000

227 25 1
                                    







O som da água. O som dos pássaros, mesmo que poucos. O som dos insetos.

Era tudo que Ulrika ouvia.

Os olhos fechados enquanto aproveitava o som da natureza. As roupas grudavam em seu corpo, molhadas, assim como a terra em seus pés e mãos.

Paz.

A calmaria da paz.

Aproveitava cada segundo daqueles raros momentos de paz. Eles nunca duravam.

Ela ouviu passos se aproximando. O farfalhar das roupas e do cinto de couro e ferro que prendiam a espada. Já sabia quem era antes mesmo de ouvir a voz grave.

— temos que voltar.

Ela abriu os olhos, encontrando o enorme céu azul.

— é necessário?

— sim. Temos coisas a fazer — ele respondeu.

Ela suspirou e se sentou, colocando as botas e levantando. Ela pegou a espada do chão e encaixou em seu cinto, batendo as mãos pra tirar a terra.

— pegou tudo que precisava?

— até mais, por precaução — ele mostrou uma trouxa com várias outras pequenas, dentro tinham plantas e ervas.

— então vamos — ela começou a andar e ele a seguiu, andando ao seu lado. —  lembra da primeira vez que me trouxe aqui?

— sim. Indra nos xingou por ter sumido sem avisar.

Sorriram com a lembrança.

— você era tão pequenininha e frágil.

Ela riu e o olhou.

— você não era essa muralha que é hoje.

— bom, não era eu que era chamado de ratinho.

Ela revirou os olhos pra provocação. Anya  a chamava de ratinha desde que a conheceu, quando tinha oito anos.

— esse apelido é ridículo — ela balançou a cabeça.

— você gostava.

Ela riu.

— eu era uma criança que recebia atenção, eu gostava de tudo que ela fazia.

— isso é verdade.

Demorou pra Ulrika entender que algumas coisas que Anya fazia com ela eram erradas, tóxicas. Ela tentava se convencer de que aquilo fazia parte de quem ela era e que não era grande coisa, mas Lincoln sempre estava lá pra falar que não justificava.

Ficaram em silêncio por alguns minutos, seguindo o caminho tão conhecido pra aldeia. Quando estavam quase chegando, ouviram um barulho alto. Ulrika olhou pro céu e viu a coisa enorme caindo.

— aquilo é uma...?

— parece. Vamos.

Os dois correram, Lincoln indo pra caverna enquanto Ulrika ia pra aldeia, ela seguiu direto pra cabana da líder.

— senhora — ela entrou e se aproximou da cadeira onde Anya estava.

— demorou.

— peço desculpas senhora. Tem uma coisa lá fora — falou de uma vez, antes que perdesse a chance.

A mulher a olhou atenta.

— uma coisa?

— sim. Uma coisa enorme, veio do céu.

Todos na sala a olharam.

— do céu?

Ulrika concordou e Anya olhou pros guardas.

— mande batedores.

Um dos guardas saiu e ela voltou a olhar pra mais nova.

— eu gostaria de ir junto, se me permitir senhora.

— por que? — Anya a analisou, notando as roupas molhadas.

— só quero ver.

— não. Os batedores farão isso. Já pode ir.

— sim senhora — ela saiu da sala e logo da cabana.

Ignorou os olhares das pessoas enquanto andava até fora da aldeia, indo até a caverna de Lincoln.

— o que foi? Conheço essa cara — ele disse assim que a viu.

Ela suspirou e tirou a espada, a deixando junto da dele no cesto.

— Anya não deixou que eu fosse com os batedores verificar a coisa que veio do céu.

— é melhor assim. Pode ser perigoso.

Ela franziu o cenho e o olhou ofendida.

— não sou mais criança Lincoln.

— você sempre vai ser uma criança pra mim.

Ela cruzou os braços e ele sorriu, tocando seu cabelo loiro.

— apenas aceite as ordens.

As vezes ela realmente odiava seguir ordens. As vezes seu espírito jovem queria se libertar e desobedecer, mas sabia que as consequências seriam rígidas.

— me ajuda com os remédios.

Sem muito o que fazer, ela concordou. Ficaram fazendo os remédios por algumas horas, quando começou a anoitecer, Ulrika voltou pra aldeia e foi pra sua cabana, encontrando Indra, que mal parava na aldeia.

— aonde estava?

— com Lincoln, fazendo os remédios — ela se aproximou e deixou os frascos em uma cestinha em cima da mesa, sentindo a mulher se aproximando.

Indra tirou a capa de suas costas, a colocando no suporte.

— esse rasgo é novo? — a mulher perguntou.

— Tris fez hoje cedo — ela foi até um canto, tirando as botas e as deixando alí.

— ouvi guardas falando sobre uma coisa cair do céu — Indra disse, a olhando atenta.

— é. Nós vimos quando estávamos voltando. Anya mandou batedores — ela olhou pra mulher e cruzou os braços.

Indra estava a analisando.

— aconteceu alguma coisa?

— não, só estou cansada.

A mulher concordou e apontou pro quarto com a cabeça, Ulrika foi pra ele, trocando suas roupas e deitando na cama. Ela respirou fundo duas vezes antes de fechar os olhos, se entregando pro mundo dos sonhos, onde seus demônios ganhavam vida.

Afinal, todos temos demônios.





[Não revisado]

O começo de tudo.


The White Wolf, Bellamy Blake - The 100 Where stories live. Discover now