CAPÍTULO 03

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QUERIDO DIÁRIO

  Contradição, e entre o real e irreal, a ironia, o paradoxo, era o pior inimigo. Não desejava fazer nada que fosse melhor não fazer. Mesmo quando criança, queria morrer, queria render-se porque não via sentido em lutar. Sentia que nada se provaria, consistência, somaria ou subtrairia pela continuação de uma existência que Babe não pediu. Todas as voltas eram um fracasso, ou, se não, ridículos. Sobretudo o bem sucedido. Estes entediados até as lágrimas. Era excessivamente compreensivo, mas não por simpatia. Era uma qualidade totalmente negativa, uma fraqueza que desabrochava à simples visão da infelicidade humana.

Desejo dar uma volta por aquelas altas e áridas cordilheiras de montanhas onde se morre de sede e frio, por aquela história extra temporal aquele absoluto de tempo e espaço onde não existe homem, nem fera, nem vegetação, onde se fica louco de solidão, com linguagem que é de meras palavras, onde tudo é desenganado, desengonçado, sem articulação com os tempos. Desejo um mundo de homens e mulheres, de árvores que não falem (porque já existe conversa demais no mundo!) de rios que levam a gente a lugares, não rios que sejam lendas, mas rios que ponham a gente em contato com outros homens e mulheres, com arquitetura, religião, plantas, animais, rios que tenham barcos e nos quais os homens se afoguem, mas não se afoguem no mito e lenda e nos livros e poeira do passado, mas no tempo e no espaço e na história.

Desejo rios que façam oceanos como Shakespeare e Dante, rios que não se sequem no vazio do passado. Oceanos, sim! Tenhamos novos oceanos que apaguem o passado, oceanos que criem novas formações geológicas, novas vistas topográficas e continentes estranhos, aterrizando dores, oceanos que destruam e preservem ao mesmo tempo, oceanos nos quais possamos navegar, partir para novas descobertas, novos horizontes. Tenhamos mais oceanos, mais convulsões, mais guerras, mais holocaustos. Tenhamos um mundo de homens e mulheres com dínamos entre as pernas, um mundo de fúria natural, de paixão, ação, drama, sonhos, loucura, um mundo que produza êxtase e não mares secos. Creio que mais do que nunca é preciso procurar um livro ainda que de uma só grande página: precisamos procurar fragmentos, lascas, unhas dos dedos dos pés, tudo quanto contém minério, tudo quanto seja capaz de ressuscitar o corpo e a alma. Querido diário até amanhã "Babe".

  — O que você está escrevendo nesse diário? Alan perguntou.

  — Não bate mais na porta antes de entrar? se eu estivesse nu? Babe disse sério para seu amigo

  — Como se eu não tivesse visto seu corpo. Alan ajeita o jaleco e senta na cadeira.

  — Só teve uma vez, que bebi e acabei vomitando na roupa e você ama meu lindo corpo. Babe sorrir.

  Alan admirava muito a capacidade de Babe lidar com sofrimento e tantas coisas que tinha acontecido na sua vida até aos dias de hoje, não tinha nada que o impedisse de Babe fazer o que queria. Ele nunca deixava de sorrir, de provocar seus amigos, parar de trabalhar não estava cogitado, Babe todos os dias trabalhava e atendia seus pacientes, ele cumpria seus honorários, talvez em turno vespertino, diurno e noturno, que no caso era o mais raro.

DESEJOS SOMBRIOS • CHARLIEBABE Where stories live. Discover now