꧁Capítulo 1꧂

1.6K 157 98
                                    


Ellara

— Ella! — Sua voz grave estrondou entre as árvores. Bufei enquanto o assistia emaranhar-se em uma briga com um de nossos alvos. Escondi o pequeno saco de moedas e avancei contra o macho que agora o prendia contra o chão. Num movimento fluido sua garganta fora cortada, salpicando sangue quente em minha mão. Leander encarava-me ofegante, seus olhos embainhados em incredulidade.

— Não me olhe deste jeito! Pelo o que me lembro, não fui criada com bons modos. — Resmunguei estendendo-lhe a mão. O macho a aceitou com uma carranca em seu rosto, mas logo seus lábios transforaram-se em um sorriso doce.

— A criei bem, pestinha. — Sussurrou alisando sua espessa barba. — Vamos, temos de levar a cabeça do grandalhão de volta para nosso comprador. — Leander resmungou, entregando-me seu antigo machado, indicando que o serviço brutal seria feito por mim.

— Não suporto aquele maldito lugar e seu dono. — Ralhei, descendo a lâmina afiada em direção ao pescoço do cadáver. O som abafado e húmido acometeu meus ouvidos, arrepiando minha pele, alimentando a parte sombria que divertia-se com a matança.

— Não importa, Ellara. Precisamos deste serviço e o Rei nos pagará em grande peso. — Leander grunhiu.

— Somos caçadores de recompensas, meu velho! Sempre conseguiremos dinheiro. — Sibilei agarrando o crânio pela raiz dos cabelos. Gargalhei o ver Leander enrugar o nariz e estender a sacola de tecido para que pudéssemos transportar a cabeça de nossa 'caça'.

— Você precisa de um lar. — Afirmou com pesar. Meu peito apertou-se, magoa e fúria elevaram-se.

— Isto não é mais importante. — Sussurrei selando meu cavalo, evitando encarar a decepção no rosto do macho que criara-me como sua filha. O garanhão agitou-se, sentindo minha inquietação. Seguimos viagem sem pronunciar uma única palavra, caminhando para nosso terrível destino.


──── ∗ ⋅◈⋅ ∗ ────

Despertei de meu estupor, o cheiro de sangue e álcool misturavam-se grotescamente, expirei, forçando meu estomago a manter-se firme. Caminhei entre os emaranhados de corpos, ignorando os gemidos e risadas, mas principalmente, os machos de Hybern. O salão de cerimônias transformara-se em uma grande taverna para os melhores soldados, com direito a comilanças, bebidas e as mais belas jovens que trabalhavam nos bordeis próximos.
Os nós de meus dedos tornaram-se brancos, fúria corria em minhas veias, respirar tornava-se difícil a medida em que meu ponto de destino destacava-se. Agarrei a sacola amarrada em meu cinto e a joguei aos pés do trono, encarando seu governante sob as sobrancelhas, engolindo os xingamentos que rodeavam minha mente.

— Depois de tantos anos, ainda continua a comportar-se como uma vadia, Ellara? — O Rei grunhiu sua insatisfação. Seus dedos estalaram-se em um comando para que seu guarda conferisse o pacote; um par de mãos de um antigo comandante traidor.

— Pelo o que me lembro, não fura criada com o melhor dos modos. — Desdenhei retirando meu capuz, exibindo os longos fios amarelados e pálidos.

Um macho bêbado aproximou-se e acariciou a longa trança que descia por meu ombro. Sorri fraca antes de agarrar seus dedos e torce-los em direção oposta, roubando um grito rouco de sua garganta. Abaixei-me para encarar o macho que rolava no chão lamacento. Segurei seu rosto, aproximando meus lábios dos seus, lambendo a fenda que se formou enquanto agonizava por ter os olhos perfurados por minhas unhas.

— Imbecil. — Resmunguei, limpando as mãos em suas roupas.

— Ele era um bom macho. — O rei suspirou, esfregando as têmporas. Sua coroa fosca seguia o movimento de sua cabeça, cada detalhe sódico relembrava-me da noite em que acorrentara-me e ceifara a vida daquele que me acolhera como sua filha.

𝕮𝖔𝖗𝖙𝖊 𝖉𝖊 𝕱ú𝖗𝖎𝖆 𝖊 𝕽𝖔𝖘𝖆𝖘Onde as histórias ganham vida. Descobre agora