- Capítulo 01 - A Casa na Montanha -

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"Mas, eu só percebi quando era tarde (...) que eu me tranquei sozinho com o inimigo, que vai passar a vida aqui comigo, vivendo do meu medo e solidão."

Há seis ou sete anos atrás me considerava uma adolescente normal, apesar dos meus sonhos serem completamente diferentes dos sonhos e desejos das minhas amigas. Numa época em que dez entre dez adolescentes queriam ser cantoras ou modelos famosas, eu queria encontrar o homem da minha vida e morar na Inglaterra, simples. Ou não, afinal não queria qualquer homem, eu queria um Mr. Darcy, nada menos do que isso seria suficiente para mim.

Os meus sonhos têm uma culpada: Jane Austen. Desde que eu li "Orgulho e Preconceito", sua obra prima, minha vontade de ir embora do Brasil tomou um rumo certo: Inglaterra. E sabia o que buscaria por lá, além de um bom emprego, afinal não ia viver de deslumbramento. Procuraria o meu Fitzwilliam Darcy³, um homem perfeito em seus próprios defeitos. O homem ideal para mim, o homem com o qual eu passaria o resto da minha vida.

Ainda sorria, lembrando das palavras de uma das amigas que estavam comigo na noite anterior, nosso último fim de semana das férias de julho.

– Dá para você dizer quantos pegou ao todo? Te vi pelo menos com três meninos diferentes! – Falou a Roberta, minha amiga japinha. Nem ela sabia se tinha alguma descendência oriental, mas seus olhinhos puxados eram inconfundíveis, se não fosse morena e tivesse uma irmã tão parecida com ela, diria que existia uma grande probabilidade de ter sido trocada na maternidade. Roberta era baixinha e corpulenta, seus cabelos curtos eram repicados na altura do queixo, e de longe lembrava uma garota meiga e simpática, mas tinha um gênio do cão. Era sem dúvidas a mais estressada de nós três e já havia nos colocado num sem número de confusões por causa disso.

– E eu que pensava que ela estava se guardando para o tal Flitz, Fritz, o inglês lá dela! – A Natália sorriu.

Roberta e eu tínhamos a mesma idade, dezessete anos, com uma pequena diferença de meses. Rô era de setembro e eu de dezembro. Já Natália, a quem chamávamos de Naty, era mais velha das três, tanto na idade como na aparência. Completara dezoito em junho, e possuía o corpo mais feminino do grupo: seios fartos, quadris largos e coxas grossas. Seu rosto também era mais maduro, emoldurados por seus longos cabelos pretos e ondulados.

A conversa entre a gente estava me deixando envergonhada por causa do Cláudio, namorado da Naty, que estava dirigindo o carro. Ele tinha vinte e um e os dois namoravam há três ou quatro anos, tanto que ninguém mais pensava em um sem o outro. Até fisicamente eram parecidos: altos e encorpados. E sua beleza chamava atenção por onde passavam.

Nós costumávamos chamá-los de casal café com leite, já que Natália era morena clara e o Cláudio era negro. Ele era alto e forte, mas o que eu achava mais bonito nele eram seus dentes branquíssimos e alinhados, exibidos quando sorria abertamente.

– É Fitzwilliam Darcy³, suas ignorantes! – Corrigi. – E nada me impede de ensaiar para que eu esteja no ponto quando ele me encontrar!

Os gritinhos das duas irromperam pelo carro enquanto o Cláudio balançava a cabeça olhando para mim pelo retrovisor, como quem diz: "Essa daí é louca!".

Sabia que no fundo ele achava engraçado, mas ainda ficava tímida na frente dele. O único garoto com quem me relacionava sem reservas era o Apollo, com ele eu não tinha receios.

Naquela noite eu estava especialmente feliz, me sentia livre, como não acontecia há algum tempo. Faltava apenas um semestre para o fim do Ensino Médio e poderia enfim executar os planos que passei a vida toda fazendo. Eu estava alegre por estar ao lado das minhas melhores amigas, mesmo faltando o meu melhor amigo, que estava viajando. O Cláudio era menos que amigo, era colega e namorado de amiga.

Novo Horizonte - AMOSTRAWhere stories live. Discover now