CAPÍTULO QUATORZE

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Nicolas segurou o diário aberto em seu colo sem saber se devia mesmo ler o que tinha ali. Eram lembranças de uma Zoey quase criança ainda. Parecia íntimo demais espiar as memórias de menina dela.

— Tem certeza que quer que eu leia?

— Tenho. É mais fácil mostrar do que falar. — Deu de ombros. — Pode ler. Já faz muito tempo.

Nicolas assentiu e leu a primeira passagem que Zoey havia mostrado. Apenas duas frases.

"Eu odeio a Laura. Queria que ela não fosse minha mãe."

Não havia sequer uma introdução. Era curto, grosso e direto. Adolescentes tendem a ser complicados, ele sabia, mas para uma menina chegar a dizer que odiava a própria mãe só podia ser por drama – o que ele duvidava – ou por estar profundamente magoada. A julgar pela força com que parecia ter sido usada para escrever aquelas palavras e as manchas de lágrimas no papel, achou que fosse a segunda opção.

— Devo continuar?

— Deve. Aí vai começar a entender porquê nunca falo sobre ela. Ela me deu a vida, mas não é minha mãe.

*****

Querido diário

Ontem eu estava com tanta raiva que nem consegui contar o que aconteceu. A Laura não veio para minha festa de aniversário de novo e mandou de presente uma Barbie, como se eu ainda tivesse 7 anos e brincasse de boneca. Papai disse que eu devia ligar e agradecer porque, afinal, ela lembrou do presente e a intenção é o que conta.

Por mim eu nem teria ligado e enrolei o máximo que deu, aí o meu pai veio com aquela história de que eu posso até estar chateada por ela não ter vindo, mas que essa não é a educação que ele me deu. E é verdade, então eu liguei e agradeci. Sabe o que ela disse? Que não sabia do que eu estava falando, que mandou alguém comprar um brinquedo qualquer e mandar entregar aqui em casa. Ela nem lembrou do meu aniversário!

Tudo bem. As pessoas importantes estavam lá. Papai, Arthur, a vovó e o vovô e um monte dos meus colegas da escola. Quem precisa da Laura, não é mesmo? Eu é que não.

Só que ontem ela apareceu aqui em casa! Ela que vá pro inferno que eu não estou nem aí. Foi assim que aconteceu: cheguei da escola um pouco mais tarde que o normal porque fui tomar sorvete com o Arthur depois da aula e, quando cheguei em casa, papai não estava. Ele foi trabalhar, é claro. Não sei pra que isso de trabalhar se a Laura tem dinheiro de sobra, mas ele diz que gosta, então deixa ele.

Enfim, a Laura estava em casa, o que é bem raro de acontecer, até porque o natal é só mês que vem e mesmo assim ela quase nunca aparece. Vai ficar mais fácil se eu escrever a conversa.

— O que está fazendo aqui, Zoey? — Ela já me perguntou com cara de quem quer vomitar.

— Eu moro aqui, mãe.

Até ontem ela ainda era mãe. Agora é só Laura mesmo e, nossa, ela fez um puta drama com o papai por causa disso. Como se ela se importasse! Mas então, ela continuou me olhando com aquela cara de nojo que só ela sabe fazer e perguntou onde eu estava que não tinha chegado no horário de sempre. Contei a verdade, que estava com o Arthur porque fomos tomar sorvete na esquina da casa dele.

Como ela não disse mais nada, eu fui pro meu quarto fazer a lição da escola e nem tinha começado direito quando ela apareceu pra perguntar se Arthur é meu namorado. Eu disse que não, ele não é mesmo. Aí eu caí na burrada de contar que ele me beijou no meu aniversário. Aí ela fez um discurso sobre sexo seguro, mas não foi nada gentil. Papai já conversou sobre isso comigo e eu não sou idiota nem nada, só que ele conversou comigo numa boa, como se estivessemos falando sobre o tempo.

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