Parte 40

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Magnus rolou para o lado e evitou que pisassem em seu rosto. Teve de deixar o escudo de lado, mas não largou do cabo de sua espada. O barulho que emitiu ao jogar o corpo contra um soldado e se levantar soou como um rosnado. Uma vez de pé e sentindo sua base estável, procurou por Anluath na bagunça de corpos que era o pequeno compartimento.

O elfo... tinha os olhos fechados. Aproveitando o breve momento em que soldados inimigos cambaleavam para longe de si, após uma sequência de golpes com as adagas, Anluath retirou do bolso um recorte de papiro inscrito com dizeres estranhos. Erguendo a mão com o objeto, pronunciou algumas palavras que ninguém escutou, e uma lufada de vento invadiu a cabine interna do navio, vinda — ao que parecia — do próprio papiro.

Não restavam mais muitos homens da Virtude de pé. Com o feitiço, ainda mais tombaram e Magnus ocupou-se de terminar o serviço. Jogou o peso do corpo contra um soldado, fazendo-o desmaiar em seguida com um golpe do pomo da espada. O último inimigo, estremecendo, recebeu um chute no estômago, esforçou-se para não cair, e correu para o convés de cima.

Magnus inspirou fundo, sentiu o peito arder e uma pontada de dor no abdômen, mas escolheu ignorar possíveis ferimentos, por enquanto.

— Esse truque é novo — disse, olhando para o elfo e imitando o gesto que Anluath fizera com o misterioso papiro.

Arfando, o arqueiro sorriu, depois relaxou o corpo, levando o tronco para frente e permitindo-se um curto descanso. Sem erguer o olhar para o companheiro, gesticulou na direção da porta trancada:

— E eu tenho mais um desses, especial para o nosso mago aqui.

Som de passos no convés superior fez com que os dois voltassem ao estado de alerta.

— Tinham mais soldados lá dentro com ele? — Magnus perguntou, agachando-se para recuperar seu escudo.

— Não vi. De qualquer forma, é perigoso.

O guerreiro posicionou-se frente à porta, olhou para o elfo.

— Eu chuto e você atira?

A madeira estilhaçou-se sob a força do chute de Magnus, revelando o interior da cabine. O mago, parcialmente escondido por detrás de um caixote de madeira, tinha as mãos erguidas com uma magia pronta, mas antes que pudesse pronunciar o encantamento uma flecha atingiu seu ombro, fazendo-o tombar e perder o foco. O guerreiro agiu em seguida, rápido, agarrou o mago e, passando o braço ao redor do pescoço humano pequeno e frágil, apertou. Apertou até que desmaiasse.

Magnus, tentando ser gentil após tanta violência, apoiou o corpo inconsciente no chão. Virou-se para Anluath, que olhava para fora da pequena janela da cabine.

— Está começando a se dissipar — informou, com alívio na voz. — Mas não podemos arriscar que ele refaça o feitiço — concluiu, voltando-se para o companheiro.

Retirando outro papiro cheio de símbolos estranhos de um bolso, o elfo deu os dois passos que o separavam do mago e agachou-se ao seu lado.

— Lórien diria para matá-lo — Magnus comentou, meio rindo.

— Diria — o arqueiro concordou. Não disse que a elfa jamais teria coragem, depois de tantas mortes desnecessárias em seu caminho, de cravar uma adaga no coração de um homem desmaiado. Magnus também sabia dessa parte.

Então, para evitar ainda mais derramamento de sangue, Anluath posicionou seu papiro sob a testa do mago, pressionou-o ali com uma mão e ergueu a outra na altura do rosto. Em murmúrios, proferiu os termos que liberaram a magia ali escrita e o papiro começou a se despedaçar, sendo cortado por finas correntes de um verde cintilante e espectral. Muitas das correntes jorraram para fora, envolveram o corpo do mago, enclausurando-o e imobilizando-o e, após um feixe mais forte da luz colorida, desapareceram. O humano continuou deitado, inconsciente.

— Ele não conseguirá praticar magia por um tempo — explicou, vendo o questionamento no olhar de Magnus.

Outra vez, Anluath foi até a janela e observou as águas do lago, lá fora. Já quase não se via o amarelo tingindo o líquido. O encantamento desfazia-se. As passagens destrancadas. 

Livro 2 - A Sombra, a Música e a Espada [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora