Queimado

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Rafaella se trancou em seu quarto, deslizando pela porta e sentindo a tristeza a tomar, ela realmente tentou segurar o choro, mas antes que se desse conta, soluços baixos já estavam escapando de seus lábios, seguidos de lágrimas que corriam sem parar por suas bochechas, molhando a manga da sua blusa.
                    

Era muita coisa para a sua cabeça, muita coisa mesmo. Além do problema da distância de Sofia e Bianca, e de Marcella também, ela não conseguia encontrar trabalho nenhum, e agora havia sido recusada por três editoras. Era como se uma aura de azar a cercasse ferozmente, fazendo absolutamente tudo em sua vida dar errado.                  

Ela se levantou do chão, pegando todos os seus cadernos e rascunhos em folhas avulsas, saindo do quarto com certa raiva, descendo as escadas e saindo de casa. Ela jogou tudo no quintal, em cima da grama.                 

Ela voltou para casa, indo até a cozinha e pegando um isqueiro na gaveta, voltando para o quintal. Ela teve de acender o isqueiro três vezes, pois o vento o apagava, antes de jogá-lo no meio dos papéis, os vendo entrar em combustão e começar a virar cinzas quase que imediatamente.
                  

Ela abraçou os braços enquanto via aquela cena, deixando mais lágrimas escaparem de seus olhos enquanto as chamas esquentavam seu corpo.                     

Então, de repente, era aquilo. Estava tudo acabado. Rafaella havia cortado suas relações com o papel e a caneta, ela não aguentava mais.

~*~                    

- Como se sente? – Rafaella perguntou para Marcella, acariciando sua mão, sentada na poltrona ao seu lado.                   

Ela soltou um risinho baixo.

                    

- Por que ainda pergunta isso? Acho que eu quem deveria lhe fazer essa pergunta, você parece extremamente péssima.
                   

- Eu estou bem. - ela assentiu.                 

Ela suspirou, mas não falou nada. Rafaella deu uma boa olhada nela. Além da peruca que Melanie havia lhe dado - que parecia seu cabelo de verdade, razão pela qual foi cara -, haviam muitas e muitas coisas diferentes nela. Ela havia emagrecido pelo menos 15 quilos, estava bem magra, e sua pele havia perdido a cor, parecia mais amarelada, um tom doentio. Seus olhos castanhos tinham olheiras fundas, e ela tinha uma sonda ligada ao seu nariz, por onde sua alimentação era feita na maioria das vezes, pois tudo o que ela comia era botado para fora depois de alguns minutos.                  

Ela tentou com certa dificuldade se sentar na cama, e Rafaella a ajudou, segurando suas costas para lhe dar apoio.                    

Ela olhou para ela depois de se sentar, franzindo a testa e desviando o olhar para os seus dedos em seu colo.                    

- Eu desisti, Rafaella. - ela falou baixo.                  

- Do quê? - ela franziu a testa.

- Do tratamento. Não estava fazendo efeito nenhum, eu só estava ficando pior com as reações. - ela falou cautelosamente, sua voz saía fraca e baixa, desgastada, assim como ela.                    

Rafaella provavelmente gritaria com ela, ou até choraria, mas tudo o que ela fez foi assentir compreensivamente. Ela sabia, todos sabiam, que não tinha mais jeito, Marcella estava mal demais, ela não conseguiria se recuperar mesmo se quisesse isso. E ela também sabia, e aceitava, era a única maneira. Tudo o que podia fazer era ficar perto de Marcella enquanto seu coração ainda batia, porque, afinal de contas, já haviam se passado seis meses, já era dezembro, e tudo o que os médicos lhe deram foram em média sete.

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