CAPÍTULO 1 - BEM-VINDA DE VOLTA

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Eu não tinha planejado que isso acontecesse. Eu não tinha planejado nada disso. Eu não tinha planejado me mudar pra uma cidade pequena, eu não tinha planejado sair de Nova York e vir parar aqui. Mas eu não tinha opção nenhuma.

Na cidade grande eu já não conseguia acompanhar o ritmo de ter dois empregos e ter que pagar um aluguel que comia 70% de tudo o que eu ganhava. As coisas estavam feias. Então o que me restou foi voltar pra a cidade onde nasci e começar do zero. Meus pais tinham deixado a casa deles pra mim. Eles tinham ido morar em Dallas porque meu pai tinha sido promovido e transferido como diretor da filial de uma empresa no ramo de carros daquela região.

Eu não falava muito com eles, eu acabei me desligando de tudo e todos dessa cidade, até dos meus antigos amigos de colégio. Eu só acompanhava a vida deles pelas redes sociais e nada mais. E agora eu tinha deixado os amigos da cidade grande pra trás também, mas não é como se esses fossem fazer falta. E mais uma vez eu tinha deixado tudo pra trás.

Nova York é incrível, é linda, é maravilhosa, mas é trágica.

As coisas começam a perder o sentido depois de um tempo. Você começa a aproveitar menos, a trabalhar que nem louca, e a não viver nada. Não era pra isso que eu tinha saído de casa. Então o que eu podia fazer? Voltar pra casa. Essa era minha resposta: começar de novo. Ir para a calmaria da cidade pequena com suas casas afastadas da cidade, limpas, e jardins perfeitos.

Meu pai tinha arranjado um trabalho pra mim em um lava-jato que dava pra pagar as contas e fazer umas compras básicas e a verdade é que meu pai estava mandando uma ajuda financeira também.

Eu não tinha nada em Nova York, nem móveis, nem tapetes, nem mesmo uma panela, então coube tudo no meu carro. Parei em frente aquela casa que estava melhor do que eu tinha visto na última vez. Eu cresci ali, eu vivi um monte ali. Me senti um pouco nostálgica, meu antigo "eu" não pensava em voltar tão cedo, mas cá estava eu tentando começar de novo o que eu nem realmente tinha começado.

Abri o carro e fui carregando mala por mala para a entrada. A casa estava abafada, era verão e estava fechada há meses. O sol queimava pelas cortinas e no chão de madeira escura. O cheiro de mofo era grande, mas estar naquele lugar me acalmava. Os quadros favoritos da minha mãe pelas paredes, fotos minhas pela lareira, as antiguidades do meu pai também estavam por ali. As cortinas brancas, os enfeites de porcelana e artes que minha mãe adorava. Senti falta deles por um minuto, acho que queria que eles estivessem aqui.

De qualquer forma, era bom estar de volta. Eu era uma vergonha pra minha geração. Colegas não acreditaram na minha decisão de sair de NY e voltar pra Healdsburg, do outro lado do país.

Mesmo tendo apenas 21 anos, eu já tinha enjoado da cidade grande, principalmente porque eu aproveitava pouco dela. Tinham sido anos terríveis aqueles em Nova York, que se eu pudesse eu teria feito não acontecer, não me importo se aprendi ou não, eu só queria apagar os últimos 3 anos.

Subi para o meu quarto, ele estava tão abafado quanto o resto da casa. Estava do mesmo jeito que eu tinha deixado da última vez que vim aqui. Minha época romântica com certeza tinha deixado uma marca ali. O quarto era praticamente todo branco, com apenas alguns detalhes rosas.

Alguns livros na estante velha. Tudo continuava ali. Um pôster de banda na parte de trás da porta, alguns objetos velhos na mesinha de estudo. A sensação é que eu ainda tinha 16 anos e que tinha acabado de voltar da escola.

Deitei na cama olhando para a janela que ficava ao lado dela. Até a arvore do quintal continuava a mesma. Olhei ao redor agradecendo por meu quarto ser grande o bastante e com várias janelas que dava pra a rua ao lado e para o quintal.

NOS BRAÇOS DELAOnde histórias criam vida. Descubra agora