5

92 11 10
                                    

Tulinho estava nervoso.
Era a primeira vez que via Julinho pessoalmente após o beijo deles.
Apesar de fingirem que nada aconteceu enquanto conversavam pelas redes sociais, estava receoso de olhar nos olhos do amigo. Sabia que iria lembrar do beijo e de tudo o que sentiu durante.
O motorista estava desconfiado sobre o que um garoto da zona sul estava fazendo ali e, sem dar muitos detalhes, Tulio reafirmou pela quarta vez que estava tudo bem.
Viu Julinho de longe e saiu do carro assim que a corrida foi paga.
O coração acelerou dentro do peito e, mesmo com o clima estranho entre eles, a sensação de pertencimento não diminuía. O abraço que o ruivo deu no amigo continuou sendo caloroso e transbordava de amor.
— Você tá cheiroso — Tulinho falou ainda no abraço.
— Eu sou cheiroso — Julinho se separou do amigo, fazendo um breve carinho na bochecha do rapaz.
— Eu sei, mas hoje tá mais, quer conquistar alguém,é?
Julinho se engasgou com o ar, tossindo um pouco, mas disfarçou com um sorriso amarelo e deu o braço para o amigo.
— Vamo? O pessoal já tá lá
Tulinho assentiu, segurando no braço do amigo e caminhando animado, observando a região e se impressionando com coisas que não existiam no local onde morava.
O local da festa não era muito longe dali e antes de entrar, Julinho o parou na porta.
— Cadê teu celular?
— Ta aqui — apontou para o bolso, estranhando a pergunta do amigo.
Julinho enfiou a mão no bolso do amigo, pegando o aparelho, levantando a blusa e encaixando o celular no cós da calça de Tulinho, fazendo o menor se arrepiar. 
— Esse celular não sai daqui, ta? E teu cartão?
— Tá na capa do celular
Julinho assentiu.
— O seu anel, da pra mim
Tulinho tirou o anel de ouro do dedo e Julinho tirou a correntinha que usava, colocando o anel como um pingente e guardando o colar para dentro da camisa.
— Você tá parecendo a minha mãe, Ju — Tulinho riu.
— Aqui a gente confia desconfiando, meu bem — Julinho falou e Tulio mordeu o lábio tentando não sorrir com o apelido que o amigo havia dito — Não quero que ninguém pegue nada teu
— Você acha que vão tentar me roubar? — perguntou preocupado.
— Com essa carinha de playboyzinho, vai ter um monte em cima de ti — Julinho tocou o queixo de Tulinho — E nem vai ser só pra ficar de olho nas tuas coisas
— E vai ser pra quê?
Tulinho viu o momento que os olhos de Julio desceram até sua boca.
Propositalmente, o ruivo passou a língua nos lábios chamando mais atenção ainda.
Ambos se assustaram com a chegada de um grupo de garotos, que entraram no local da festa falando alto e rindo.
— Inspeção feita, já podemos ir? — Tulinho desfez o clima.
— Já, já podemos
Em um ato mais que natural, segurou no braço do amigo e entraram juntos na festa, que estava bastante lotada.
Caminharam até um grupo de pessoas que estava em um canto, rindo e bebendo.
Tulinho ponderou sobre estar grudado demais em Julio, então tirou a mão do braço do amigo rapidamente. Ato que fez Julinho estranhar, pegando de volta a mão de Tulinho e colocando no lugar onde estava anteriormente.
Julinho apresentou o amigo para os que estavam ali e Tulinho se sentiu muito bem recebido. Ficou tímido quando os garotos começaram a elogiar suas roupas e seu sapato.
— Qual numero tu calça, menor? — um garoto perguntou e Julinho logo interveio.
— Ow, vamo parando, ele é meu amigo
— Foi só uma pergunta, só isso — o garoto respondeu desconfiado.
— Não foi só uma pergunta e claramente esse sapato não cabe no teu pé. Não tenta, mano
O garoto deu de ombros.
— E a Martinha? — um outro garoto perguntou.
— Sei lá, deve estar vindo aí — Julinho deu de ombros.
Tulinho já tinha ouvido falar dessa Martinha, mas não sabia quem era.
— Achei que tu ia trazer ela
Julinho ignorou o comentário e se aproximou de Tulinho.
— Quer uma bebida?
— Tem aquela azul da festa na casa da Luana?
— Acho que tem
— Então eu quero essa
Julinho apontou para uma cadeira de plástico entre os garotos ali.
— Me espera ali que vou pegar pra ti, ta? Não sai de lá
Observou Tulinho se sentar e foi até onde estavam dispostas as bebidas, se enfiando entre os corpos para pegar logo a bebida de Tulinho e voltar o mais rápido possível para perto do amigo.
Depois de servir um pouco da bebida em dois copos, voltou deslizando entre as pessoas até onde deixou Tulio, se assustando ao ver um dos caras entregar para ele um cigarro de maconha.
Só conseguiu ouvir o cara insistir:
— Só uma tragadinha, vai, pra tu se soltar
— Opa — deu um passo longo, afastando o cigarro da boca de Tulio antes que ele tragasse — Esse não...
— É da boa, mano, eu não vou oferecer nada de baixa qualidade pro nosso convidado especial
— Não, mano, ele não quer — negou por Tulinho.
Entregou o copo para Tulio e se sentou ao lado do amigo.
— Não tô te controlando, ta? Só não quero que tu vá chapado pra casa
— Tudo bem — Tulio concordou, bebendo um gole da bebida que o amigo havia trazido.
Bebida que quase entornou quando uma morena linda chegou, cumprimentando várias pessoas e, na vez de Julinho, selando os lábios nos dele.
— E esse, é aquele teu amigo?
— É, o Tulinho. Tulinho, essa é a Martinha — Julio os apresentou.
Tulio se sentiu pequeno perto da morena linda que acabara de simplesmente beijar o cara que ele tava gostando.
Apesar de tímido de início, um pouco de álcool na veia fez Tulinho se soltar mais e interagir com os amigos de Julio.
Conseguiu, pela maior parte da noite, ignorar os carinhos e selinhos que Martinha e Julinho trocavam. Afinal, era só um selinho bobo em uma festa, nada de muito especial.
Passava um pouco das duas da manhã quando Tulinho estava dançando ao som de uma música muito legal e sentiu a falta de Julinho.
— Ei, você sabe onde tá o Julinho? — perguntou para Marcos, o garoto que havia tentado pegar seu tênis quando chegou.
— Vi ele indo ali com a Martinha — apontou para um corredor que sabia que iria dar nos banheiros.
Tulinho deu passos lentos até onde Marcos havia apontado, semicerrando os olhos e sentindo o coração apertar no peito ao ver Martinha com as pernas entrelaçadas no corpo de Julio, encostada na parede. Estavam se beijando, beijando mesmo. Não era mais um selinho bobo.
Não queria mais ver aquilo e nem conseguia, pois as lágrimas embaçaram sua vista.
Piscou algumas vezes e saiu dali sem fazer barulho, se voltando para Marcos.
— Você pode me acompanhar até lá fora? Quero ir pra casa
— Posso, tu achou o Julinho?
— Aham, ele ta ocupado e eu preciso mesmo ir
Marcos deixou a bebida em algum canto e guiou o ruivo para o lado de fora da casa de show.
Ainda no corredor, Julinho se separou de Marta.
— Marta, já chega, passou do limite do fingimento
— Qual foi? Não tão gostoso?
Ele deixou a garota no chão.
— Isso não serviu de nada pra fazer ciúme no Tulinho, tu só queria ficar comigo — falou meio irritado.
— Eu só uni o útil ao agradável, ué
O garoto revirou os olhos e saiu dali, voltando para onde estava com Tulinho.
Passou os olhos pelas pessoas e estranhou ao não ver a figura baixinha.
— Ei, cadê o Tulio? — perguntou para um colega.
— Foi lá pra fora com o Marcos
Julinho apressou o passo até o lado de fora e só encontrou Marcos fumando um cigarro.
— Cadê o Tulio?
— Já foi
— Como assim, já foi?
— Ele tava te procurando, disse que tu tava ocupado, pediu pra eu vigiar ele aqui fora, entrou no carro e foi embora
— E tu deixou, porra?
— Julinho, caralho, eu não tenho filho. Ele quis ir e foi — deu de ombros.
Pegou o celular e discou o número de Tulinho, se sentindo frustrado com a ligação sendo recusada todas as vezes.
Tulinho ia chorando no carro, desligando todas as vezes que o número de Julinho aparecia na tela.
Chegou em casa sem fazer barulho, tomou um banho quente, preparou uma xícara de chocolate quente e se sentou à mesa de estudos, pegando papel e caneta.
Descontou no papel tudo aquilo que queria dizer para o amigo, inclusive aquilo que ainda não havia admitido nem para si mesmo: gostava de Julinho.
Fechou a carta e escreveu o nome do amigo em letras garrafais, deixando o papel em cima da mesa e se deitando para dormir.
Quando estava em um sono pesado, Jussara entrou no quarto para ver se estava tudo bem com o garoto e avisar que iria para casa mais cedo hoje, dando de cara com a carta na mesa.
— Será que é pra eu levar essa?  — estranhou — Faz tempo que eles não me mandam entregar nada
De qualquer forma, enfiou a carta na bolsa e cutucou Tulio.
— Querido, tô indo mais cedo pra casa, ta? Mas o almoço ta pronto
— Uhum — Tulinho sussurrou ainda sonolento.
— Não vai comer muito tarde e eu tô levando a carta que você deixou, até mais
— Uhum — sussurrou mais uma vez antes de voltar a dormir.
Mais tarde, quando despertou, Tulinho evitou olhar o celular, não queria saber de Julinho.
Esquentou o almoço e serviu um copo de suco para si, fazendo sua refeição em silêncio.
Começou a relembrar o que Jussara havia dito para ele antes de sair.
Bebeu mais um gole de suco.
“E eu tô levando a carta que você deixou, até mais.”
Tulinho cuspiu o suco sujando a mesa toda.
Jussara havia levado a carta e à essa hora, Julio já devia ter lido.
— Não, não, não! — passou as mãos pelo rosto, se sentindo um poço de frustração.

— Não, não, não! — passou as mãos pelo rosto, se sentindo um poço de frustração

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Para a sorte ou o azar de Tulio, Julinho não respondeu a carta, não mandou mais mensagem e nem tentou ligar

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.


Para a sorte ou o azar de Tulio, Julinho não respondeu a carta, não mandou mais mensagem e nem tentou ligar.
Do lado de lá, apenas silêncio.
Tulinho bem que queria que Julinho tentasse, demonstrasse que também sentia o coração bater mais forte quando estavam juntos. Mas a falta de respostas já deixava claro que seu sentimento não era retribuído da mesma forma. Julinho só o via como um amigo mesmo. E tudo bem, não era obrigado a gostar de Tulio e muito menos saber que ele estava apaixonado, mas isso não fazia tudo ser mais fácil.
Havia perdido o melhor amigo e o garoto de quem gostava, se sentia sozinho, não tinha alguém de confiança com quem pudesse desabafar. O que restou para Tulio, foi se isolar no quarto, sentir tudo o que havia que sentir e continuar seguindo sua vida, agora sem ter uma mão amiga para segurar.
Julinho estava na sua, mais arisco. Depois de ler a carta, fechou a cara e não queria conversar com mais ninguém.
Respeitaria a vontade de Tulio, não iria mais insistir.
O coração doía triplamente pois, além de não ter mais o amigo, também não tinha por perto o garoto por quem é apaixonado e pior, só descobriu isso depois que o perdeu.
Martinha teve uma ideia idiota e Julinho se sentia mais idiota ainda por ter topado, sem perceber que, no fundo, a garota queria mais era tirar proveito da situação.
Sentia o peito cheio e estava mesmo, cheio de sentimentos e palavras que só havia uma pessoa no mundo com quem se sentia confortável o suficiente para contar, mas não podia mais.
Apagou o número de Tulio do celular, deu unfollow nas redes sociais e pediu para a mãe não perguntar mais sobre o garoto.
Teria que sufocar aquele sentimento até que morresse.

ALGO PARECIDOWhere stories live. Discover now