Lótus Yunmeng

Vinte e Sete

Aviso: Esse capítulo contém gatilhos de boiolice da autora.

Algumas dores são pesadas demais para serem carregadas, mesmo pelos mais habilidosos. Tudo que eles podem fazer é se arrastar por aí. Outras culpas, são tão pesadas que você precisa descarregar, mas há o momento pra isso. É por isso que Jiang Cheng não conversa com Wei Wuxian agora. Seu irmão veio em seu resgate, perdeu o controle e machucou o adorado Lan Wangji para salvá-lo. Jiang Cheng pode esperar para eles conversarem sobre sua relação. De todas as formas, é o passado. 

Não é que não doa, mas Jiang Cheng já aprendeu a conviver com a dor, ele sabe que algumas coisas geram aprendizado e depois disso, elas devem ser guardadas e douradas com boas memórias. Assim como outras coisas devem ser deixadas para trás e nunca revisitadas, porque é disso que se trata crescer: selecionar as coisas que te são úteis carregar. E é disso que se trata se apaixonar e devotar sua vida para alguém: dar o melhor que pode, respeitar seus limites, assumir seus erros e conversar com essa pessoa abertamente. 

É por isso que assim que os olhos de Lan Wangji tremem, Jiang Cheng para de doar sua escassa energia espiritual e praticamente usa Shuoyue e San Dú como bengalas para caminhar até Lan XiChen. Ele está disposto a assumir seus erros, mesmo que seu marido nunca o perdoe, ele vai tentar continuamente porque ele não quer uma vida que seu marido não está. 

O irônico é que ele se arrastou com Lan XiChen para aquela caçada noturna por obrigação, sentindo que vinte dias seria o máximo da relação entre eles. Uma morte já se passou entre eles e agora ele se arrastaria no meio do fogo para manter Lan XiChen respirando sobre a terra. 

Desde que o exército inimigo recuou, Lan XiChen não encontrou utilidade em ficar deitado. Sua base de cultivo tinha decaído desde que ele voltou do inferno, no entanto ainda conseguia superar em muitos números os seus sêniores. Como aquele animal do seu lado foi muito útil em acalmar sua ansiedade, Lan XiChen o trouxe para o colo e o mimou com carinho entre as orelhas. Ele ergueu os olhos porque conhecia os passos de Jiang Cheng. Mesmo quando seu marido se arrasta, ainda parece que o solo que pisa é seu e o próprio firmamento lhe pertence. 

Talvez, ter se afundado em desespero o tenha feito alucinar. Pois quando Lan XiChen se levanta, trazendo o cachorro enorme nos braços e sentindo pronto para voltar para sua tenda no acampamento, Jiang Cheng se ajoelha para ele, o rosto voltado para o chão enquanto apresenta a espada que ele "roubou" do marido. 

─ Jiang Cheng, o que é isso? ─ Lan XiChen pensou que seu sangue estava correndo ao contrário. Ele não sabe que Jiang Cheng se ajoelhou por ele por mais de vinte e quatro horas, nem como fez o sangue de uma dezena de pessoas escorrer por todos os degraus da torre da carpa. Seu marido é amoroso e doce, mas ainda é essencialmente uma pessoa orgulhosa. ─ Não faça isso, levante. 

─ Este líder da seita Jiang errou com seu marido e implora o perdão. Se o marido não pode perdoar, então este líder vai perseguir pelo resto da vida, importunando-o até que possam conversar. ─ Seu tom era decidido e não vacilou em segundo algum. ─ O tempo que for necessário para o marido, eu estou disposto a aceitar e nunca discordar. Este líder da seita Jiang aceita qualquer punição por traição e roubo, exceto o divórcio. 

Lan XiChen quis rir. Esse seu marido estava sendo sincero e petulante mesmo enquanto se desculpava. 

Ele sentiu que Jiang Cheng era um pouco doce e muito ridículo se estava esperando para ser punido. Lan XiChen foi traído de maneiras piores, já agora ele entendia a natureza de sua inutilidade e se ele fechou os olhos para Jin Guangyao, ele sentia que poderia fechar os olhos para qualquer coisa que Jiang Cheng fizesse. Pois, ao ser colocado em perspectiva, estava sempre muito óbvio que seu marido enfiou os pés pelas mãos na tentativa de o proteger.