CAPÍTULO VINTE E NOVE

44 9 53
                                    

O silêncio parecia extremamente opressor enquanto arrumavam as coisas para irem embora. Nicolas não disse nada e apesar de achar que devia se explicar, que não era o que ele tinha visto – mesmo sem saber exatamente o que ele vira – Zoey também permaneceu em silêncio. Vez e outra olhava pela janela, para a beira da piscina onde Laura havia se tornado o centro das atenções, exatamente como gostava de ser.

Apenas um grupo muito seleto de pessoas sabia da existência de uma filha misteriosa na vida de Laura Guedes, pessoas dignas de confiança que não sairiam por aí espalhando a fofoca para os tablóides, mas agora parecia que Laura não fazia questão alguma de esconder a existência de Zoey, nem quem era ela.

Durante toda sua vida, Zoey sempre esteve nas sombras justamente por ninguém saber quem era sua mãe. Graças a isso, teve a chance de viver uma vida normal. O Brasil nem sabia que Laura tinha uma filha porque ela se esforçava em esconder isso porque, nas palavras dela, Zoey não era digna de tê-la como mãe. Então o que Laura estava fazendo ali? Zoey havia ativado um filtro na internet para bloquear todo e qualquer site que mencionasse Laura Guedes. Fazia anos que não tinha notícia alguma da mulher que se dizia sua mãe e agora quando tudo parecia finalmente estar indo bem em sua vida, Laura aparecia.

E ainda havia Arthur. Ela duvidava que ele fosse dizer alguma coisa para Alana e se sentia na obrigação de contar, mas não sabia como. Alana podia achar que ela só queria atrapalhar o noivado dela e de Arthur e, sendo sincera consigo mesma, pareceria exatamente isso.

Estava parada diante da janela observando como Laura era toda sorrisos para a família de Alana, como dispensava uma atenção especial para as crianças. Atenção essa que nunca se dera ao trabalho de fornecer para a própria filha. Laura nunca tinha tempo para ela.

Sai, garota. Não vê que estou ocupada?

Santo Deus, Zoey, me deixa respirar.

Não sei onde eu estava com a cabeça pra deixar você nascer.

Eu me arrependo tanto da sua vida, garota.

Essas eram as frases menos cruéis que ela ouvia em sua infância. Foi ficando pior a medida que ela crescia. Como uma mãe podia odiar tanto assim a própria filha? O sangue do seu sangue? Zoey simplesmente não entendia. Nunca havia entendido e menos ainda quando Anna entrou em sua vida. A menina nem carregava o seu DNA, mas Zoey a amava tanto que não entrava em sua cabeça como Laura havia sido capaz de ser tão cruel ao usar as palavras para feri-la.

— Vou buscar a Anna. — Nicolas disse e Zoey resmungou um "tudo bem" baixinho enquanto assistia Laura abraçar com carinho uma criança que havia acabado de conhecer.

Estranhamente, não sentia tanta dor ao ver aquilo. Quando mais nova, costumava doer cada vez que via a mãe ser carinhosa com outra criança e com ela não. Doía tanto que era como se alguém estivesse arrancando seu coração do peito, mas não naquele momento. Sim, ainda doía, mas já não dilacerava seu peito como antes.

Quase como se sentisse que estava sendo observada, Laura olhou para ela. O sorriso em seu rosto se desfez dando lugar a um semblante triste. Quase comovente. Zoey permaneceu onde estava até Laura acenar para ela, então simplesmente deu as costas e terminou de guardar suas coisas na mala enquanto esperava Nicolas voltar com Anna decidida a explicar para ele que tudo não havia passado de um mal entendido. Ela não sentia mais nada por Arthur, romanticamente falando. Apesar dele ter sido um grande idiota, não conseguia simplesmente apagar da memória os bons momentos – mesmo que os momentos não tão bons se destacassem.

Teria que se despedir da família de Alana antes de ir embora. Todos tinham sido amigáveis com ela que seria injusto e falta de educação apenas ir embora sem sequer dar uma explicação, mesmo que não fosse a verdade. Teria tempo de pensar em alguma coisa para dizer enquanto Nicolas dava banho em Anna, mas quando ele voltou, estava sozinho.

— Anna veio pra cá? — apesar de manter a voz calma, ele parecia preocupado.

— Não.

— Merda! Ela sumiu. Todas as outras crianças estão brincando lá embaixo, mas a Anna desapareceu. Não acho ela em lugar nenhum.

— E a Maria?

— Tá dormindo no colo do pai. Zoey, ela sumiu. — agora ela podia sentir a pontada de pânico na voz dele e sentia que também estava entrando em pânico, mas quantas vezes Nicolas tinha estado presente para ela? Era a filha dele. O mínimo que ela podia fazer, era não entrar em desespero.

— Olha só, esse lugar é enorme. Ela deve estar brincando em algum lugar. Vamos achá-la. — Zoey não sabia se estava tentando tranquilizar Nicolas ou a si mesma.

Mas é claro que não acharam Anna. Quando a notícia do sumiço da menina se espalhou, Lourdes ficou responsável por vigiar as crianças enquanto os outros adultos procuravam por ela, sem sucesso. Onde quer que estivesse, Anna não respondia quando chamavam. Olharam em cada cômodo, em cada lugar onde ela pudesse ter se escondido e até no sítio vizinho, mas não havia sinal da menina em lugar nenhum.

A casa na árvore! Zoey lembrou que havia ficado ali por horas sem que ninguém soubesse de seu paradeiro. Talvez Anna estivesse ali brincando ou se escondendo, já que ela claramente não queria ir embora. Enquanto corria para lá, Zoey esbarrou em Alana, Laura e Arthur que vinham da direção para onde ela corria.

— Você olhou a casa na árvore? — indagou para Alana. Estava tão desesperada em encontrar Anna, que nem a presença de Laura foi o suficiente para desestabilizá-la. Sua única prioridade agora era encontrar a menina.

— Casa na árvore?

Aquilo era um não. Tinha que ser um não e Zoey seguiu seu caminho. Alguém a seguia, mas não parou para ver quem era. Esperava que fosse Alana porque não queria saber dos acompanhantes dela.

— Anna! — gritou subindo as escadinhas.

Mas a casinha estava vazia, exceto pela toalha de Frozen da menina. Anna estivera ali, mas ninguém poderia dizer quando.

Tão rapidamente quanto subira, Zoey desceu sem saber onde mais procurar a criança. Como um ímã, seus olhos foram atraídos para a lagoa onde Nicolas estivera pescando no dia anterior. Sentindo o coração acelerar de medo, Zoey correu até a lagoa. Ainda podia ouvir alguém atrás dela, mas não parou até chegar ao seu destino.

Foi quando seu mundo desmoronou.

— Anna! — o grito de desespero veio diretamente do fundo de sua alma enquanto se jogava na lagoa sem se importar com mais nada. — Anna!

— Zoey! — ela não sabia quem havia gritado seu nome. Havia mergulhado procurando por Anna porque não ousava perder as esperanças. Ainda não.

— Alana? — Nicolas parou ao lado dela. Alana estava pálida como a morte. Quase tão pálida quanto Zoey era. Sem conseguir dizer nada, Alana apontou para a água escura onde Zoey havia entrado e ainda não havia reaparecido.

Nicolas desmoronou quando viu o chinelinho cor de rosa boiando solitário no meio da lagoa anunciando a tragédia.

PredestinadosOnde histórias criam vida. Descubra agora