Capítulo 21- Ponto de equilíbrio

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Sinan estava no piano quando Azul apareceu. Foi a primeira vez que ela viu um piano ali desde que chegou, mas devia começar a se acostumar, estava na casa de um mentalista. Tudo ali era feito para iludir a mente humana.

Inclusive Sinan.

Desde a noite da tempestade, quando ele dormiu ao seu lado, nenhum dos dois trocou uma palavra um com o outro. As vezes ele passava e era como se não a vice. Outras vezes, ele sumia. Na verdade, ele sumia o tempo todo.

Isso a deixava... um pouco...

Azul não sabia definir.

Ela passava boa parte do seu dia avulça quando Rosa Lia não estava por perto. Se ocupava arrumando coisas na casa — mesmo que o lugar nunca parecesse bagunçado, apesar dela nunca ver ninguém arrumar. Ia dar voltas do lado de fora, mas nunca longe demais, e passava horas incontáveis no seu lugar favorito: a biblioteca.

Mas Azul estava cansada e aborrecida.

— Está com medo de se aproximar?— Sinan perguntou, ainda trabalhando com os dedos no piano.

Azul fez que não com a cabeça, mesmo ele estando de costas.

— Com medo que eu te devore?— ele a olhou sobre os ombros.

— Eu só... tô digerindo— Azul se aproximou com cautela.— Eu te perguntei se você é um canibal e você me deu uma resposta vaga, mas tudo me diz que a resposta é sim. Então espero que entenda que não é tão fácil assim ficar perto de você.

— Não pareceu difícil naquela noite.

A resposta dele a deixou levemente desconcertada.

— Você quer falar sobre isso?— Sinan perguntou, tocando algumas notas.

Azul colou os joelhos e os pés. Ela não respondeu.

Naquela noite, a tempestade não passou, e Sinan dormiu com ela até o amanhecer. Azul saberia se ele tivesse saído, ela tinha sono leve e muitos problemas com insônia que lhe faziam acordar algumas vezes durante a madrugada.

E todas as vezes que acordou, ele estava lá.

— Eu ouvi algumas coisas de noite— Azul mudou de assunto. Ela se aproximou, sentando ao lado dele no piano.— Tentei te sacudir, mas você não acordou de jeito nenhum.

— Eu nunca acordo depois de dormir— disse Sinan.

— Então não ouviu os barulhos?

— Era a tempestade.

— Não. Estavam arranhando a porta.

— Era o leopardo.— Sinan respondia tudo tão tranquilo que não parecia se importar com nada.— Ele não faz mau a ninguém.

— E os campistas mortos?

— As vezes ele faz— Sinan se corrigiu.

— Você é contraditório.

— Dualista — ele contradisse.— As coisas são mais do que parecem.

— E onde o leopardo está agora?— questionou Azul.

— Dormindo. No porão. Ele não gosta muito de sair de dia.

— E qual o nome dele?

Sinan parou. Aquela pergunta atrapalhou seu fluxo de respostas rápidas, assim como a música que tocava. Ele pareceu pensar mais nela antes de responder.

— Bob.

— Bob?— Azul ergueu a sobrancelha e o olhou de lado, descrente.— Bob, o leopardo?

— Sim.

Espectro da Meia-Noite/ Legado Das Sombras- Livro IWhere stories live. Discover now