Capítulo 12

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Nos Estados Unidos, a noite chegava devagar sem pedir licença. O claro opaco que resplandecia no céu, era substituído pelo vibrante escuro do véu da noite. O sol saia de cena, envergonhado e triste ao mesmo tempo, pois ali perto, a lua aparecia brilhando como quase em todas as noites. As ruas pouco iluminadas. Na casa dos senhores Willians; James Doohan descia os sete degraus da varanda, que davam acesso à rua. Doohan vestia a farda da Marinha, azul como das regiões mais fundas do oceano; sob a cabeça usava um quepe branco, vestia uma calça branca, alinha e pouco folgada; nos pés usava um sapato preto bem brilhante; sob o ombro direito tinha uma pequena mochila que parecia portar algumas peças de roupas.

James colocou seus pés na calçada ainda úmida por causa da chuva que caía de maneira bem fina durante vários dias; não olhou sequer uma vez para trás. A porta da casa ficou aberta, as luzes apagadas; um “silêncio ensurdecedor” envolvia seu interior; o único barulho que quebrava em períodos sistemáticos aquele silêncio era o som de uma goteira que caia dentro de uma panela sobre a mesa da sala.

Na rua, poucos carros passavam, era uma noite fria, chuvosa, e poucos tinham a audácia de permanecerem caminhando. Próximo do marinheiro que caminhava em passos relativamente rápidos, passou um homem que aparentava ser ainda jovem apesar de alguns fios de cabelos grisalhos; fazendo sua corrida noturna, apesar das condições climáticas de New England, o homem vestia shorts na altura dos joelhos, um tênis de caminhada verde, uma camiseta preta e por baixo uma “segunda pele” preta um pouco desbotada. Dooham não deu a mínima para o homem, que passou e acessou com a cabeça enquanto dizia boa noite; mas o marinheiro nem ao menos sorriu, continuou caminhando sob a fina chuva enquanto a noite chegava.

Dooham mesmo sendo irmão de Mary, pouco falava com ela. Desde que a mesma foi para a Inglaterra, nunca mais se falaram; ele por sua vez, devido estar a serviço da marinha nem se importava tanto em manter contato com sua família. Antes de seguir a carreira como marinheiro, Dooham tinha uma convivência um tanto quanto conturbada com Mary; sempre brigava com seus pais por achar que ela era a preferida deles.

A chuva fina começava a parar de cair e James continuava como antes, caminhando alternando passadas longas com curtas; sempre ereto e nunca esboçava um sorriso. Andou por alguns minutos e dobrou na primeira esquina a esquerda de sua casa. Após dar mais alguns passos, colocou a mochila na calçada molhada; retirou o quepe, passou a manga de sua farda nele e o ajeitou novamente sobre a cabeça. Colocou as mãos nos bolsos da calça e começou a bater o pé direito como quem seguia o ritmo frenético de uma música ou como quem esperava alguém que insistia em sempre se atrasar.

– Senhor Dooham? – Disse um homem parando um táxi em sua frente.

– Sim!

– Desculpe a demora, tive um imprevisto.

– Tudo bem, o importante é que o senhor veio. Podemos ir?

– Sim, claro senhor, pode entrar. – Respondeu o motorista destravando a porta do lado de dentro.

James entrou no táxi, sentou-se no banco da frente e jogou sua mochila um pouco molhada sobre o banco, deixando-a no banco traseiro do carro.

– Qual o preço da viagem? – Indagou enquanto tirava seu quepe branco e o colocava sobre as pernas.

– Nada, nada não senhor. Militares não pagam nada em meu táxi senhor. – Respondeu o motorista enquanto tentava ligar o carro com a mão tremula devido o nervosismo de ter um militar em seu carro.

– Ótimo! Chamo-me James, James Dooham; Capitão da Marinha Norte-Americana. Prazer.

– O prazer é todo meu capitão. Erick, prazer.

– Erick, temos que ser rápidos, tenho um vôo marcado.

– Claro senhor, serei o mais rápido possível! Desculpe o atrevimento de minha parte, lógico que não tenho condições para afrontar um oficial de tal maneira, mas poderia eu saber para onde vai que necessitas de tanta pressa?

– Senhor Erick, como o senhor mesmo adiantou, não tens condições para afrontar um oficial, ainda mais se esse oficial for James Dooham! Porém para não lhe deixar sem uma resposta satisfatória, estou indo para outro continente resolver problemas pessoais. – Respondeu o oficial balançando a cabeça negativamente.

– Pessoais... ? – Indagou o motorista mostrando estar curioso para saber quais problemas seriam estes.

– Senhor, tenha mais respeito, por favor! Posso lhe dar voz de prisão! – Respondeu James nervoso. – Saiba que estou indo resolver problemas sérios que não dizem respeito a nenhuma pessoa e nesse grupo o senhor esta incluso, sinta-se honrado!

O motorista nada falou; encolheu-se no banco e continuou a dirigir pegando firme no volante.

­– Agora se não for incomodo, peço que dirija o mais rápido possível, pois estou indo estudar a geologia dos campos-santos!

James Dooham mal poderia imaginar que aquele motorista foi o mesmo que levou sua irmã para o mesmo aeroporto que estava indo naquele momento.

A Outra Face do MedoWhere stories live. Discover now