CAPÍTULO UM

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"Dentro de suas lembranças mais escuras está a resposta
se você se atrever a encontrar".

- The light, Disturbed. -

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Os olhos se moviam atrás das pálpebras, agitados, enquanto mãos invisíveis apertavam seu pescoço, prendiam seus braços e pernas, sufocando-a.  Alina conseguiu abrir os olhos e respirar fundo várias vezes até que os batimentos normalizassem, o corpo voltasse a obedecê-la e a respiração pudesse sair com naturalidade.
Suor cobria sua testa e suas costas quando ela se sentou no colchão rangente e esticou os braços acima da cabeça, notando só naquele momento a vibração embaixo do travesseiro.

Com um suspiro, botou a mão embaixo da almofada para pegar o aparelho, mas não sem antes arrastar a pele por acidente na ponta afiada da faca. Murmurando um palavrão com a surpresa, puxou a mão segurando o celular e inspecionou o filete de sangue na lateral do dedo que brilhava contra a escuridão do quarto.
Ela pois a mão debaixo do travesseiro de novo e dessa vez alcançou a lâmina pelo cabo, puxando a arma até o colo, afagando sua parte ampla com carinho e deixando um rastro do próprio sangue no aço polido enquanto com a outra mão desbloqueava o telefone e lia a série de mensagens recebidas a 3 minutos atrás.

Ela conferiu o horário no canto da tela e bufou, chutando as cobertas para fora da cama e ficando de pé, as pernas ainda trêmulas do sono inquieto. Alina se agachou e procurou com os dedos pela fresta nos fundos do encosto da cama, a tábua solta de madeira que ela removeu com facilidade e tirou dali  uma mochila de couro preta, tão pequena que, quando Alina ajustou as alças nos ombros, a bolsa mal chegou a metade de suas costas.
Ela calçou as botas e empurrou de leve a porta entre aberta com o calcanhar. sabendo exatamente aonde deveria pisar para não produzir nenhum ruído, ela seguiu pelo corredor silencioso da casa, a visão se acostumando com as sombras enquanto ela observava cada canto com atenção, mesmo que percorresse aquele corredor no escuro quase todos os dias, seus instintos e o arrepio da pele a impediram de relaxar.
Talvez fosse a semelhança com a casa dos seus pesadelos, ou talvez só fosse seu senso de alerta ligado por tanto tempo que ela não sabia mais viver sem aquela sensação, aquela apreensão que a perseguia mesmo na cama, quando achava que podia se desligar de tudo por algumas horas e quando tudo o que queria era não se lembrar de nada.

Ela passou pelas portas fechadas de sempre: o quarto da irmã, o quarto da mãe...  Contudo, ao passar pela porta da cozinha, Alina congelou no lugar. A mão segurou com mais força o cabo da faca e os olhos se estreitaram para verem melhor dentro do cômodo que deveria estar mergulhado no breu como o resto da casa, mas uma luzinha branca cintilava na mesa de jantar em desuso, iluminando escamas que se estendiam pelo mármore empoeirado, terminando em uma cabeça inclinada para fora do móvel, a língua bifurcada pairando a centímetros do chão e dois olhos brancos, completamente sem vida, virados diretamente para ela.

A cidade das Lendas. (Darkfalls Número 1)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora