a última vez que de fato conversei com ela foi no nascimento do Drystan.

Persona - A Maldição de AmbroseOnde histórias criam vida. Descubra agora