Refugiei próximo a árvore dos balanços após o jantar, eu estava prolongando a visita ao meu antigo quarto, pois ainda exibia fotos e outros objetos de Igor. Era meu dever escolher o destino deles, mas eu não queria na época imaginar o nunca mais rever.
Não que alguém de minha família questionasse, além disso tia Flávia também manteve muitos itens na justificativa de que seriam de Augusto e Amanda.
Jamais me orgulhei da vivência do luto.
Respiro fundo, movimentando o isqueiro. Era o preferido de Igor e que havia sido a fagulha para nossas discussões quando persistia nos cigarros enquanto estávamos na radioterapia e quimioterapia.
—Mamãe.
O grito de Amanda me fez saltar do balanço. Meus braços rodearam seu corpo com extrema preocupação e medo.
—O que foi meu amor?
— Tia Thamara está no hospital. Ela perdeu o bebê.
Voltamos rápido para dentro da casa.
— Quando vamos para Goiânia? — foi a primeira e única pergunta correta para o momento.
Guilherme e Bianca se entreolharam, de mãos dadas. Por alguns instantes eu senti a velha cicatriz ao entender que não tenho mais esse apoio incondicional. Eu compartilhava uma vida com meus filhos, mas meu marido não apareceria num rompante pela porta com a voz grave e forte.
— Rodolfo acha melhor o esperarmos aqui mesmo.
—Mas, e minha irmã?
— Ela disse que está tudo bem.
Expirei, mordendo o lábio:
— Vocês realmente acreditam nisso?
— Nós precisamos respeitar o limite imposto por ela. Sabe disso, Carolina — meu pai retrucou.
— Talvez se fosse apenas eu... — tentei argumentar ainda bastante hesitante.
— Filha, por favor.
Ouvi a súplica de Bianca, eu queria apertar as mãos sobre a cabeça para evidenciar a frustração que me rodeava nesse momento. Parecia que estávamos fadados a perdas e eu me ressentia um pouco quando considerava o desejo avassalador de Thamara pela maternidade.
— Não é uma boa hora, estamos eufóricos no mal sentido. Lamento tanto, mãe.
Bianca se levantou, pronta para me abraçar, Amanda mantinha-se ao meu lado.
— Nem sempre entendemos a decisão de Deus.
℧℧℧℧℧℧℧℧℧℧
Ao contrário do que imaginei e recriei em meus discursos, o curto tempo com Thamara em nossa fazenda deixou-me um pouco confusa sobre o papel como a irmã mais velha e conciliadora. Entre murmúrios nos corredores da grande casa eu tentava ignorar os questionamentos de estranhos sobre a realidade de cada um dos meus irmãos.
Não gostava dessas interrogações que nos comparavam e afirmavam que ainda estávamos incompletos, ou sobre as possíveis oportunidades de recomeços que só nos colocavam em um ciclo bastante fechado e com pouquíssimos objetivos.
— Bonitão de cabelos castanhos e olhos cor de mel?
Interrompi meus passos, fechando os olhos ao reconhecer a voz de Emanuel. Logo me vi esfregando as mãos nas coxas, tentando minimizar o suor como na primeira vez que conversamos. É lógico que a única razão naquele momento era meu direito de importar e preocupar com o bem estar de Augusto e Amanda, embora sinto a cada dia o quanto a dependência tornava-se fracionária.
ESTÁ A LER
Em Um Som
RomanceCarolina Moura Souza assoprou sua vela de quarenta e cinco anos. Ela detestava envelhecer, detestava ser descrita como a filha mais velha e serena, principalmente quando sentia dentro de si um vulcão escondido. E esse era o problema; a mata ao red...