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30 de dezembro de 2013

Virgínia Beach, Virgínia – Estados Unidos

O eco ainda enche os ouvidos de George. Começou diante da primeira explosão — e é por causa disso que ele sabe que houve uma muito perto de onde estavam, então acha que tem alguma obrigação em se sentir grato porque, apesar da desestabilização da sua mente, ele e Bev estão muito bem — e não tem parado desde então. Pode culpar toda a claridade do dia, em que, apesar do frio e da previsão para chuva no final da tarde, o sol decidiu aparecer, o que significa que há ainda mais luz. Uma pequena parcela pode ser, sem qualquer dúvida, jogada sobre os ombros de Jack porque, quando Jack começa a tomar mais riscos do que efetivamente é necessário ou quando começa a agir sem considerar que existem riscos, a cabeça de George doí quase que de forma automática. Mesmo que, sob aquelas circunstâncias, ele consiga compreender as motivações e supor, com um alto nível de confiança, que, no lugar de Jack, faria o mesmo, o que fizeram certamente ajudou na cabeça de George — e isso, em um cérebro cujos neurônios já tinham se bagunçado pelo impacto da explosão, parece intensificar cada pequeno desgaste.

É claro que George não pode esquecer e nem deixar de lado o disparo incrivelmente próximo. Fez com que ele se encolhesse por muito mais do que apenas o som em si; fez com que ele se perguntasse se seu ouvido sangraria, fez com que se preocupasse sobre a recuperação quase concluída do canal auditivo e que temesse voltar a surdez, parcial ou total, permanente ou temporária. Qualquer que fosse ela, George não queria ter de volta aquela sensação de isolamento criada quando os sons apenas foram silenciados. Para alguém que sempre ouviu bem, e que sempre conseguiu tirar alguma diversão do que ouvia — da risada dos filhos e da esposa, dos comentários inteligentes de Becca a mesa do jantar, das tentativas de Ben em ser mais sagaz do que ela e de tudo que Tony descobria e queria contar, muitas vezes sem conhecer as palavras a serem usadas — , não há como descrever a dor criada pela simples possibilidade de não ter mais aquilo. O silêncio só era reconfortante quando era uma escolha e não quando é uma imposição. E, mesmo que essa pareça a pior parte, não foi. A pior parte foi que, assim como a explosão, fez com que George se sentisse no deserto, naquelas semanas de julho e agosto, novamente.

E, puta merda, Santo Deus, se tem algo de minimamente bom no mundo, George nunca mais voltaria para aquele lugar, fosse por escolha, trabalho ou recordação.

George sabe de onde veio o tiro salvou sua vida — então, apesar de toda dor de cabeça, obrigado, Jack — e, embora também deva se sentir grato, ele é incapaz de tirar da mente o fato de que, tenham sido por segundos, minutos ou mesmo horas, paralisou. Fazia muito tempo que o impacto não era tão grande para travar seus músculos, desacelerar suas sinapses. É fácil pensar que ele estava enferrujado depois de alguns meses parado em casa, cuidando dos filhos, fazendo fisioterapia, compras no supermercado e sendo só um cara qualquer. É fácil pensar que ele já estava previamente desestabilizado. É fácil pensar que, naquele dia, ele deveria continuar sendo só um cara qualquer, aproveitando a família, e que aquela empreitada com um mínimo de nexo, o tipo de história que apenas Hollywood ou uma mente pouco criativa inventaria, fora uma ideia desesperada de Jack. É fácil pensar que, mesmo já envolvidos, a postura lógica deles deveria ser recuar — foi bem isso que o capitão da SWAT, no que não poderia ser descrito como menos do que, puto-e-ofendido, disse, não foi, George? É fácil pensar em pelo menos mais uma ou duas razões que justifiquem sua paralisia.

Não é fácil, porém, conseguir se convencer de que essas poucas razões são suficientes para atenuar a sensação de covardia que pesa em seus ombros enquanto o sentimento de fraqueza segura-lhe as mãos e puxa para baixo. Não é fácil encontrar algo que baste, especialmente quando ele pensa que, exceto por ter ajudado Bev a sair — e uma parte grande disso foi, na verdade, uma ação dela — ele não foi útil de fato. Para George, naquele dia, ele não passa de um desperdício. Foi como o seu um de seus treinadores chamou todos aqueles que, com todo o necessário em mãos, do preparo a oportunidade de agir, apenas não fizeram. Desperdício. E é claro que, para alguém como George, que está acostumado a ser o exato oposto disso, esse é um tipo de desgosto difícil de descrever.

O silêncio das águasOù les histoires vivent. Découvrez maintenant