Capítulo 31

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Por Manoela

Deslizo minhas mãos por minhas pernas até que consigo encostá-las nos dedos dos pés. Sentada no chão do terraço, conto um minuto nesta posição e depois abro as pernas num espacate. Inclino meu corpo para direita e toco meu pé direito, marcando trinta segundos na contagem, em seguida repito o alongamento no lado esquerdo. Fico de pé, giro minha cabeça para relaxar as articulações do pescoço, pego uma perna e puxo, trazendo a mesma na altura do meu glúteo, repito o processo na outra perna.

Depois de terminar o alongamento, ponho uma música de aquecimento e improviso em alguns passos só pra esquentar o sangue e quando me solto o suficiente mudo para a música que estou ensaiando para a apresentação que o professor passou.

"Way down we go — KALEO"  ecoa por todo o ambiente fechado, sinto o grave da música estremecer meu corpo e assim começo a mexer meus braços primeiro. Uma de minhas pernas dobra e de forma suave me jogo ao chão, a minha cabeça tomba para trás e me deito impulsionando o corpo dando uma cambalhota e fico de joelhos. Me levanto no ritmo da música e salto, me mexo, me jogo na dança. Meus pés se desprendem do chão e meus braços tentam chegar ao inalcançável enquanto meu corpo os prende. No climax da música, giro. Faço um arco com os braços enquanto uma perna me faz girar e a outra, que estava ereta a todo momento me equilibrando, desço lentamente até que paro de girar.

Coração acelerado, a mente vazia e um sorriso, amargurado, surge em meus lábios de forma inevitável enquanto agacho ao fim da música.

Dor. É o que sinto toda vez que meu peito palpita ao som desta canção.

Ao escutar palmas, me viro e vejo meu pai parado e com um sorriso orgulhoso nos lábios, acabo sorrindo de volta ignorando toda a angústia em meu peito, toda a dor e tristeza que me rasga em dois espaços vazios, preenchidos apenas por sangue, já que não sinto mais meu coração.

Ajeito minha joelheira e caminho até o homem muito bem vestido de terno e gravata à minha frente. Conforme ando em sua direção, o coração se aperta por estar escondendo minhas cicatrizes dele. Sinto vergonha de mim.

Abaixo a manga da camisa disfarçadamente, tampando os cortes para que ele não os veja.

— Que bom que chegou. — digo enquanto o abraço.

Sorrio quando sinto o contato aconchegante que meu pai me traz toda vez que me abraça e beija minha testa.

— Como foi seu dia? — pergunta. — Gostei de ver você dançando, me ensina um dia? — dou risada com ele.

— Foi normal. Ainda não me acostumei com a ideia de estar sem uma rotina de aulas. — ele ri.

Hoje fui ao cemitério. Fazia tanto tempo que não ia visitá-la que senti um pouco de vergonha ao chegar em seu túmulo muito bem cuidado e saber que eu não pus uma rosa ali durante três anos.

Saio do táxi e adentro nos portões do cemitério, sinto minhas mãos suarem e as seco na calça leggin preta que visto. Ando pelo espaço olhando as lápides, reparando o ano em que nasceram e morreram, causando um certo aperto no peito quando via os anos tão próximos.

De longe vejo a lápide dela e meu corpo gela, seco novamente as mãos na roupa, engulo seco e caminho até seu túmulo.

— Oi, mãe. Quanto tempo, né? Demorei mas trouxe flores pra você. — ponho o buquê perto do seu túmulo. — São tulipas, sei que gosta dessas.

— Eu voltei pro Rio há alguns dias, me desculpa por não ter vindo antes. Me acha imatura e egoísta também? — meus olhos ardem e não impeço as lágrimas de caírem. — Tenho umas coisas para lhe contar.

"Sempre foi você"Unde poveștirile trăiesc. Descoperă acum