Capítulo 4: Desejo e Frustração

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 A intensidade do desejo se configura na proporção direta da distância emocional ou física que separa o desejante do desejado, e na proporção inversa da facilidade de consumação desse desejo. Em outras palavras, quanto mais difícil, mais energia e motivação o seu corpo terá de gerar para conseguir realizá-lo. Por isso, acredito que ficamos tão instigados com desafios.

 O amor romântico parece ter uma propriedade intrigante: quanto mais impossível, mais fortalecido ele fica. Quanto mais acessível e próximo está o seu objeto de amor romântico, menor é o desejo, menor é o amor. Quanto mais longe, ou potencial de perda, mais a chama do amor romântico queima com a maior intensidade possível.E isso não parece ter influência social, mas sim genética.

 Os bois machos, por exemplo, quando perdem o interesse pela fêmea, são submetidos, pelo fazendeiro, a  dividirem seu local com outro boi mais novo e mais enérgico. Isso faz com que o boi mais velho sinta que sua fêmea pode passar a acasalar com o novo boi. Como consequência, pelo medo da perda, o boi mais velho passa a sentir novamente desejo sexual pela fêmea novamente, voltando a copular com ela.  Com isso, pode-se pensar que a paixão, ou o amor romântico, é uma espécie de desejo, por isso, só existe com a condição de um certo afastamento entre o desejante e o desejado. Aliás, uma das formas de se frustrar com o desejo não é apenas não o realizando, mas também realizando, pois é aí onde ou tudo perde a ''graça'', ou você percebe que não era bem o que você esperava.

 Portanto, suspeito de que a vida seja, em boa parte, agonia, insatisfação e desespero; posto que, muitas vezes, não há final feliz para o desejo, nem antes ou depois da realização. Somos seres insustentáveis, à procura de conquistas sucessivas de pessoas e objetos enquanto a vida nos permite fazê-lo. E talvez seja esse o nosso algoz.

Dessa forma, nosso vazio estrutural nos impele a tentar preenche-lo; como esse não é um fator conjuntural, mas sim uma condição de existência da humanidade, isto é, todos nós somos atormentados pela incompletude, queremos tudo o que ainda não temos, como uma forma de completar o incompletável. E sim, já nascemos sendo abraçados pelo frio da solidão; não é à toa que, quando crianças, criamos amigos imaginários e falamos com eles e, quando adultos, continuamos a acreditar em ideias místicas e improváveis. Tudo isso me parece ser fruto do medo humano da indiferença cósmica, isto é, estar sozinho em um universo infinitamente maior, que faz com que sejamos insignificantes pontos minúsculos comparado ao todo. E que nossos gritos de dor e desamparo ecoem no vazio do universo e sejam diluídos aos poucos assim como nossa carne, nossos sonhos e esperanças, sem que ninguém nos ouça, nos veja ou nos salve. Bom, não há ser humano que suporte essa ideia. Ninguém está preparado para a solidão que sempre nos encontra. Talvez seja por isso que busquemos nos preencher de forma desmedida, sempre buscando tudo, nunca se contentando com nada.

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