Segredos

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A mulher trouxe seu jantar pela segunda noite consecutiva. No dia anterior ele manteve a respiração regular tendo sucesso em fingir-se de adormecido — não que ele tivesse qualquer coisa contra Carol, ele só não queria ouvir mais agradecimentos — mas agora ela entrou sem bater e encontrou o rapaz sentado revirando sua mochila trazida para o quarto por Andrea.

— Que bom que está acordado. — Lá estava o sorriso gentil que havia desaparecido do rosto dela por algum tempo. Daryl não estava acostumado a ter essa expressão direcionada a si e uma culpa irracional se instalou no fundo do seu estômago fazendo o jovem dedicar uma atenção extra à mochila. — Trouxe seu jantar. Também vim te devolver isso.

A curiosidade o forçou a olhar por cima do ombro para encontrar a sua balestra desconfortavelmente pendurada no ombro de Carol.

Involuntariamente suspirou e seus ombros perderam parte da tensão que vinha se acumulando desde que se tornou indefeso, ainda na floresta.

Embora não houvessem flechas no suporte, apenas a presença da balestra era o bastante para tranquilizar Daryl, não que houvesse como lutar dessa forma, mas ter a arma em mãos lhe trazia segurança desde a infância.

— Pensei que Hershel havia confiscado como às outras armas — resmungou se arrastando para a lateral da cama até encontrar Carol. Ignorou o prato de porcelana da destra da mulher e a ajudou a mover a alça de couro que suspendia a besta.

— Sophia me entregou, ela queria te devolver pessoalmente, mas achei bom ter uma desculpa para vir aqui. — Não havia vergonha na voz, ela não se importava que ele soubesse que suas ações eram um subterfúgio para algo.

— Além do jantar? — Moveu a arma para o chão, apoiando a parte dianteira na lateral da cama e, finalmente, capturou o prato.

Não era muito, mas era mais do que estavam acostumados em suas refeições de enlatados, esquilos ou o que quer que encontrasse para repartir com o grupo.

Batatas douradas, tomates, brócolis e algo verde e mole que poderia ser espinafre. Não havia carne, mas ele não estava surpreso, aquela era uma fazenda leiteira, não poderiam sacrificar gado suficiente para suprir todas as refeições e não era como se restassem muitas galinhas.

— Eu não estou hospedada na casa, qualquer um que mora aqui poderia te trazer a comida. — Ela cruzou os braços finos e observou o rapaz espetar uma batata com nenhuma etiqueta.

— Por que demorou tanto para trazer? — resmungou com a boca cheia, o queixo angular apontando para a balestra repousando no carpete antigo e na cama de casal.

— Imaginei que se devolvesse ontem ou hoje cedo, você ignoraria as recomendações médicas e sairia para atirar em esquilos. — Daryl simplesmente bufou, porque Carol estava absolutamente certa, ele mal podia esperar para se livrar dos carcereiros e retornar ao seu elemento. — Eu queria te agradecer...

Antes mesmo sem ela completar a sentença, Daryl já estava resmungando e curvando os ombros como uma tartaruga se encolhendo no casco.

— Não precisa.

— Não. Isso é o mínimo que posso fazer, você trouxe minha filha de volta.

— Agradeça à Beth. Se não fosse por ela, eu estaria morto em um canto da floresta e Sophia desaparecida.

Havia amargura em seu tom, não por ter de depender de uma mulher ou por Beth se tornar mais útil que ele, mas por ser incapaz de cuidar de si mesmo e deixar toda a responsabilidade sobre uma criança e uma garota inexperiente.

— Engraçado, ela me disse que se não fosse por você, ela e Sophia ainda estariam perdidas.

Ele bufou se perguntando se a adolescente gostava de fazer o papel de donzela frágil e indefesa.

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