Epílogo - Eu Ainda te Odeio.

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A noite fria de lua cheia e leve brisa de início de inverno não promete nenhuma emoção. É daquelas que não nos permite fazer nada que seja fora da cama. Ou acordado.
No meu caso, nos últimos dias, eu tenho resolvido muitos problemas meus, mas a insônia não é um deles.

Entretanto, não vou jogar a culpa da minha atitude questionável na minha insônia. Eu faria isso em qualquer circunstância, assim como faço sabendo que as chances de eu me arrepender são infinitas. Eu sempre soube disso... e sempre soube que precisava fazer isso também. Só tinha que esperar a hora certa. E essa foi a parte mais difícil. Não existe hora certa.

Enquanto caminho entre passos curtos, o vento tenta me empurrar de volta para trás. Tenho as minhas mãos enfiadas nos bolsos do casaco.
É a primeira festa que eu dou as caras desde que voltei... e eu meio que nem dei as caras totalmente. Só tentei ficar o mais escondido possível desde que cheguei, há exatos dez minutos. Não que eu tenha virado algum tipo de puritano que odeia festas, eu só não tô muito a fim... e tenho um outro propósito.
Posso ouvir a música tocar bem longe, já que acabo de chegar no terraço, onde está vazio, iluminado pela lua e alguns postes da rua um pouco mais distantes. Uma estrutura aberta, um longo banco de madeira no meio desta e uma pessoa sentada nele.
Agora, depois de respirar fundo, duas.

Sei que o Nick está surpreso, que o seu olhar está em mim e não vai sair tão cedo e que tem muitas perguntas a fazer. Mas diante disso tudo, continuo observando o que posso ver de uma parte dos fundos, onde algumas pessoas estão, a rua pacata separada por um muro alto e as estrelas no céu a nossa frente. Eu não o julgo de forma alguma. Fazem cinco meses que ele me viu pela última vez, e sabe exatamente que eu não deveria estar aqui agora.
Faz-se um breve silêncio.

-Eu...-Começa a dizer, depois de tanto procurar por algo adequado.

-Como você tá?-Questiono, interrompendo. Ele nem sabia o que ia dizer. E não estou aqui para ficar ouvindo desculpas.

Mais silêncio. Ainda me observa, e eu meio que luto para não encarar de volta e acabar com o meu propósito... se é que tenho um.

-Você tá diferente.-Diz.

Assinto. Ele está certo. O que restou da minha tatuagem na cara acabou de cicatrizar, não tenho mais olheiras, meus cabelos são de um tom escuro de loiro e já cresceram o suficiente para fazerem a cor preta ir embora. Sem piercing nenhum no rosto. As vezes, nem eu me reconheço, ainda estou acostumando com o retorno da minha versão antiga, acho até que o que tornou tudo mais difícil foi ter ficado um bom tempo sem poder olhar para um espelho enquanto estava na reabilitação para descobrir que eu estava carregando uma personalidade que nunca fez parte de mim.

-A gente sobrevive...

Mais silêncio.

-É estranho... eu pensei que você nunca mais fosse falar comigo, e de repente você tá aqui... depois de tanto tempo.-Interrompe mas não finaliza, portanto espero que continue.-E eu simplesmente esqueci tudo o que tinha pra te dizer...

Deixo um breve sorriso de canto escapar durante um segundo. Chega a ser ridículo. Ele continua sendo o Nick de sempre. O mesmo que por muitas vezes eu odiei, o mesmo por quem eu acidentalmente me apaixonei perdidamente... e o mesmo que me destruiu por dentro em uma noite qualquer como essa.

-Não precisa lembrar... não sou muito fã de pedidos de desculpas o tempo todo.

-Porque você não me perdoou... e nem pretende.-Completa a minha frase, e então passa a encarar o chão.

Não esboço reação. Não concordo e muito menos discordo. Eu realmente não tinha interesse nenhum em ouvir as suas desculpas, sequer queria vê-lo na minha frente novamente, mas no fundo, sabia que precisaria disso... porém, precisava mais ainda de tempo.

Eu Te Odeio!Onde histórias criam vida. Descubra agora