Mocinhos e Vilões.

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Forço meus olhos a se abrirem, sentindo um leve incômodo no local onde minha cabeça foi machucada. Me vejo em uma ala diferente das outras, com algumas macas e aparelhos médicos. Enfermaria.

Luci como uma boa amiga que é, está sentada ao meu lado, em uma dessas cadeiras de acompanhante, brincando com as pontas de seus dedos, de cabeça baixa.

- Eu disse que essa aula não seria uma boa ideia. - digo brincando, para que ela veja que acordei.

Ela me olha com alívio, me examinando com os olhos, como se agradecesse por me ver bem.

-Que bom que acordou. - ela diz.

Tento me sentar, mas sinto a cabeça doer. Levo minhas mãos ao local, sentindo a ausência de uma mecha no meio do meu cabelo.

- Quatro pontos. - Luci diz, apontando para a minha cabeça.

Não demora muito até que o enfermeiro responsável pelo reformatório vem até nós, avaliando minha situação e me dando alta.

Enquanto caminhamos lentamente até nosso quarto, Luci e eu conversamos, já que fomos liberadas por você. Luci para que pudesse me ajudar em alguma coisa e eu pudesse repousar.

- Achei que fosse a sua primeira aula. - ela diz, dando curtos passos.

- E foi... Foi tão esquisito. Parecia que o meu corpo sabia o que eu deveria fazer, ele ia sozinho. - digo, tentando entender o que aconteceu ali. Ainda não contei a ela sobre as visões que tenho, com medo de que ela me julgue, achando que eu sou apenas uma louca. - Já aconteceu com você? - perguntei.

- Já. Foi mais ou menos assim com a trigonometria. - disse, me fazendo dar risada. - No começo tudo começou a se encaixar e eu pensei: "Uau! Eu sou uma gênia!", mas aí eu lembrei que tínhamos estudado isso no ano passado. - As referências de Luci são engraçadas, já que ela é uma cdf, e a maioria dos seus exemplos ou piadas são envolvendo computação ou matemática.

Por coincidência do destino, vejo os gêmeos no fim do corredor, seguindo para os vestiários da quadra. Ambos estão sem camisa, exibindo seus corpos. Cam é mais franzino, de uma palidez que me deixa surpresa, enquanto Tom é mais forte, em um bronzeado perfeito.

- Está caidinha por ele, não é? - Luci pergunta, enquanto eu observo os dois.

- Não é isso. - digo, mas vejo Tom molhar seu rosto com a água que estava em sua mão. A água escorre pelo seu peitoral escultural e me pego pensando a quem estou enganando. - Ou talvez eu esteja. Eu tenho uma sensação estranha sobre ele, como se eu o conhecesse a muito tempo.

- Talvez tenham feito jardim de infância juntos. - Luci diz, destravando a porta do nosso quarto.

- Eu perguntei se a gente se conhecia de algum lugar e ele respondeu que não. Então, ele basicamente saiu correndo. - digo, sentando em minha cama. - Isso é tão estranho. - falei, coçando a cabeça.

- Pois é... Algo realmente é bem estranho. - ela diz baixinho, como se não quisesse que eu escutasse.

- Porque acha isso? - perguntei, olhando para ela.

- Eu já te contei sobre isso. Eu posso me ferrar se você contar isso para alguém. - ela diz, puxando uma cadeira, sentando de frente para mim.

- Hmm... - é o único som que esboço. A quem mais eu contaria?

- Eu sou voluntária na secretaria, tenho acesso a todas os livros, registros, computadores e tudo mais. As fichas deles são vazias. Não há familiares, não há um número de emergência, não tem registros de quando vieram ou de onde vieram. Eles nunca falam sobre suas vidas antes daqui, quase nunca vão às aulas e eu sinto que todos se conhecem desde muito antes daqui. - ela diz.

- Como assim? - pergunto, tentando ligar os fatos que Luci me conta apressadamente.

- Primeiro chegaram os gêmeos, depois a Layla.

- A garota de cabelos roxos, certo? - pergunto e Luci me responde com um aceno de cabeça.

- Isso. Acho que 99% do cheiro que ela exala é de sexo. - disse, me fazendo rir. - Depois o Uriel, a Angel e o seu irmão, Daniel.

- Eu conheci ele. - digo. - Quando matei aula ontem.

- Ah, tem também a senhorita Sophia, que chegou na primavera passada, junto com os gêmeos.

- A professora de filosofia da religião? - pergunto.

- Sim. Ela parece ignorar todos os outros, menos os preferidos dela.

- O que você acha disso? - pergunto, confusa.

- Sei lá. - respondeu, dando de ombros.

Todas as informações que Luci me deu, me deixaram realmente curiosa e sedenta por mais. Porque vieram para cá? Porque são tão esquistos? Porque parecem uma família e são tão diferentes ao mesmo tempo?

Me lembro que hoje é sexta-feira, dia da festa que Daniel me chamou e disse que eu poderia levar quem eu quisesse. Odeio a sensação de não saber das coisas e acho que a festa pode ser uma boa oportunidade de descobrir mais sobre todos eles.

- Se arruma. - digo a Luci, que já estava com a cara enfiada nos livros. - Vamos a uma festa.

- Uma festa? - repetiu minha pergunta, como se quisesse saber se ouviu certo. Ela não deve ir a muitas festas, já que disse que sou sua única amiga aqui.

- Sim. Daniel me chamou para a festa do Uriel. - falei.

- Mas e a sua cabeça, se sente bem para sair? -, perguntou, preocupada.

- Já tinha me esquecido disso. - digo, sinalizando que estou bem.

- Então vou me arrumar! - respondeu, toda empolgada.

Enquanto ela sai saltitante do quarto, seguindo até o banheiro, me pego pensando em tudo que ela me disse. O que há de errado com eles? Porque estão aqui? Quem é o vilão? E quem é o mocinho?

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