1 - Como se faz uma tempestade.

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     GRACE ORION

(...)

— Não vai dar certo. — Eric repetiu mais uma vez.

— Onde está o seu otimismo, Eric? Você é o ser de luz aqui! — Chiara disse em um sussurro alongado, apontando o óbvio, ela ninava uma Kiernan que estava quase pegando no sono.

— Vai sim. — Braeden se voltou para ele.

Que fez uma expressão dolorida em resposta.

Faltava cerca de duas horas ou menos para atracarmos no Vale das Cinzas. E o sol brilhava no céu.

Não teria como sairmos do navio, sem sermos avistados. A menos que estivesse frio para capuzes, ou quem sabe, pudéssemos usar capas de chuva.

E era justamente a chuva que nos faltava.

Aquele livro vermelho que Braeden protegeria com a própria vida, pertenceu a sua avó. E ele, continha feitiços que ela jamais havia tentando, por se tratarem de vida e morte, tempo, espaço, elementos da natureza, e um desses feitiços... Era capaz de fazer do céu claro e azul, a mais forte das tempestades. E era disso, que precisávamos.

Enquanto Eric se esforçava, algo indevido passou por minha mente. Por que os dons dele haviam aparecido tão rapidamente e eu... Continuava como antes?

Quando resolvi fazer a cerimônia e desbloquear a magia de luz em mim, eu sabia, um aviso da própria Mãe Freyja, que cada um tem seu tempo e não seria do dia para noite. E que Eric e eu éramos seres diferentes, com destinos diferentes. E assim sendo, tempos diferentes.

Mas tinha que ser tão diferente assim?

Eu estava me sentindo um fracasso, mas não falei sobre isso com ninguém. Nem mesmo com Damian..

Afastei os pensamentos, vendo Braeden correr os olhos pelo livro mais uma vez, ela sozinha, tentando por cerca de duas horas evocar tal feitiço havia conseguido algumas nuvens acizentadas no céu, nada além. E nosso tempo corria.

Mas então, Chiara apontou algo que poderia dar certo. Estávamos no mar, a água se fazia presente, um mar agitado, as moléculas água na atmosfera, as nuvens.
Eric... Eric poderia ser essencial.

Ele estava ligado a água.

E assim, nos fechamos na cabine que nós garotas estávamos dividindo, colocando Damian e Eric de forma clandestina para dentro, pois haviam regras de decoro no navio. Nossa janela era oval, um pouco maior do que as comuns, mas ainda sim pequena.

Não é como se pudéssemos fazer um feitiço do lado de fora, entre os humanos.

Kristiansen brincava em uma das camas atrás de nós, enquanto um Damian amarelo e mareado, estava deitado na minha cama comendo um gengibre que consegui comprar com umas senhoras da cabine ao lado. Eu mal via a hora de chegarmos, por ele.
Esse tempo todo no mar, cercado de água... Sem nenhum equilíbrio. Era como se Damian estivesse... Se apagando.

— Dormiu... — Chiara cantarolou colocando a pequena em sua cama. — Ela gosta de mim. De verdade. — Disse como se fosse a coisa mais especial do mundo. E era. E então, completou um tanto menos dócil. — Imagina Makenna vendo algo assim.

Oh, eu não achei graça. Eu ainda podia ouvir o choro de Makenna, seus gritos enquanto Narvi a segurava, enquanto íamos embora do Vale do Solstício com as crianças.

— Se ela não vier até nós por eles. — Damian disse em um resmungo cansado.

— Será que ela viria? — Chiara soltou rapidamente.

Eu particularmente, não dúvidava.

— E teremos que recebe-la como fizeram conosco no Solstício. — Damian disse, passando a mão sobre uma vela, fazendo a chama dançar entre sua palma.

O que flui sob nós | LIVRO IIWhere stories live. Discover now