Where my heart feels safe

487 67 15
                                    

                               A chuva caía de maneira torrencial naquela noite. As chamas das velas tremeluziam pela parede, iluminando de maneira quase precária, a capela pequena. Ao longe, a Irmã Soon checava as últimas salas do casarão à procura de alguma criança arteira, pronta para colocá-la na cama. Mesmo presa entre seus devaneios, notou algo diferente quando dobrou a esquina entre uma sala e outra, avistando um corpo grande e molhado, sentado e encolhido na frente da porta de vidro, logo reconheceu a figura e respirou fundo esboçando um sorriso condescendente nos lábios.

Abriu a porta convidando-o a entrar, oferecendo uma toalha limpa assim que se encaminharam para o antigo refeitório que Jungkook conhecia como a palma de sua mão.

O deixou sentado em uma das cadeiras e tratou de preparar-lhe um lanche, mesmo sendo tão tarde. Colocando a bandeja na frente do rapaz, se sentou encarando o olhar triste e o semblante cansado.

— Isso vai te aquecer. — Soon apontou a comida ao rapaz com um sorriso terno nos lábios. — Nós mesmas fizemos esse pão. — Arrastou a cadeira para o lado dele e continuou: — Eu e as irmãs vamos fazer umas caixas de música. Logo logo vou fazer uma para você. Tem alguma música favorita?

— Escuta irmã... — Jungkook a interrompeu, erguendo os olhos rapidamente. — Como eu faço para ser perdoado por um pecado que eu cometi?

— Eu já te disse, Antônio. — Irmã Soon soava mais séria agora. — Você já pagou muito bem pelos seus pecados.

A irmã conseguiu ver exatamente o momento que os olhos do rapaz se encheram de lágrimas pesadas, o viu respirar fundo, tornar a curvar o pescoço e apertar as mãos por cima da mesa.

Nesse momento, tudo o que Jungkook queria era que o mundo parasse, com ele o tempo; gostaria de ser levado de volta ou de vez, sentindo o corpo pesar mais uma vez com a culpa que sempre lhe acometia.

— Não, eu não paguei Irmã! Eu ainda não paguei por pecado nenhum. — A voz quebradiça mostrava o quanto o rapaz se controlava para não chorar desenfreadamente. — Muito pelo contrário... Mesmo as pessoas que eu quero fazer felizes, parecem estar amaldiçoadas por minha causa.

Aquele era um momento delicado, e Irmã Soon sabia disso, ela entendia os demônios do passado de Jungkook, conhecia-os, mas não os carregava. Entretanto, o sorriso que floresceu no rosto da velha mulher era calmo e condescendente.

— Para mim, está claro que você encontrou alguém muito especial. — A fala atraiu os olhos do rapaz, uma lágrima grossa escorrendo pelo rosto avermelhado, e com a atenção de Jungkook em si, ela continuou: — Não tem como mudar o passado, mas você sempre tem o presente para fazer o bem, para fazer o melhor que puder. Mas, lembre-se disso, Antônio... A única pessoa que precisa perdoar é você mesmo, meu filho.

As palavras ecoaram pelo corpo grande e cansado de Jungkook por várias horas, o fazendo remoer o passado com mais cuidado, menos desespero. Não tardou a sair do orfanato, deixando para trás uma senhora com o olhar preocupado e triste, mas com um peso a menos nas costas. Indo para a casa, não se preocupou em comer algo a mais, tomou um banho quente e trocou de roupa, jogando-se na cama, desejando poder fundir-se a ela e sumir de uma vez por todas.

Retornou ao hospital pela manhã, e mesmo cansado pela noite mal dormida, continuou feliz ao encontrar Taehyung se arrumando para sentir o sol.

Acomodado na cadeira de rodas, Jungkook o empurrou pelos corredores até a sacada mais próxima, passou pelas portas de vidro e caminhou até a ponta da estrutura de cimento que os fazia ter o privilégio de avistar o jardim na parte de baixo. O sol estava ameno, a brisa leve da manhã tocava o rosto corado de Taehyung que mantinha a serenidade ao ser quase embalado pelo moreno. O colete protegia as costelas machucadas, mas aquilo não parecia incomodar.

Your Eyes Tell - JJK+KTHWhere stories live. Discover now