2 - Corpo

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Ainda não amanhecera completamente, logo, na ideia de Law, era demasiado cedo para o gosto de muitos - ele inclusive - os que foram acordados àquela hora pelo som de ambulâncias e sirenes, passando na rua a alta velocidade em direção à mata local. O motivo? Era o mesmo pelo qual Trafalgar havia sido obrigado a sair da cama e chamado a trabalho ás seis da madrugada. Um novo caso para resolver.

- Então, o que temos aqui? – Resmungou, parando em frente ao local do crime. Com 26 anos e no auge da sua carreira como investigador criminal, passou de imediato pelas fitas dos policiais que já lá se encontravam e parou em frente ao corpo acabado de encontrar.

- Ah, Law – Eustass – um garoto. Desconhecido, sem identificação. Foi encontrado por dois caminhantes no meio dessa mata. – Kid se ajoelhou perto dele e virou, de leve, a cabeça do mesmo – tem um grande trauma na nuca e cortes profundos nos pulsos.

- Caminhantes? Que espécie de ser vivo se levanta antes do nascer do sol para caminhar? O que é que esta gente tem contra uma boa noite de sono?

- Que bom que você está de bom humor – provocou o ruivo de cabelo espetado. Law, num suspiro pesado, se baixou um pouco mais para analisar o local. Primeiro, olhou para o corpo. A pele pálida e um tanto gelada era inevitável estando ele a lidar com um cadáver, ainda assim, continuava a ser um pormenor ao qual ele nunca se adaptaria principalmente porque quem estava na sua frente naquele momento, entre as ervas secas que brotavam da terra húmida sobre os seus pés, ser alguém tão jovem e com uma vida inteira a não desfrutar. Fazia ele pensar em como tudo era injusto, que de um momento para o outro poderia acabar. Aos seus olhos, uma cena deprimente de se assistir…

- Não tem mais de 20 anos. - Concluiu.

- Encontramos marcas de pneus aqui perto, o Killer está a segui-los. Deixo a análise do resto para você, Law.

O tatuado acenou em confirmação para o colega de trabalho. Desviou o olhar daquele rosto agora eternamente adormecido que lhe parecia estranhamente familiar e passou a analisar melhor o corpo dentro dos possíveis sem contaminar a cena do crime, tirando logo as suas próprias conclusões.

- Sem sapatos, pés machucados, com arranhões e cicatrizes anteriores. Os cortes nos pulsos foram feitos aqui, ainda se notam as marcas da projeção do sangue na área em volta.

- Acha que ele foi mutilado? – Interrompeu o ruivo – pode ter feito isso nele mesmo.

- Duvido, Kid. São cortes firmes, sem hesitação. Se ele fizesse isso a ele mesmo, a dor faria o corte da lâmina sobre a pele ser irregular. Está vendo as folhas do mato quebradas? - Apontou para a trilha. - Este é o meu palpite... As marcas de arrastamento sugerem que o agressor o acertou em algum outro local e acabou largando o corpo aqui. Para se certificar de que acabava o assunto, fez os cortes e provocou uma hemorragia. Provavelmente, homicídio premeditado.

- Perspicaz como sempre - ironizou o colega - bom, você tem tempo para confirmar isso na autópsia.

Law coçou a cabeça, resmungando para si mesmo. Definitivamente, por vezes, detestava aquele trabalho mas como operário em dois departamentos – trabalho de campo e médico legista - não tinha escapatória dele. Enquanto esperava chegar a maca para carregar o corpo, respirou fundo o ar puro da madrugada que trazia consigo o cheiro de chuva anunciando o começo do outono. Optou, enfim, com o vento gelado a bater-lhe no rosto, por analisar um pouco mais o garoto, parando próximo ao pé do mesmo. Ali, dava a entender que havia um certo pedaço de pele com uma cor um tanto diferente do restante daquele ser que havia sido achado naquele sítio tão hostil e longínquo da civilização.

- Isto é… Ei, Kid, chegue aqui! – Kid se aproximou. Enquanto Law massajava os ossos e ligações nervosas na zona do tornozelo, esfriou o olhar ao ter as suas suspeitas confirmadas. "O ser humano é realmente terrível em alguns aspetos", concluiu com desdém. – A pele em volta está cicatrizada e o osso calcificado. Algo estava aqui.

- Algo tipo o quê?

- Ferro, por exemplo. Mas para um dano desta dimensão, ele tinha de estar preso com ele por um longo tempo.

- Quanto tempo?

- Anos. – O ruivo parou um pouco e piscou os olhos confuso, antes de formular a pergunta que agora, passava pela cabeça de todos os policiais presentes que ali prestavam atenção na conversa.

- Acha que ele era prisioneiro de alguém? Tipo... Cativo?

- É o que parece. Isso explicaria o tom de pele, é tão branco quanto papel. Se eu o analisar, quase que aposto em défice acentuado de vitamina D.

Law continuou a analise. Passou pelas suas pernas e tronco quase esqueléticos já adivinhando a causa de todas aquelas cicatrizes e ferimentos e finalmente, voltando ao seu rosto, abriu a boca do mesmo à procura de algum dente partido ou algum outro sinal de maus tratos. A confusão só aumentou ao olhar o seu interior.

- Cabelo? – Indignou o ruivo. - Que tipo assassino obriga a vítima a esconder cabelo na boca?

- Isso é o trabalho do laboratório descobrir. Vou retirar uma amostra, pode nos levar a quem o largou aqui. - Kid levantou a sobrancelha. Algo ali não batia certo. Não se referia apenas aos fios escuros na boca do garoto, mas também a Law que parou um pouco no tempo e ficou quieto de repente. O exterior do corpo estava frio, era um cadáver. Contudo, o tatuado acabara de perceber que a temperatura perto da garganta do menor estava quente. Não só isso, como também alternava um pouco. Ele ainda respirava! – Kid, ligue para o hospital, já!

- Porquê?

- Ele está vivo.

- Como? – Contrariou. – Impossível, eu não senti o pulso-

- O pulso pode estar fraco o suficiente para não sentir, mas ele está a respirar. Pegue o meu celular, ligue para o Bepo! É uma emergência!

- Mas-

- FAÇA O QUE EU DIGO! - Gritou ao levantar-se apressado para se aproximar dos paramédicos. - O GAROTO ESTÁ VIVO! LEVAM-NO PARA O HOSPITAL, JÁ!

QuartinhoWhere stories live. Discover now