OUR DEMONS : hs (disponível também em livro)

| Lost paper |

Voltei a casa. Sentada no sofá, sozinha. Não queria ninguém ao pé de mim neste momento por isso consegui com que a minha mãe fosse embora com Alaska nos braços já que estava prestes a adormecer depois de todo aquele tempo a meu lado.

Despachei as chamadas que me fizeram. Despachei Robin que me prometera que tudo estava bem e no lugar certo. Despachei Harry, deixando-o em casa enquanto me refugio na minha agora antiga casa. Observo o vazio existente nas prateleiras e passo-lhes a mão observando o vazio que deixei para trás à menos de um dia. Achei que tinha estado aqui muito pouco tempo e sinceramente sei que estes serão os meus últimos momentos por aqui antes de ser vendida e comprada por outro estudante ou até mesmo uma família com menos possibilidades. Iriam viver bem, podem querer que sim.

Deixo-me cair sobre o sofá depois de ter entrado pela janela. Sabia que estariam aqui pela manhã para que pudessem ver o interior e arranja-la para que pudesse ser renovada por outro alguém.

Encaro a televisão ligando-a e puxo o dvd que trouxe de casa com vídeos antigos, vídeos meus quando criança. Não queria que ninguém me interrompesse, daí ter vindo para cá, para a casa que meu pai comprou para mim. Ele sempre cuidou de mim tão bem, ele sempre me deu o seu total apoio.

E agora sento-me no cimo da mesa de centro em frente à televisão por onde lhe passo os dedos em cada vídeo que passa por lá. Agarro no comendo, pauso o vídeo e encaro o meu pai com um patinho na mão virado a mim, na minha pequena banheira de tem verde sorria ao mesmo tempo que ele fingia que me "comia" o nariz com o pequeno patinho amarelo de borracha. Pouso os meus dedos sobre o ecrã da televisão e os meus olhos enchem-se de lágrimas. O meu pai deveria estar aqui! O meu pai deveria estar aqui, ao pé de mim a abraçar-me e a dizer que adorou o casamento, deveria estar aqui para me aconselhar sobre o que devo fazer para o meu futuro. Deveria estar sentado na porcaria daquele sofá, com o cobertor sobre as pernas a pedir que me deitasse para me fazer festinhas nos cabelos.

Desligo a televisão e retiro o dvd guardando-o e observando pela última vez o local, a pequena manta vermelha sobre o sofá relembra-me de quando ele ainda aqui estava e faz-me sentir que aquele não era o local para ficar uma lembrança daquelas, por isso puxo-a até mim cobrindo assim os meus ombros, quando observo um papel enfiado entre as almofadas presas do sofá. Amarrotado e aparentava estar ali há um tempo.

Puxo-o para mim e desdobro-o esticando-o na minha área de visão e começo a ler:

"Para dormires bem esta noite.

Dinossauro xx"

E as lágrimas voltam aos meus olhos quando me apercebo do que aquele recado naquele momento me quis transmitir. Fecho os olhos e inclino a cabeça ligeiramente para trás sussurrando.

- Eu vou voltar para casa pai, obrigada por tudo. - abro os olhos encarando o teto e fungo limpando as lágrimas de seguida.

Agora com a manta pelas costas consigo saltar através da janela e fecho-a logo atrás de mim. Puxo a manta para cima dos meus ombros e amarro-a junto ao pescoço, com a minha altura, a manta nem a meio das minhas pernas chegava e quem me visse deveria pensar certamente que era lunática ou completamente obcecada pelo super-homem.

Atravesso o jardim e entro no carro que a minha mãe me deixara para que o pudesse conduzir, dissera que fora uma prenda do meu pai. Herança, segundo ela.

Por isso entro no carro e atiro a pequena manta para cima do banco ao lado, com o escuro já não consigo ver bem e os meus olhos pousam-se na rua quando ouço um ruído dentro do carro. Fico imóvel e sinto uma respiração junto do meu pescoço aproximar-se cada vez mais de mim. Os meus olhos não se mexem e sinto as minhas mãos tremelicar quando ouço um pequeno som:

- Bu!

E o meu coração desacelera quando observo os caracóis de Harry roçarem na minha cara.

- Mas o que é que tu estás aqui a fazer? - eu berro-lhe - Ias matando-me de susto! Foda-se! - eu reclamo-lhe.

- Estás sempre assustada também, minha idiota! - ele diz beijando-me o pescoço.

- Andas-te a beber, seu safado? - resmungo.

- Tinha esta garrafa aqui, achei que podia dar um gole. Demoras-te muito lá dentro, fui dar um gole, mas depois tornou-se demasiado bom e não parei de beber... - ele diz com uma voz acriançada.

- Harry, tu ainda hoje vieste do hospital, queres voltar para lá? - eu resmungo mais uma vez.

- Nop! - ele diz, mas dá mais um gole na garrafa de álcool que tem nas mãos.

Agarro na garrafa e chateada ligo o carro, abro o vidro e atiro-a pela janela fora arrancando logo de seguida.

- Estás chateada amor? - ele questiona.

- Harry, eu estou a conduzir, pelo amor de Deus agora não. - pedi.

Os meus olhos ainda molhados esforçavam-se para estarem abertos e os meus dentes roíam o meu lábio inferior esperando acalmar-me.

- Ellen... Querida... - ele diz já perto da minha cara e consigo sentir o seu cheiro a álcool quando ele se aproxima para me beijar a cara.

Não raciocino duas vezes e dou-lhe um estalo de forma a que ele se mantenha quieto no banco a meu lado. Ele cruza os braços chateado e pousa a cabeça no vidro da janela do carro.

Sinceramente nunca pensei que fosse tão cansativo ter de viver com ele. Assim que cheguei à nova casa estacionei o carro na garagem e desapertei o cinto. Harry tivera babado o vidro e desenhado no mesmo enquanto não adormecera.

E pela segunda vez, vejo-me obrigada a pegá-lo e levá-lo às costas pelo menos até ao nosso quarto que pelo aspeto, era muito chique, acho que até demasiado para uma pessoa como eu.

Deito-o na cama e sinto o calor da divisão onde acabo por retirar o casaco e a minha t-shirt e deitar-me a lado de Harry. Puxo o papel do bolso das calças onde o tinha guardado e observo mais uma vez a mensagem antiga que ele me tivera deixado e observo até onde chegámos hoje.

Os meus olhos encaram o teto agora um pouco iluminado pela luz que a lua transmitia e que atravessava a janela iluminando o quarto. Logo após fecho os olhos imaginando os diversos cenários possíveis que o futuro nos podia reservar.