Capítulo 6

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Meus olhos pareciam mais pesados e eu demorei para levantar da cama, estava certo da decisão que havia tomado noite passada. Aquelas vozes em minha cabeça iriam passar, aquelas imagens iriam desaparecer e tudo o que eu precisava fazer era não ver mais aquelas pessoas que me atormentavam à minha frente, pelo menos era o que eu pensava.
Abri uma gaveta do criado mudo, peguei um bloco de papel e uma caneta escrevendo no mesmo uma pequena lista.

"Meu querido pai ( prioridade )
Jason
Lucas
Pedro
Matthew"

Guardei o bloco no bolso da calça e levantei da cama caminhando até a janela. A placa que eu havia arrancado da terra anos atrás, ainda estava lá sendo tomada pela ferrugem. A placa que ficava ao lado do início da estrada antiga, e que levava a casa de Eloísie. E eu sabia que ainda naquela terra, estava o corpo de minha mãe. Eu sabia que ela nunca havia me amado como eu queria que amasse, ela não queria que eu tivesse nascido do sexo masculino. E parte dessa falta de amor era influenciada por meu pai que a culpava por não ter sido capaz de gerar uma menina. As canções de ninar que ela cantava para mim foram como sons repetitivos de uma caixinha de musica quebrada, com letras que mais machucavam do que reconfortavam.

Peguei os meus cadernos , e saí rumo à escola. Naquele dia não vi Eloísie , estranhei o fato de ela não estar me esperando na estrada , mas segui em frente.

Ao chegar na rua paralela à escola vi um tumulto em frente aos portões . Policiais, alunos e professores conversavam, e caminhavam de um lado para o outro com a feição preocupada. Eu já sabia o motivo, respirei fundo e atravessei a rua tranquilamente até o local.

Um policial me barrou , segurando uma prancheta e me olhou sério.

___ Garoto, você estuda nessa escola, não é mesmo?

___ Sim.

___ Conhecia um aluno chamado Renato?

___ Sim. – respondia em respostas curtas e objetivas enquanto observada os amigos de Renato cochichando ao lado do portão.

___ Quando foi a última vez que você viu ele?

___ Ontem na aula. Ele está desaparecido? – perguntei como se não soubesse o que estava havendo, havia um toque irônico em minha fala, como se eu me importasse com o garoto que havia matado. Não sabia que era capaz de ser irônico , mas talvez fosse esse um dos efeitos colaterais dos problemas acumulados na minha cabeça.

___ Sim. Desde ontem de manhã, os pais não o encontraram e iremos solicitar cães de resgate para a procura, obrigado por sua ajuda. – ele se retirou caminhando até outro aluno que chegava.

Mesmo com o "desaparecimento" do amigo, Jason não me esquecia. Após me ver parado no portão, caiu na gargalhada e se aproximou com os outros do "grupinho" me olhando de baixo pra cima.

____ Sobreviveu... Como é a sensação de ser salvo por uma garotinha. - ele falou e olhou para os outros que caíram na risada junto com ele.

____ Ela já tem 15 anos. E sim, sobrevivi. – levantei-me o encarando sério e me retirei entrando na escola ouvindo ele imitar barulho de porco atrás de mim. Tirei o bloco do bolso e anotei ao lado do nome de Jason :

"Ele gosta de porcos... Mostrar-lhe o que realmente é um."

***

Ao longe vi Eloísie sentada de cabeça baixa e caminhei até ela me sentando ao lado dela.

___ Eloísie... Está tudo bem?

___ Está... Tudo ótimo. – ela respondeu erguendo o olhar para mim com um leve sorriso visivelmente triste. Seu olho direito estava inchado e roxo. Estreitei os olhos desconfiado de que algo havia acontecido com ela.

___ E quanto ao seu olho? – perguntei a olhando, no fundo estava preocupado com ela.

___ Está tudo bem , Gabriel. Eu apenas caí.

Balancei a cabeça positivamente e olhei para o bosque à frente , logo reparei pessoas correrem em direção ao mesmo. Levante-me subitamente e segui caminhando em passos rápidos na direção em que as pessoas caminhavam.

Elas se aglomeravam em certo ponto do local, dois policiais com cães de resgate ligavam para a ambulância levar o corpo. Aproximei olhando friamente , as pessoas ao redor estavam espantadas outras choravam como se Renato tivesse sido a mais pura e inocente pessoa desse planeta.

Um investigador se ajoelhou perto do corpo o examinando, lendo as letras escritas com sangue nas folhas acima. Tirou algumas fotos na "cena do crime " e se retirou , eu sabia que ele iria demorar para achar o culpado . Já que eu estava ali diante dos olhos dele e ele nem sequer desconfiava. 

Diário de um psicoloucoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora