Capítulo 1

5.3K 343 226
                                    

TRÊS ANOS ANTES DO FIM

Na opinião de Aguinaldo, sua situação era simplesmente deplorável. A cada minuto, hora e dia se tornava mais difícil. O tempo estava passando e nada mudava.

Estava apaixonado. Isso era um fato. O problema é que Aguinaldo não conseguia reunir coragem para revelar seus sentimentos, além de que sua autoestima era do tamanho de um grão de arroz. Ele já não era bom em fazer amizades, a coisa só piorava quando se imaginava convidando alguém para sair pela primeira vez em sua vida.

Emê de Martnália era o nome do seu sofrimento diário. Eles se encontraram pela primeira vez em um horário vago de aulas, enquanto iam reclamar por motivos diferentes na coordenação. A garota andava com a coluna ereta em toda a sua glória e parecia não se importar com nada ao seu redor além do caminho que percorria. Aguinaldo, com os olhos observando seus próprios passos, não se deu conta do incidente em que se envolveram quando se esbarraram naquele corredor.

Ele olhou para cima e quase caiu, ela o segurou pelo braço.

E foi assim que Aguinaldo percebeu que em sua escola existia uma garota exatamente como ele sempre quis conhecer e que era totalmente seu tipo ideal: segura de si e ao mesmo tempo encantadora.

Eles se desculparam e Emê de Martnália seguiu com sua vida, mas Aguinaldo não. Ele não sabia dizer se havia sido a maneira como ela o olhou, sem nenhuma surpresa e com uma profundidade que somente a cor meio esverdeada de seus olhos poderia ter, o timbre de sua voz pedindo desculpas, a mão firme segurando em seu braço, a linda pele de um tom profundo marrom-avermelhado que contrastava perfeitamente com a cor dos olhos, ou simplesmente o conjunto de tudo isso que o fez sentir que o tempo tivesse parado durante aqueles poucos instantes.

Sempre a encontrava em lugares diversos da escola, e ela sempre acenava com a cabeça em sua direção e o tratava bem, enquanto Aguinaldo nutria mais e mais admiração. Em sua imaginação fértil, eles tinham longos diálogos e no fim de todos eles, ela dizia que todo o sofrimento dele era recíproco. Era até mesmo cômica a maneira como ele foi se afundando cada vez mais nessa fantasia.

E se olharmos bem, ali estava Aguinaldo, sentado em seu lugar na sala, olhando para ela, tentando patéticamente extrair o máximo dela sem se aproximar. Talvez, se ele fosse uma pessoa diferente, as coisas seriam mais fáceis.

— Você está fazendo aquilo de novo. — Aguinaldo pulou na cadeira e olhou assustado para o seu lado.

Beltassamo, seu único amigo, o encarava enquanto estava sentado na cadeira ao lado.

— Quase me matou do coração — Aguinaldo murmurou colocando a mão no peito. Estava tão absorto em seus pensamentos que tinha se esquecido do ambiente ao seu redor.

— Daqui a pouco aparece um buraco no meio da cabeça dela — Beltassamo comentou.

Sua expressão era de pena, e Aguinaldo entendia o porquê. Ele sabia que qualquer pessoa que o olhasse logo percebia que alguém como ele não despertaria sentimentos amorosos em qualquer outra pessoa, muito menos em Emê de Martnália.

— O que você está esperando, cara?

Aguinaldo suspirou e abaixou a cabeça até que todo o lado esquerdo do seu rosto fosse esmagado pela mesa.

— Não sei, eu só... Quando chego perto dela, as palavras simplesmente não saem. — Ele tentou explicar.

— É, esse é um grande problema...

— Acha que eu não sei? Preciso criar coragem, mas só de pensar na expressão de desgosto que ela vai fazer ... Não consigo, não dá! — Até mesmo em sua voz era possível notar o quanto ele sentia medo dessa visão, e ele se sentia ainda mais idiota por isso.

Todos Nós Que Estamos VivosWhere stories live. Discover now