- Sim, estou com sono. Boa noite gente! - Falei e fui para meu quarto. Na verdade, não estava com tanto sono assim. Minha energia social havia acabado e essa foi uma das únicas desculpas que eu achei para sair. Sendo sincera, eu me sinto até um pouco mal quando isso acontece.
Me joguei na cama e fiquei um tempo olhando para o teto. Minha mente ficou alternando entre pensamentos aleatórios, até que chegou no cafuné que estava recebendo de Miran. Dei um sorrisinho bobo e abracei uma almofada, adorava quando ela fazia carinho em meus cabelos. Pensei também que se a minha mãe me visse à toa assim, eu iria receber 10 tipos de sermões diferentes.
Bufei, me levantando para pegar meu cadernos. Não estava nem um pouco a fim de estudar agora, mas minha mente insistia que eu não tenho escolha sobre isso. Odeio me sentir sob pressão. Resolvi pegar o livro de Aritmética desse ano para me adiantar. Lendo assim por cima não era tão difícil, só pesquisei algumas coisas que não havia entendido direito e fiz várias anotações e resumos. Quando olhei o relógio, já haviam passado duas horas de quando comecei.
Joguei meu caderno pro lado e deitei na cama novamente, me sentindo esgotada mentalmente. A única coisa que eu desejava agora era ficar fazendo vários nadas por horas. Me permiti pegar meu celular, haviam algumas mensagens de MB perguntando como eu estava. Às vezes parece que ela lê a minha mente, sabe?! Estava pensando em uma resposta para as mensagens da garota quando eu recebo uma chamada de voz da minha mãe. Senti meu estômago revirar e respirei fundo antes de atender.
- Boa noite, mãe! - Disse assim que atendi a ligação.
- Boa noite, filha! Como você está? Quantas horas teve de estudo e revisão hoje? Aliás, por quê está acordada tão tarde? - Ela falou de um jeito meigo, totalmente artificial.
- Estou bem sim, e a senhora? Eu acabei agora de estudar, na verdade... Foram 2 horas no total. - Hesitei um pouco antes de falar a última frase.
- 2 horas?? Só terminou agora?? E o Intervalo? E após as aulas? Milly, eu paguei para te colocar nessa escola, você sabe disso, não?! O que custa se esforçar pelo menos um pouco? - Seu tom de voz mudou totalmente. Conseguia ouvir raiva, frustração e decepção em suas palavras. Tudo de uma vez só. Engoli em seco, numa tentativa de não chorar.
- Me desculpe, eu não tive muito tempo. - Falei com dificuldade, sentindo um nó crescendo em minha garganta.
- E ainda inventa mentiras! Você teve o dia todo, Milly Maddats. - Minha mãe respirou fundo e continuou - Bem, faça o que quiser. Só depois não venha chorando para mim porque ficou com sua nota abaixo da média.
- Não irá se repetir. - Foi tudo que eu consegui dizer. Minha voz tremia um pouco e lágrimas começavam a inundar meus olhos.
- Assim espero. Boa noite. - Ela desligou.
Foi uma ligação rápida, mas foi o suficiente para me fazer chorar por um bom tempo. Eu odiava me sentir assim. E odiava ainda mais que a minha mãe fizesse eu me sentir assim. Em algum momento da noite, bateram na porta do meu quarto. Eu já estava me preparando para enxugar minhas lágrimas e arrumar toda aquela bagunça quando ouvi uma voz bem familiar vindo do lado de fora.
- Milly.. Sou eu, Miran! Você não respondeu minhas mensagens e eu fiquei preocupada. E eu sei que você não está dormindo. Posso entrar..?
Soltei um ar que nem sabia que estava segurando quando ouvi a voz da garota. Me senti bem mais tranquila só de ouvi-la. Não me dei o trabalho de enxugar minhas lágrimas ou arrumar tudo, Miran me conhecia o tempo suficiente para saber o que estava acontecendo, e tudo bem.
- Oi.. A porta tá aberta, entra.
Falei com uma voz meio chorosa, me sentando na cama. O tom saiu mais dengoso do que eu esperava e me xinguei mentalmente por isso. Miran entrou poucos segundos depois que minha voz ecoou pelo quarto, fechando a porta atrás de si e andando em minha direção, já abrindo os braços para me dar um abraço, visto a minha situação.
- Oh, Mi.. O que aconteceu, amorzinho? Como você tá?
Ela disse, finalmente me alcançando e me envolvendo em um abraço apertado. Automaticamente abri um sorriso, eu adorava quando ela me abraçava assim. Retribuí o abraço, respirando o seu cheiro. Era tão bom.. Parecia aquelas balinhas de hortelã, eu acho.. A abracei mais forte, sentindo lágrimas mornas rolando por meu rosto involuntariamente. Eu estava exausta.
- Minha mãe de novo, MB. É sempre assim.. Ela me cobra tanto.. Tem vezes que eu não dou conta de tudo, sabe?
Desabafei com a voz embargada, me escondendo entre seus fios castanhos, deitando minha cabeça em seu ombro. A de óculos suspirou entendendo a situação e me abraçou mais forte, tirando uma das mãos do meu redor e afastando alguns livros que estavam na cama. Assim que o fez, voltou a me abraçar e deitou na cama junto de mim, levando seus dedos à minha cabeça e acariciando meu cabelo do jeitinho que eu gosto.
- Eu estou aqui agora Mi. Tá tudo bem. Eu durmo aqui se quiser, o que acha?
Falou de forma compreensível e empática, afastando meu rosto de seu ombro para me olhar. Encarei a imensidão de seus olhos que alternavam sutilmente de cor por de trás das grossas lentes de seu óculos. Alternavam entre verde e marrom bem claro, se mesclando como se lutassem por espaço. Ela devolveu o olhar e por alguns segundos eu senti vergonha, meus olhos eram de um castanho bem escuro, muito sem graça. Eu gostaria muito de ter os olhos com alguma cor diferente, como azul, verde, cor de mel como os da Becca, ou até cinza. Afastei os pensamentos e voltei ao presente, MB me olhava atentamente, levando a mesma mão que antes acariciava o meu cabelo até minha face, afastando alguns fios soltos de meus rosto com cuidado. Não pude evitar de abrir um sorrisinho como resposta.
- Seria ótimo.. Se não for incômodo, claro.
Acrescentei rapidamente e a morena deu uma risada. Se eu não a conhecesse o suficiente, teria certeza que ela estaria zoando da minha cara naquele momento e me sentiria um tanto besta por ter aceitado. Mas, por mais que eu já tenha dormido várias vezes com a garota quando éramos pequenas, eu ainda tinha uma certa insegurança. Eu adorava, claro, mas tinha medo de estar incomodando. Meus pensamentos se dispersaram quando Miran completou:
- Claro que não é incômodo algum, oras! Eu mesma me ofereci, boba.
Ela riu e eu dei uma risadinha meio nervosa junto.
- Sei lá.. Vai que você só falou por educação? Não sei, esquece.
Soltei um risinho, observando seu rosto. Era bonito. Ela revirou os olhos com um sorriso irônico estampado no rosto.
- Se oferecer para dormir junto por educação? Você é mesmo meio doidinha, né? Mas eu te amo mesmo assim!
Ela disse em um tom animado e meu estômago revirou. Meus lábios se contraíram em um sorriso quase instantâneo. Eu gostava daquelas palavras. Quando eu estava menos esperando, ela separou do abraço agilmente e começou a fazer cócegas em minha barriga, eu me encolhi, rindo bastante, tentando afastar seus braços.
- MB.. Para.. Meu Deus..!
Eu falei sem ar, ainda rindo bastante e rolando na cama para me afastar, mas Miran era rápida e conseguiu me alcançar sem muito esforço. Depois de um tempinho assim e eu implorando por liberdade, a garota parou, rindo comigo ou de mim. Eu ri de volta, a observando. MB sempre conseguia me fazer rir de alguma maneira.
- Eba!! Consegui fazer você rir! Ganhei a noite!
Ela fez uma dancinha boba ainda deitada na cama e eu ri de novo, com um sorrisinho bobo no final. Ela retribuiu o sorriso e deu um bocejo, estranhei um pouco Miran estar com sono tão cedo, mas logo dei um bocejo também. Talvez não esteja tão cedo como eu pensava.
- Troca de roupa, vamos deitar direitinho e apagar a luz, a gente continua conversando no escuro como antigamente.
A de olhos verdes abriu um sorriso largo e eu assenti, me levantando e direcionando ao banheiro, me trocando rapidamente para um pijama confortável. Quando voltei, me joguei na cama, ela já tinha sido arrumada por Miran, para a minha surpresa.
- Ok, senhorita. Se aconchega aí que eu vou apagar as luzes!
Ela diz em um tom engraçado e eu puxo a coberta para me cobrir, esperando pela mesma. Ela apaga a luz e logo chega, deitando ao meu lado abraçando a minha cintura. Isso me arrepiou um pouco, mas eu relevei. Ficamos conversando por um bom tempo, até nós duas cairmos no sono quase ao mesmo tempo.
