In the arms of the Sea

A tempestade destruiu meu barco

                              Sally
"Sigo acompanhando o crescimento de Percy. Ele mal tem sete meses e já fala, ou pelo menos tenta, com qualquer criatura que viva na água. Eu tinha um aquário ao lado da televisão. Percy simplesmente tirou o peixe do aquário e ficou levitando ele, dentro de uma bolha. Possie deu tanta risada! Nunca achei que meu filho levaria bolhas cheias de água e peixes por aí. Mas fazer o que, "filho de peixe, peixinho é."
Conversei com Possie com calma hoje. Está cada vez mais difícil vivermos em Montauk. As obrigações do mar o perseguem, e a fúria dos outros deuses também. Ele precisa voltar para o mar, mas não quer nos deixar. Creio que a luta interna na cabeça dele é bem mais complicada do que a minha. Ele já cogitou a ideia de nos levar para Atlanta, no seu Palácio submarino, Porém creio que sua esposa e seus outros filhos não aprovariam nossa estadia. Sou mortal e não consigo respirar embaixo d'água, mas creio que isso não será um problema para Percy.
Enfim… estava eu colocando Percy pra dormir quando escuto a porta abrir. Suponho que seja Possie, afinal ele saiu de manhã. Vou até a cozinha, mas encontro um Poseidon totalmente diferente do que eu conheço. Ele está irritado, e grita com alguém.
"Eu já disse que NÃO, irmão."
"Poseidon, o mundo está desequilibrado agora. Parece que você esqueceu do risco enorme da existência dessa criança, da profecia que pode nos destruir."
"Sobre seus filhos ninguém fala nada, mas agora que estou feliz com a mulher que eu amo e meu filho pequeno, vocês ressuscitaram esse velho fantasma. Não vou me separar de Sally e muito menos do bebê!"
Ouço raios descendo do céu e atingindo as palmeiras, e o mar quebrando violentamente contra a praia. Estou assustada demais para me lembrar quem é a pessoa que está na porta. Um relâmpago me tira do transe. O próprio rei do Olimpo veio até minha casa, Zeus.
"Não há absolutamente nada que você possa fazer, irmão. Eu sou o rei, e vou puni-lo se achar necessário. Você precisa imediatamente voltar aos seus domínios."
"Faça o que quiser comigo, não o temo, grande Zeus."
"Chega! Quanta insolência da sua parte, eu sou o senhor dos céus e o mínimo que mereço é respeito!"
"Não me venha falar de respeito irmãozinho. Todos nós sabemos que se o senhorzinho humilde não tivesse trapaceado, você não passaria do irmão mais novo de Hades e Poseidon!"
Um raio corta o céu com tanta força que Percy começa a chorar. Quando o barulho se espalha pela casa, noto que os dois param por um instante.
"É o seu filho?"
"Não que isso seja da sua conta, mas sim, é meu filho".
"Deixe-me vê-lo."
"Se você colocar o pé pra dentro dessa casa, eu juro pelo Rio Estige que não serei piedoso. Você terá muitas oportunidades para conhecê-lo, mas ele é apenas uma criança."
"Teimoso como sempre. Não vou insistir. Mas duvido que queira sair daqui da mesma forma que nosso irmão mais velho saiu da Itália, não é mesmo?"
"Aquele foi o seu maior ato de covardia, e isso não vai se repetir."
Sinto que as coisas vão piorar.  Me apresso para ir até Possie. Toco em seu braço. Antes que ele pudesse reagir, eu começo a falar.
"Oh grande Zeus, não fazia idéia de que a nossa permanência ao lado de Poseidon fosse causar tantos problemas. Me perdoe. Se eu puder contribuir de alguma forma para amenizar a situação, é só me dizer, agora mesmo."
"Garota esperta. Pode sim, Sally. É Sally, não é? Enfim. Eu e mais alguns deuses desejamos que você e a criança saiam imediatamente daqui, e fiquem o mais longe de Poseidon o possível. Assim ele não terá distrações e poderá realizar seu trabalho perfeitamente."
Sinto as lágrimas descerem pelo meu rosto. Isso doeu bem mais do que imaginei. Mas não sou só eu que choro. Possie também luta contra as lágrimas, um misto de raiva, ódio e dor.
"Por favor, irmão. Eu faço tudo o que vocês pedirem, mas por favor, não me separe deles. Eu imploro! Dionísio levou Ariadne para o Olimpo a tantos anos, posso levá-los para meus domínios!"
"Não esqueça que o mar já possui uma rainha. E por mais que ela seja indiferente em relação a esses seus casos de verão, creio que ela se sente ofendida ao ver que está sendo trocada por uma mortal. Não tem discussão."
Eu respiro fundo. Dou um passo à frente, e digo com voz trêmula.
"Aceito seus termos. Percy e eu partimos pela manhã. Mas nos dê alguns minutos para nos despedirmos. Isso é tudo que eu lhe peço.'
"Isso eu lhe posso conceder. Irmão, esteja lá fora em dez minutos. Sabe que Hera é impaciente."
Zeus saiu porta afora e nos deixou sozinhos.
O silêncio era ensurdecedor, mas ele finalmente foi quebrado com uma pergunta.
"Sally, você me ama?"
Com lágrimas nos olhos, respondo: "é claro que sim meu bem, é claro que sim. Mas infelizmente não podemos ficar juntos."
"Me perdoe meu amor, você sabe o quanto dói pra mim fazer isso".
Ele cai de joelhos no chão e me abraça, e entre os soluços, me pede perdão. Eu não consigo entender o porquê um deus poderoso se ajoelha diante de mim e deseja que eu o perdoe. É quase inacreditável.
Me ajoelho ao seu lado, beijo seu rosto molhado, e sussurro no seu ouvido:
"Eu te amo, e é por isso que eu perdoo você. Você não tem culpa de tudo isso, e se tem não é só sua, mas é minha também. Prometa pra mim que não vai me esquecer, e isso já é o suficiente. Eu amo você Possie, você sabe disso."
As lágrimas dele só aumentam cada vez mais, até que ele tenta se recompor e me faz um pedido.
"Posso me despedir de Percy?"
"É claro meu bem"
Vejo ele se levantando, como se cada movimento cravasse uma navalha no seu coração. Ele atravessou o cômodo, e abriu uma porta azul. Dentro do quarto, ele caminha até o berço e pega Percy nos braços, que não entende nada, e não sabe se verá o pai de novo. Eles se olham, e naquele dia, ouvi as palavras mais tristes da minha vida:
"Meu filho, você sabe que o papai não quer nada disso, muito menos deixar você e a mamãe. Mas eu preciso." Ele tentou se conter, mas as lágrimas continuaram. "Com ou sem mim, você se tornará o melhor herói que o mundo já viu, e não importa quantas lágrimas eu vá derramar por me lembrar dos momentos felizes que passei com vocês, eu sei que verei vocês de novo. Você vai salvar o Olimpo, e ser a alegria da vida da sua mãe. Perseus Jackson, filho de Poseidon. Você pode me esquecer um dia, mas eu jamais esquecerei você, assim como sua mãe. Te amo filho."
Ele o beijou na testa e colocou Percy no berço. Quando saiu do quarto, nós nos abraçamos, e choramos. Não tinha o que dizer. Ele me beijou, mas diferente daqueles beijos suaves e quentes como a brisa do verão, esse era mais desesperado, como se fosse a última vez que nossos lábios se encontrariam. E realmente foi…
Ele sussurrou uma última vez no meu ouvido: "Te amo Sally." E naquele momento um raio cortou o céu. Nosso tempo tinha se esgotado. Ele se virou e saiu porta afora, e partiu com Zeus, mas não sem antes virar e mandar um beijo ao vento, esperando que caísse em meus lábios. Ele se foi.
Fecho a porta e desabo. Meu amor se foi, e agora eu e Percy estamos sozinhos. Pelos deuses. O que eu fiz de errado? Acho que não devia ter voltado para a praia no dia seguinte, quando aquele pescador  bronzeado piscou para mim."